contagem regressiva (seis dias)

70 7 0
                                    

O porteiro do prédio onde Taehyung mora já me conhecia, então entrei sem qualquer complicação. Estacionei meu carro na vaga para visitas e subo de elevador para o oitavo andar, apartamento 803.

Antes mesmo de tocar a campainha verifico minha aparência na câmera frontal, eu já estive melhor. Como passar a tarde com uma pessoa pode me afetar tanto? eu não a odeio, não teria sentido odiar alguém que faz uma pessoa que eu amo feliz, eu sinceramente desejo muitas felicidades à Heather, mas eu sinto que nunca ao menos tive uma chance e esses pensamentos veem se tornado cada vez mais frequentes desde o pedido de casamento. Respiro fundo, talvez tocar a campainha e derramar mais lágrimas em seus braços só iluda mais minha cabeça ingênua que acredita que ele possa se apaixonar por mim apenas por ver minha cara vermelha e desesperada por seu afeto, tento me arrumar e parecer o mais estável possível porquê não quero sua pena.

Crio coragem e toco a campainha, um barulho soa "ding dong ", uma figura descabelada e de roupão azul aparece ao lado de uma bolinha de pelos, ele se afasta devagar enquanto a bolinha de pelos pula em meu colo. Me recordo perfeitamente do dia em que Taehyung resolveu adotar esse Spitz Alemão, o nome não foi o mais criativo " Yeontan" mas naquela época esse nome era o que mais fazia sentido, ele planejava ter muitos filhos e isso inclui o pequeno cachorrinho.

– Então, o que me dá a honra de sua presença?–perguntou com um sorrisinho de canto, tratou de se sentar ao meu lado no sofá– Soube que passou o dia com Heather para escrever seus votos

– Ela te contou?

– Na verdade não, ela postou uma foto com você nos stories do instagram, eu só deduzi– um silêncio não tão incômodo, mas ainda assim desconfortável, se instalou no ambiente. Existe passagens em livros que acabamos levando para à realidade, completa ilusão meus jovens leitores, certo dia lendo me chame pelo seu nome me deparo com a seguinte passagem: " Existe uma lei em algum ligar que diz que, quando uma pessoa está completamente apaixonada pela outra, a outra deve inevitavelmente se apaixonar também. Amor chá null'amanto amar perdona. Amor, que a nenhum amado amar perdoa, palavras de Francesa do inferno", na época que li isso vi extrema verdade onde hoje só vejo um mecanismo para despertar esperanças em um jovem que não tem seu amor correspondido, com "jovem" eu quero dizer eu.

Sinto a bolinha de pelos ser retirada do meu colo e Taehyung deitar sobre minhas coxas, visualizar seus cabelos grandinhos e bagunçados é como se fosse um convite para um cafuné, assim faço.

–Ainda não me disse o que me dá a honra de sua visita- sua voz sai um tanto baixa.

–Não gostou da minha visita?– digo rindo com sua cara de indignação, logo o vejo negando com a cabeça– Eu não queria ficar só hoje, e eu gosto da sua companhia–  solta um som semelhante a "hm" e se levanta do sofá, sua cara amaçada e olhos inchados me fazem sorrir abobado com pensamentos ridículos de "imagina acordar todos os dias e ver esse rostinho assim?".

Vejo uma mão estendida em minha direção, Taehyung me convida para mais uma de sua observações aos astros celestes, basicamente nós vamos ao ultimo andar do prédio e subimos uma escada de incêndio para chegar ao "teto" do local, lá observamos as estrelas e as luzes da cidade, fazemos isso há um bom tempo. Eu gosto, sinceramente, quando vamos a lugares silenciosos e distantes de todos, é onde fazemos as perguntas mais interessantes e falamos frases mais genéricas, mas que no momento, apenas faz sentido.

Tae levou edredons e travesseiros, Yeontan já estava dormindo em sua caminha enquanto subíamos pela escada de incêndio em direção ao "nosso lugar", arrumamos os travesseiros e edredons e deitamos um ao lado do outro.

– Sabia que o amor da vida de Adriano, que foi um grande imperador romano, se chamava Antínoo. Tanto que quando ele morreu Adriano colocou seu nome em uma cidade– Kim Taehyung tem sua varias especialidades, mas uma das maiores é soltar curiosidades em meio a conversas, principalmente quando estamos sozinhos.

–Assim como Heféstion foi o amor de Alexandre, é até citado em uma música.

–Você acha que os corpos são, de certa forma, poéticos? tipo... Todos nós temos curvas únicas, que não só nos incitam a deseja-las, mas nos fazem querer contemplar e registrar, tocar... Acho que uma das minhas maiores fantasias é desenhar alguém, totalmente nu, não de forma erótica, mas apenas por amar cada centímetro dessa pessoa que me sinto na obrigação de tracejar em um papel... Você não vai falar nada?

