Capítulo 6

37 5 0
                                    

TRÊS HORAS DEPOIS, ESTÁVAMOS DE volta no quarto do hotel. Larguei as poucassacolas que Blake me deixou carregar e desabei na cama. Eu estava chocada eescandalizada com os preços e cansada até os ossos. A pedido de Blake, merecusei a olhar para as etiquetas de preço tanto quanto fosse possível. Namaior parte do tempo, era irrelevante, pois o valor nunca era discutidoenquanto os vendedores ofereciam seus melhores produtos.Blake tinha me mimado excessivamente. "Mimado" era eufemismo. Euacabei com um novo guarda-roupa completo, novas lingeries para todos osdias da semana e mais apetrechos de grife do que qualquer pessoa.Tiramos um cochilo de uma hora antes de tomar banho de novo e nosarrumarmos para jantar.Coloquei um vestido preto de mangas longas que Blake insistiu que eucomprasse, depois de desfilar para ele na loja horas atrás. A barra era nametade da coxa e o decote das costas era profundo — perfeito para uma noitede verão.Coloquei o relógio enorme repleto de diamantes que devia ter sidoobscenamente caro. A tarde, por mais esgotante que tivesse sido, foifantástica. Não tinha como não me sentir especial com os vendedores quasedançando à nossa volta, se empenhando para conseguir qualqueroportunidade de passar o cartão de crédito de Blake na maquininha ao medeslumbrar com o melhor de tudo.Blake estava usando uma calça cinza escura e uma camisa preta com asmangas enroladas. Seus cabelos estavam bagunçados do nosso cochilo. Osolhos dele estavam vivos e brilhavam. Não consegui evitar um sorriso quandoo reflexo dele se aproximou de mim.— Obrigada.— Pelo quê?Revirei os olhos.— Por onde começo?Ele riu, tocando nos diamantes brilhantes dependurados nas minhasorelhas.— De nada. E obrigado. Por concordar em fazer de mim o homem maisfeliz do mundo. Eu já sou, mas poder dividir o resto da minha vida com você éo melhor presente que você poderia me dar.— Me sinto da mesma forma. Mas não preciso de diamantes e bolsas paraser feliz.Ele inclinou a cabeça.— Mimar você me deixa feliz. Então me deixe fazer isso só um pouquinho.— Que tal limitarmos a farra das compras a ocasiões especiais?— Você que manda, chefe — murmurou ele, aninhando-se em meu pescoço.Não pude evitar um sorriso quando ele me virou em sua direção e capturoumeus lábios. O que começou lento se transformou em um beijo intenso edevasso em instantes. Ele forçou meus lábios a se abrirem, e sua línguamergulhava delicadamente na minha boca para ir de encontro à minha.Dando um passo para frente, ele me pressionou com cuidado na cômoda comespelho na qual eu estava me arrumando. Ergui a coxa na direção do toquedele. Me apertando delicadamente, ele soltou minha perna e interrompeu obeijo.Os olhos dele estavam sombrios e a evidência do quanto ele me queriatensionava o tecido de sua calça.— Odeio ser a voz da razão, mas é melhor irmos. Eu não ia querer que vocêse arrumasse toda só para que eu tirasse toda a sua roupa e a fodesse até vocêperder os sentidos antes de sairmos do hotel.O ar saiu apressadamente de dentro de mim com aquela ameaça. A línguadele passeou por seu lábio inferior, como uma promessa sensual das coisasque estavam por vir.— Mas pode ter certeza de que isso vai acontecer quando a gente voltar.Não estou nem perto de atingir minha cota diária de você.— Você está tentando quebrar o recorde de quantas vezes eu consigo gozarem um único dia?Um sorriso malicioso contorceu os lábios dele.— O que posso dizer? Tenho um fraco por aniversariantes.Aquele dia já tinha sido o melhor aniversário de que eu conseguia melembrar. Nada superava ser mimada e bem-amada pelo homem com quem euestava prestes a casar. Eu o empurrei um pouquinho mais e me apressei emficar pronta antes que começássemos algo que com certeza teríamos queterminar.Blake tinha escolhido uma steakhouse famosa na cidade. O garçom nosacomodou em um canto silencioso do restaurante. Fizemos nosso pedido e eleserviu vinho para nós dois. O sol tinha se posto, deixando um brilho pastelsobre o horizonte infinito do lago. Eu mal conseguia ouvir a voz de Blake nofundo.