Uma lembrança

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Me aproximo da janela para contemplar a tempestade desta  manhã, seguro meu celular com força tentando domar a fúria em mim. Era sempre assim quando a Alana me ligava, seu prazer pessoal segundo ela era atormentar minha vida.

A muitos anos tenho que lidar com essa mulher, ela já tirou tantas coisas de mim. Todas as propriedades, as casas, de tudo que ela tirou o que mais doeu, foi a Fazenda onde eu passava os verões na companhia na minha mãe. Lugar onde eu também descobri que ela não estava nada bem, logo depois disso viemos para cá e ela partiu, depois disso eu tive que refazer minha vida.

Tiro isso da cabeça e vou até o criado-mudo e pego na gaveta alguns papéis que preciso revisar. Desço para a cozinha e avisto o Pietro concentrado em suas panelas, não o cumprimento, pois sei que ele odeia quando o interrompem. Daisy estava apoiada sob a bancada mexendo em seu celular, me junto a ela e sirvo um pouco de suco. Pietro se aproxima depositando sob a bancada um prato cheio de panquecas.

Pietro: Bom dia! – disse de mau humor – Me lembre de nunca mais aceitar as ideias do Luan.

Luan: Porque não se elas são geniais? – disse assim que entrou na cozinha, ele parou e ficou observando – Não sei mais sinto que falta algo – revirei os olhos – Vocês não tem essa sensação não? Tipo algumas pessoas, cor ou sei lá o Pietro falando com as verduras?

Pietro: Eu nunca falaria com as verduras – ele disse ultrajado – E não falta nada – ele me olhou – Thiago?

Thiago: Não falta nada – dei de ombros – Tá me olhando assim porque em Luan?

Luan: Bem eu não ia dizer – ele colocou algumas panquecas no seu prato – Você está com a cara péssima.

Revirei os olhos, Luan era estranho na maioria das vezes, me limito a comer e ele fica a espera de uma resposta.

Thiago: Você é muito inconveniente sabia? – ele fingiu não ouvir o que eu disse – Alana me ligou e acabou com a paciência que eu tinha.

Daisy: Que já não é muita – Pietro concordou com ela – Quer apostar que o Luan vai vim com alguma frase enigmática?

Luan: Não se preocupe com ela – ele sorriu – Logo você vai colocar ela no seu devido lugar, eu diria até que de um jeito bem estilo filme sabe? Quando a vilã é finalmente derrotada.

Daisy: Eu não disse? – ela riu divertida.

Olhei para que ele que ainda mantinha o olhar de quem sabia muito bem do que falava, ele tinha essa mania estranha de falar todas essas frases que para ele fazia o total sentido. Achei melhor seguir em frente com a conversa, quando isso acontecia o melhor era deixar quieto.

Thiago: Tudo certo para a apresentação daquela banda de nome estranho?

Daisy: O nome é Moondust e eles são ótimos.

Pietro: Ótimos? – ele olhou indignado – Você acredita que eles decoraram o meu restaurante e encheram tudo de cor?

Daisy: Um cúmulo não? – disse cheia de deboche – E de quem é a culpa Pietro?

Todos olhamos para o Luan que estava em silêncio comendo, ele reparou no olhares e se pois a sorrir.

Luan: Eles são incríveis, a uns anos atrás todos pensaram em fugir para tocar em um concerto – ele disse misterioso – Os pais descobriram e foi uma briga só.

Daisy: Mais aí um dos pais resolveu levá-los e foi ai que eles estouraram.

Era uma banda conhecida no país e eles faziam muito sucesso e estavam a anos tocando juntos, mais a verdade era que eu não curtia as músicas e por isso mal conhecia os integrantes.

Thiago: Então né – comecei – Tenho tanta coisa para fazer e não vai dar pra ir – Pietro me fuzilou com o olhar e o Luan riu da situação.

Luan: Vai deixar Pietro. Ele se safar dessa? – ele me olhou com uma soberba – Eu não deixava não.

Daisy: Ele não vai fugir não – ela me olhou – Você vai?

Pietro: Ele vai sim – disse – Eu não aceitei essa ideia maluca atoa não, todos vão e fim de papo.