–Prefiro ouvir você falar– ele sorriu, um belo sorriso geométrico, que me faz lembrar dos beijos embriagados que demos um no outro- Se por te beijar tivesse que ir depois para o inferno, eu faria isso. Assim poderei me gabar aos demônios de ter estado no paraíso sem nunca entrar

–William Shakespeare?–assenti me virando para fazer contato visual, sua mão foi imediatamente para minha orelha, uma de sua manias era brincar com os piercings que se localizam lá. Quase automático levo minha mão direita para sua bochecha macia depositando um carinho, em alguns dos livros esse momento seria perfeito para um primeiro beijo, mas mesmo que dependesse apenas de mim não conseguiria beijar alguém comprometido. Estamos mantendo uma contato visual prolongado, sinto que até mesmo nossas respirações estão em sincronia, nossos batimentos, o piscar dos olhos. Sinto que nada além de nós existe.

Senti algo iluminar meu rosto, é, já amanheceu e dormimos ao ar livre. Me espanto ao ouvir seu rouco "Bom dia!", sempre admirei sem tom de voz, uma voz grossa e encantadora. Ele se ergue rapidamente e estende a mão, essa rapidez é devido termos deixado Yeontan sozinho, tomara que ele ainda esteja dormindo.

Descemos ao oitavo andar sem trocar uma palavra, ainda estou esperando minha alma voltar para o corpo. Yeontan ainda dorme, parece um anjinho, ainda está cedo e normalmente eu não acordaria essa hora, geralmente acordo ás dez e agora são seis. Apesar dos pesares a visão de Taehyung preparando café, mesmo não gostando de café, não tem preço.

Ele me entrega uma caneca de café, essa caneca é minha já que na época da faculdade eu dormia mais na casa de Taehyung do que na minha, a caneca tem um desenho do homem de ferro e é relativamente grande. Escuto um ruído e olho para minha esquerda, Seokjin, um amigo meu e de Tae havia mandado mensagem à essa hora perguntando sobre a despedida de solteiro, muitos dos nossos amigos estavam animados com isso pois teria bebedeira e churrasco.

– Tae?– chamo sua atenção e ele se vira para mim com um copo cheio de suco na mão, suponho que seja suco de laranja– Jin está perguntando sobre a sua despedida de solteiro

– Vai ser depois de amanhã, o que mais ele quer saber?

– Você vai contratar stripper e essas coisas?– ele começa a rir, será que ele não levou minha pergunta como séria? Eu estou sendo sincero, muitas despedidas tem essas coisas.

– Não, isso seria estranho. Por quê? Você quer que eu chame uma stripper?– se aproximou de mim, eu sinto que estou hiperventilando.

– Não é isso... É só que em muitas festas como essa tem, eu acho meio brega– disse me virando envergonhado, podia sentir minhas bochechas esquentarem– Me emprestar uma roupa e uma toalha? Eu quero tomar um banho antes de ir para casa– ele balança a cabeça em confirmação.

No banho começo a refletir, eu pareço um adolescente de filme clichê, se apaixonar pelo melhor amigo? Sentir borboletas no estômago?  Eu preciso crescer e esquecer dessas coisas, mas inconscientemente ele não facilita. Eu passei uma boa parte do dia de ontem falando com Heather sentimentos que eu tenho para ela escrever e se declarar para ele, vim aqui e troquei carinhos que simplesmente fizeram eu me esquecer de tudo ao meu redor, fizeram-me esquecer que ainda nessa semana ele se casa com outra pessoa.

Eu peco por pensar em um homem compromissado, peco não somente por desejar de forma carnal, mas por ter sentimentos puritanos e romantizados demais, por vim em sua casa e torcer por um beijo, vestir suas roupas e o abraçar como se minha cabeça não estivesse em festejo com esse simples ato de afeto. Ah, se ele soubesse o quanto me faz suspirar apenas com um olhar, ou por me dizer "Bom dia!", tolo apaixonado, eu quero aproveitar essa sensação por alguns segundos sem me sentir culpado.

Me despeço de Yeontan e Taehyung, indo direto para minha casa descansar mais um pouco. Na porta do meu guarda-roupa está um terno, esse que vou usar no casamento, olho para o convite em cima da escrivaninha. Dourado, branco, uma péssima combinação ou eu apenas estou colocando defeito em tudo que vejo ultimamente, tudo que está ligado ao fatídico dia.

Me despeço das evidências aterrorizantes indo para minha cama, onde posso finalmente realizar beijos e abraços que pessoalmente não pude fazer. Não me enterprete mal, mas pensar nele como meu me trás um estranho conforto.

i'm not a heatherOnde histórias criam vida. Descubra agora