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o dia em que ele chegou

Luke estava sentado no chão do quarto de hóspedes, o armário de bebidas aberto e o paletó jogado na cama. Parei perto da porta, sem saber como entrar, o observando pegar uma garrafa de uísque escocês e se servir. Ele agia como se já conhecesse a casa, e as bebidas fossem suas, com uma mão no bolso da calça e a outra segurando a garrafa, eu poderia vê-lo a noite toda. Mas isso seria estranho. Respirando fundo, dei duas batidinhas na madeira, chamando sua atenção. Quando Luke me olhou, de repente, parecia muito difícil andar com saltos altos.

— Achou o seu quarto — falei, com as mãos entrelaçadas. — E as bebidas.

— Tenho um bom faro para isso.

Ergui as sobrancelhas. Vovô também tinha um ótimo olfato para bebidas. Há alguns anos tinha sido diagnosticado com câncer de fígado, e tivemos que ir para Londres esconder seus uísques, gin, bourbon, champagne e vinhos. Não deu certo, de alguma forma, ele sempre às achava, então, mamãe teve a brilhante ideia de bebermos tudo. Foi horrível. Eu vomitei, acordei com uma enxaqueca terrível e prometi a mim mesma que jamais tomaria algo alcoólico de novo. E no final, o plano não funcionou, vovô continuava bebendo, então apenas fingimos que não sabíamos de nada, até que eventualmente ele piorou, e seu copo de uísque diário foi substituído por soro e remédios.

—... e Los Angeles é enorme.

Pisquei, percebendo que não ouvi coisa alguma do que Luke dizia. Constantemente, eu desaparecia nos meus devaneios e esquecia da vida real.

— Não estava prestando atenção, não é? — indagou ele, e sorriu.

— Desculpe — eu mordi os lábios envergonhada. — Mas então, você não é daqui?

— Austrália — respondeu ele, andando até a sacada. — Mas morávamos em Nova Iorque até algumas semanas atrás.

— Los Angeles é legal, é repleta de arte e...

— Ah, sim, sim — Luke me cortou. — Eu já li tudo isso no panfleto.

Senti minhas bochechas ficarem quentes de vergonha e pigarreei, indo até a porta:

— Bem, hum, boa noite, então.

— Não! Espere...

Outro momento decisivo. Mas eu parei, ao lado da porta, e virei para Luke. Ele tinha uma expressão angustiada e passava a mão pelos cabelos, como se não soubesse o que dizer. Eu esperei, sempre fui bastante paciente, até que ele voltasse a servir de uísque, porém, dessa vez, me ofereceu um copo também.

— Eu não bebo.

— Quantos anos tem?

— Dezessete. Você?

— Vinte e um.

Suspirando, Luke olhou para os dois copos e os virou.

— Sinto muito pelo jeito que falei, não é nada contra você.

— É contra quem?

Luke voltou para a sacada e eu o segui. Nos sentamos no chão gelado e ele encarou o jardim por alguns segundos, e eu fiz o mesmo, apenas seguindo seus movimentos. Não me lembro quanto tempo ficamos parados, lado a lado, ouvindo as vozes e a música do andar de baixo, mas ficando em total silêncio. Não era desconfortável, como achei que seria, era... Interessante, em falta de palavras melhores para descrever. Finalmente, Luke virou o rosto na minha direção e disse:

— O que aconteceu com seus joelhos?

Não deixei de notar como fugiu da minha pergunta.

— Cai daquela árvore — apontei para o salgueiro ao longe. — Não costumo cair.

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⏰ Última atualização: Dec 05, 2023 ⏰

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