— Em que você está pensando?Saí do meu transe e peguei a taça.— Vamos brindar.— A que devemos brindar?Não ao passado. Ao oposto do passado, na verdade.— Vamos brindar ao futuro.Ele bateu a taça na minha, e o suave tilintar foi o único som entre nós pelosminutos seguintes.— Está feliz por termos vindo para cá?Pensei na pergunta dele, e meu foco voltava para a água cintilante.— De certa forma. Não sei. São muitas coisas para assimilar.Ele se recostou na cadeira enquanto eu contemplava tudo.— Minha família — a família da minha mãe — tem uma casa de praia lá. —Apontei para a janela, para um lugar invisível do outro lado do lago, onde eutinha vivido outra parte da minha vida. — Do outro lado do lago, em Michigan.O olhar de Blake retornou para mim após um instante.— Eu não sabia disso. Quando foi a última vez que você esteve lá?Tomei um gole cauteloso de vinho. O sabor robusto revolveu em minhalíngua, o aroma penetrava nas minhas narinas. Engoli, grata por mais umaexperiência maravilhosa que aconteceu simplesmente por estar na vida deBlake. Eu não tinha certeza se um dia iria me acostumar a ser tão mimada,mas eu amava aquele homem e não discutiria as coisas que o faziam feliz.Meus pensamentos voltaram à casa do lago e à última vez que estivemos lácomo uma família.— Muito tempo atrás — falei, finalmente. — Antes de eu ir para o colégiointerno, passamos nossas férias anuais lá. Foi o último verão em que minhamãe estava viva, na verdade — a última vez que me lembro de me sentir comouma criança. Ela não estava se sentindo bem e não conseguia nosacompanhar. Eu tinha muita energia. As filhas de Elliot me lembraram disso.Sempre nos divertíamos muito juntas, mas, naquele verão, minha mãe nãoestava animada para muita coisa. Ela estava sempre cansada. Eu não sabia, naépoca, que ela já estava doente. É uma dessas coisas que você nãocompreende até ficar mais velho.Fechei os olhos, reprimindo as emoções que ressurgiram com a lembrançadela. Minha mãe. A única pessoa do mundo com a qual eu sempre podiacontar para cuidar de mim, para me ajudar nos tempos difíceis. Céus, eusentia falta dela. Da sua risada e da maneira como ela me abraçava apertado,com cada grama de sua energia, que se esgotava. Soltei um respiro,determinada a me manter firme.— Depois de um tempo, eu voltava à minha mente e tentava me agarrar àsúltimas lembranças dela. Um dia, tudo fez sentido. — Sacudi a cabeça. —Enfim, a família dela sempre foi distante. Nunca brinquei com meus primos enem visitei meus avós, como as crianças normais. Mesmo naquela época,sabendo que ela estava morrendo, eles não mudaram a maneira comointeragiam com a gente. Minhas tias e meus tios moravam na cidade, masnunca tinham lugar para nós. Se os primos brigavam, a culpa, de algumaforma, recaía em mim. Depois de um tempo, comecei a me afastar, a fazer ascoisas sozinha. Sendo filha única, isso não era muito difícil. Minha mãe, Elliote eu íamos nadar ou íamos de carro até a cidade. Criamos nossas própriasmemórias, nós três.Blake esticou o braço, tocando no dorso da minha mão com toda delicadezado mundo.— Por que você acha que eles tratavam vocês assim?— Eu costumava achar que era por minha causa, que o fato de minha mãeter engravidado de mim os decepcionou tanto que as coisas nunca mais foramas mesmas. Mas Elliot me contou uma coisa noite passada...Blake ficou imóvel.— O que ele disse?— Ele me contou que eles queriam que minha mãe forçasse Daniel a secasar. Queriam que ela contasse à família dele e o obrigasse a fazer a coisacerta. Acho que mesmo depois que ele terminou, ela se recusou a pressioná-lo. Minha mãe me queria, e acho que o amava o suficiente para deixar queDaniel vivesse a vida que lhe haviam planejado.Blake ficou em silêncio por um instante.— Ela fez a escolha certa. Imagine como sua vida teria sido com umafamília como a dele.Fiquei desenhando círculos na minha taça, fixando-me na luz que elarefletia.