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PASSADO
CEDRIC PHOENIX

Uma chuva torrencial caía lá fora. Eu a observava enquanto caminhava ao longo do corredor da Danverport High School — DHS —, em direção ao refeitório. Setembro, início do penúltimo ano do Ensino Médio. Tudo parecia meio cinzento, igual ao céu nublado naquele dia. Era um dia de merda e eu desejava que minha mãe não tivesse me obrigado a ir para a aula. Não estava conseguindo prestar atenção nas palavras dos professores, de qualquer maneira. Meu corpo estava presente, sentado no fundo da sala de aula, rabiscando na última página do caderno. Minha mente, porém, não poderia estar mais distante.

Afundei minhas mãos nos bolsos do moletom cinza, o capuz cobria minha cabeça e me dava a ilusão de estar invisível para todo mundo ao meu redor. Isso não estava acontecendo de fato. Eles ainda me encaravam fixamente e começavam a sussurrar assim que eu passava. Não poderia ser diferente numa cidade tão pequena quanto aquela, afinal. Era como se minha vida não pertencesse a mim, mas a todo mundo.

Respirei fundo, tentando manter a paciência, quando, ao entrar no refeitório, dezenas de cabeças se viraram em minha direção. Queria apenas perguntar que porra estavam olhando. Eu estava prestes a fazer isso quando Daisy apareceu, enroscando seu braço no meu pescoço.

— Puta merda, tem hambúrguer! — ela exclamou, me puxando em direção à fila para apanhar o almoço. Seus olhos azuis brilharam. — Estou morrendo de fome, comeria um boi inteiro agora.

Aquilo provavelmente era verdade. Um time inteiro de hóquei não comia tanto quanto minha irmã gêmea.

Dei uma boa olhada nela. Seus longos cabelos loiros tinham várias mechas cor-de-rosa. Ela vestia suas usuais roupas estilizadas; meia-calça, shorts jeans e uma jaqueta que ela mesma costurou. Estava agindo normalmente desde que acordou naquela manhã, como se os eventos do dia anterior não tivessem acontecido, ou como se ela não se lembrasse deles.

Eu sabia que era só fingimento. Daisy Phoenix era a melhor na arte de fingir. Essa era a defesa que ela havia criado quando nosso sobrenome ficou famoso no distrito inteiro. Apenas colocava um sorriso no rosto e ignorava as fofocas, os boatos. Agia como se não soubesse que todos estavam falando sobre nós. Eu, por outro lado, tinha raiva. O tempo todo.

Novamente os rostos de todos no refeitório se viraram para encarar o grupo que entrava. Os motivos pelos quais eles atraíam atenção eram bem diferentes, entretanto. Aqueles quatro eram a maldita realeza de Davenport. Eram admirados e adorados, enquanto Daisy e eu éramos temidos e evitados.

Daisy riu baixinho.

— Olha só, o olho de Johnny Dawson ainda está roxo — observou ela, achando graça.

Infelizmente ele não era o único que ainda tinha os resquícios da nossa briga da última sexta-feira estampados no rosto. Um leve hematoma tingia meu maxilar e havia um pequeno corte inchado no meu lábio inferior. Eu mal senti a dor na hora, estava ocupado demais garantindo que Dawson pagasse pelas coisas horríveis que havia dito sobre minha família. Acabei pegando leve no final.

— Eu deveria ter batido com mais força — murmurei, cruzando os braços.

— Ele bem que merecia — concordou Daisy.

Desviei o olhar do babaca do Johnny, passando pela figura alta e esguia de Fawn Liang até pousar no casal mais conhecido da escola — e talvez da cidade.

Tyler Adwin e Kennedy Salinger.

Não prestei muita atenção nele, exceto no fato que sua mão estava possessivamente ao redor do braço dela, exposto pelo uniforme da equipe de torcida. Ele sorria, conversando com Johnny e cumprimentando as pessoas no caminho da mesa em que eles costumavam sentar perto da janela. Kennedy parecia muito alheia a tudo, entretanto.

O Inverno Entre Nós (BITTER COLD)Onde histórias criam vida. Descubra agora