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- Ei, acorda.

Billie sentiu uma cutucada em seu braço.

- Você vai perder o café da manhã - os cachos da menina fizeram cócegas em Billie, que abriu os olhos assustada.

- Quem é você? - perguntou afastando-se da estranha que a acordara e que estava perturbadoramente perto.

- Sou Diana, sua colega de quarto. Você dormiu feito pedra - Diana havia colocado os cabelos emaranhados atrás das orelhas. Ela tinha muitas sardas e seus olhos eram pequenos e brilhantes como bolas de gude - vem, eu te levo no refeitório, sua psicóloga pediu que eu te guiasse por hoje.

- Hum, obrigada - murmurou enquanto bocejava - espera só eu procurar meu chinelo.

- Seus pertences estão no armário, você tem que buscar a chave na recepção. Protocolo de entrada, ninguém te avisou? - respirou fundo quando viu a menina de cabelo preto e verde negar com a cabeça - Ok, você tem muito que aprender.

As duas saíram do cômodo. Os quartos tinham janelas grandes de acrílico fechadas, lembravam vitrines, só que mais difíceis de serem quebradas. Pelo menos não mostravam o quarto inteiro. O lugar tinha um cheiro um tanto quanto diferente, de hospital e comida caseira, havia também um particular aroma de lavanda pelo ar. Nada parecido com o que Billie via em filmes ou ouvia em histórias. Era só uma clínica comum com paredes claras e até bem decoradas, na medida do possível. Haviam pôsteres de avisos, campanhas de saúde e um mural no fim do corredor, onde ficava a recepção.

- Com licença? Eu sou nova aqui e...

- Bom dia, Lucy, ela veio pegar a chave do armário de internação primária - interrompeu a menina, sua voz era estridente, Billie apenas assentiu.

- Bem vinda Billie, tenho certeza que você vai gostar daqui. Temos oficinas de artes, sua mãe disse que você toca piano - a moça dizia com um olhar doce, a voz também era suave. Ela procurava a chave nas gavetas do balcão - aqui, sua chave. Seu armário fica ali à esquerda, pode pegar o essencial pra levar pro armário do quarto, mas não recomendamos que leve objetos de valor porque os quartos não têm tranca e não podemos garantir que ninguém possa entrar e tentar pegar alguma coisa. Isso não acontece há anos, mas nesse caso, você pode ligar para a recepção pelo mesmo ramal da enfermaria.

- Obrigada - ela pegou sem jeito a chave das mãos de Lucy, as unhas dela eram grandes e estavam pintadas de vermelho. Billie tinha arrancado as dela durante a última crise.

- Vamos, eu estou com fome - Diana empurrava Billie em direção ao armário - seu armário é o 42, pegue suas coisas, eu te espero na mesa do refeitório. Lembra o caminho né? Quarto 101 - ela saiu andando e deixou Billie falando sozinha.

Ela tinha tantas perguntas, por quê os quartos tinham três dígitos se não haviam pacientes o suficiente? Como a recepcionista sabia tão bem do gosto de Billie por arte? Como era possível a Diana ser tão simpática e tão irritante ao mesmo tempo sendo que ela a conhecia há menos de dez minutos? Billie respirou fundo e tentou ignorar tudo, até sorriu, mas depois deu de ombros. Ao abrir o armário, teve a impressão de ver alguém passando perto dela, mas não conseguiu ver quem era. Ela se concentrou em encontrar os chinelos e a escova de dentes, mas sua visão periférica captou de novo um movimento, ela então se virou.

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