— Sei lá. Às vezes eu penso nisso e fico me perguntando se ela teria feitodele uma pessoa melhor. Ou se teria acabado como Margo. A esposa perfeitaao lado de seu marido político, consumida pelo sucesso atingido e seencaixando perfeitamente ali.Blake deu uma leve risada— Se você for só um pouquinho parecida com a sua mãe, acho que não.Dei um sorriso torto.— Está dizendo que não sirvo para primeira dama?— Não, você é do tipo presidente.Dei uma risada, contemplando aquele pensamento ridículo por ummomento. O empreendedorismo estava indo muito bem, obrigada, mas eu nãotinha nenhuma aspiração política. E também não conseguia imaginar queBlake tivesse.— E o que você seria, então?Ele se recostou na cadeira e ergueu as sobrancelhas repentinamente.— Seu assessor-chefe.Dei uma nova risada.— Parece bom.***Saímos do restaurante no ar frio da noite. Alguns minutos depois,perambulamos na direção da praia, que agora estava escura. O Lago Michiganse estendia à nossa frente como um oceano. Tiramos os sapatos e caminhamosonde as ondas quebravam suavemente na areia. Perambulamos por um bomtempo com a luz do luar e as lâmpadas do calçadão iluminando nossocaminho. Tremi com o frio da noite penetrando na minha pele.— Está com frio?— Estou bem.Eu estava começando a sentir o peso do dia e diminuí o passo. Nossentamos e eu me recostei no calor de Blake, deixando que o ritmo das ondasme ninasse. Uma luzinha de um barco passeava silenciosamente no horizonte.— Para onde vamos agora?Dei de ombros, contente por estar ali com Blake, um alívio silencioso apósum dia cheio de atividades.— O mundo é todo nosso. Podemos dançar, ouvir música, fazer maiscompras.Dei uma risada.— Meu Deus. Não, por favor.— Voltamos ao hotel? — Ele ergueu as sobrancelhas sugestivamente. —Tenho mais coisas a explorar.Mordi o lábio e me inquietei nervosamente. Eu não conseguia parar depensar no que tínhamos feito. Eu não conseguia me lembrar de ter gozado tãoforte com a boca dele em mim antes. A experiência tinha sido intensa, mas eusabia aonde aquilo estava nos levando.Blake segurou meu queixo, forçando-me a olhá-lo nos olhos.— O que está acontecendo?— Nada... Você só... Você está preocupado com...aquilo.— Estou? Quero acesso total ao seu corpo, inclusive à sua bunda. Querovocê de todos os jeitos concebíveis.Quanto mais eu tentava evitar os olhos dele, mais atentamente eles mefitavam.— Erica... Mark não...— Não — respondi rapidamente, ávida por encerrar aquele assunto. — Nãoé isso.— Então o que é? Algo deixa você desconfortável com relação a isso. Seucorpo fica tenso e isso não acontece com a gente. Tem alguma coisa que vocênão está me contando.— Você quer discutir nossos históricos sexuais, Blake? Pensei que vocêquisesse manter o passado no passado.Ele soltou um suspiro pesado e ficou olhando para o lago.— Preciso saber dos seus limites e por que você os tem. Vou ser seumarido...— Se você vai ser meu marido, deveria conversar comigo, e não manter ascoisas em segredo.Ele ficou calado e eu sabia que estava pisando em ovos com ele mais umavez.— Blake, o foco desta viagem não era o meu aniversário. Tem sido tudomaravilhoso, mas a maior parte tem se tratado de encarar partes do meupassado que eu tinha reprimido há muito tempo. Ver Elliot... Fico feliz portermos feito isso, mas eu sabia que vir aqui desenterraria velhas lembranças,coisas que machucam. E eu estou encarando tudo isso.— Você está querendo dizer que eu não estou?— Você acha que está?— Se isso é sobre o que Sophia disse, não há nada que valha a penaconversar.— Ela foi o único relacionamento sério que você teve antes de mim?Ele cuspiu um palavrão, olhando para o lago.— Eu curtia a vida antes de conhecê-la. Eu era jovem. Comecei a crescer epensei que deveria tentar levar as coisas a sério, para variar. Nos conhecemosatravés de um amigo em comum. — Ele desenhou círculos na areia macia. —Acho que dá para dizer que encontramos um interesse comum e eu fiz umatentativa com ela.— E depois dela?Ele hesitou, meneando a cabeça quase imperceptivelmente.— Até você, eu nunca quis outro relacionamento.A determinação daquelas palavras me fizeram pensar que o assunto estavaencerrado de novo. Como se alguém tivesse aberto uma porta para deixarentrar um pouco de ar e a fechado de volta rapidamente, deixando o espaçoentre nós sufocado e tenso novamente. Mas ao menos ele tinha aberto a porta.Por mais que eu não quisesse explicar minhas reservas, concluí que a melhormaneira de fazê-lo se abrir era dando o exemplo.Fiquei mexendo no relógio, brincando com os elos delicados da pulseira.— Comigo foi igual.Ele olhou para mim, me questionando com os olhos.— Antes de Mark, bom... Não houve nada antes dele. Eu era virgem. Fiqueiperturbada por um tempo depois daquilo. Mas o tempo passou e eu superei.Não podia deixar o estupro ditar minha vida e decidi que não podia afastar oshomens e o sexo para sempre, por mais que eu talvez quisesse ter feito issoalgumas vezes. Mas tudo foi... sem sentimento, acho. Era difícil o bastante,para mim, passar das barreiras físicas. Eu não conseguia me permitir ir maisfundo e me apaixonar por alguém.Me encolhi, não gostando das lembranças que surgiram. Eu também nãogostava da maneira como aquilo soava quando eu dizia em voz alta. Euparecia uma vagabunda perturbada e sem coração.— Nem todos foram casos de uma noite só. Digo, namorei pessoas, masnada muito sério. Nunca dei a ninguém a chance de partir meu coração. Eu jáhavia sido devastada o suficiente...Ele se aproximou e colocou meu cabelo atrás da orelha. Mechas finasvoavam com o vento nas minhas bochechas. Inalei o ar frio nos meus pulmões,expirando as lembranças que lampejavam por mim.— Então me conte o que a incomoda tanto no sexo anal. O que aconteceu?Suspirei, me sentindo repentinamente ansiosa.— Eu estava saindo com alguém há um tempo. Tinha tomado umas cervejase concordado que ele... fosse mais longe. Puta merda, você não quer ouvirisso, quer?Ele pegou minha mão e a segurou em seu colo, traçando linhas delicadasna minha pele com as pontas dos dedos.— Não, mas quero que você me conte.Sacudi a cabeça indiferentemente.— Ele me machucou.Ele parou com o carinho, com olhos protetores fixos em mim.— Não acho que era a intenção dele. Não foi como tinha sido com Mark,mas ele gozou antes que eu pudesse pedir para ele parar. Eu não o culporealmente. Acho que ele só estava sendo um cara idiota, pensando com o...Bom, enfim. Havia algo naquilo que era um pouco próximo demais do que eutinha passado. Ele nunca soube por que, mas eu nunca mais liguei para ele. Enunca mais fiz aquilo desde então.— Você sabe que eu nunca machucaria você.Meu coração se contorceu com aquelas palavras doces e meigas.— Eu sei que não. Eu só tenho dificuldades em imaginar que eu poderiagostar sendo que não foi nada prazeroso.— Você poderia gostar.Meu rosto ficou quente e eu fiquei grata por estar escuro. Eu não queriaque ele soubesse, ainda, que eu deixaria que ele fizesse qualquer coisa, melevasse além do meu limite, inclusive esse. Eu não queria admitir, esta noite,que, às vezes, as coisas das quais eu mais tinha medo me excitavam tantoquanto me apavoravam.Fizemos amor aquela noite. Apesar das emoções que tinham vindo à tonaentre nós, não devastamos um ao outro como tínhamos feito tantas vezesantes. Não conversamos sobre o passado. Mal falamos, exceto por nossosnomes nos lábios um do outro.Talvez ele quisesse me relembrar de que podia ser daquele jeito entre nós.Talvez ele não percebesse que eu já confiava nele implicitamente com meucorpo e a maneira lenta e apaixonada com a qual ele me amou provava queele podia ser o que quer que eu precisasse, quando eu precisasse. Os olhos deBlake nunca deixaram os meus e, quando ele gozou, a expressão neles medestruiu. Eu podia ver dentro da alma dele e o que eu vi ali me dilacerou.

POTÊNCIA EXTREMAOnde histórias criam vida. Descubra agora