Desisti e deixei isso para lá e voltei a comer, ao terminar me despeço e vou para a sala, ao adentrar a primeira coisa que eu vejo é o lindo e exuberante piano de calda, algo nesse piano me faz sentir sentimentos estranhos, como se ele tivesse ligado a um momento único. Meu pai costumava tocar e talvez seja isso. Mais sempre que eu associava esse piano ao meu pai, meu coração tratava de dizer que não tinha nada haver com isso. Eu tinha que parar de andar com o Luan, ele estava começando a me contaminar com essas suas ideias malucas.

Volto minha atenção para os papéis a minha frente, mas a presença do piano não me deixa pensar muito, ao fundo eu podia ouvir o Luan conversar com a Daisy e tentar convencê-la a dançar. Ver o piano assim fazia eu sentir uma angústia em meu coração e o que o Luan falou faz sentido em minha mente, era como se faltasse alguém aqui.

Luan: Terra chamando Thiago – olhei para ele – Tá aí vidrado no piano, tá tudo bem?

Thiago: Está sim porque? – ele deu de ombros – Você devia parar de encher a paciência da Daisy, você sabe que ela tem vergonha de dançar.

Luan: Vergonha – ele disse um pouco estressado – Isso é demais para mim – foi até perto da estante e pegou uma bola – Quer jogar?

Thiago: Você sabe que eu não gosto de basquete – voltei meu olhar para o piano.

Luan: Então porque você tem um aro de basquete pendurado na parede?

Era uma boa pergunta eu tinha que admitir, resolvi usar o silêncio como resposta. O piano continuava ali e eu não conseguia parar de olhar para ele, porque ele me trazia um vazio tão grande? Porque quando eu me aproximava, sentia que tinham tirado algo da minha mente?

Thiago: Já olhou para alguma coisa e soube que tem algo fora do lugar? – Luan parou de jogar e me encarou – As vezes eu tenho a sensação de que falta o mais importante, como se eu não tivesse vivido o que era pra viver.

Luan: Talvez você não tenha vivido mesmo, esse mundo é louco – o olhei sem entender – Mais possa ser que você viva o que era pra ter vivido – ele olhou para o seu celular – Todos nós na verdade, mais vai ter que ser de um jeito diferente.

Thiago: Está tudo bem? – perguntei assim que vi seu semblante ficar sério.

Luan: Está sim – ele sorriu forçado – Nos vemos quando fomos ao restaurante? – concordei e ele saiu.

Olho novamente para os papéis e decido fazer o que tenho que fazer em outro lugar, aqui eu não conseguiria me concentrar.

Vou para o meu quarto e começo a ler o conteúdo que tinha em cada papel, novamente as palavras do Luan me veio a mente, eu devia estar ficando maluco, quando termino tudo. Vou me arrumar para o show, escolho uma camisa  social branca e um calça preta, calço um tênis e deixo alguns botões da camisa abertos. Saiu em direção a sala e novamente olho para o piano, mais logo trato de ir para cozinha para enfim podermos sair.

No caminho escuto a conversa do Luan e da Daisy, me mantenho em silêncio e observo a noite linda que estava fazendo. Assim que chegamos, adentramos o lugar e não posso evitar o sorriso.

Thiago: O Pietro está odiando cada momento dessa noite.

Daisy: A ele está – ela riu.

Luan: Eu achei brilhante – vi a Daisy revirar os olhos – Vamos hoje essa noite vai ser incrível, eu espero né.

Comei a circular pelo lugar e ver como tudo ali tinha cor, ao contrário do que costumava ser, o restaurante do Pietro era composto por cores escuras, mais hoje eu tinha que admitir, estava encantador.

Havia perto do centro um palco e lá tinha um piano, meu coração bate forte, coisa estranha. Vou para perto da porta que dá para cozinha e peço para chamarem o Pietro.

Thiago: Eu tenho que falar está tudo incrível – ele ficou sério.

Pietro: Fazer piada não é o seu forte – eu ri da cara dele – Tá passando muito tempo com o Luan, hoje ele me deu um avental colorido – explodi em uma gargalhada – Não tem graça.

Thiago: Tem sim – olhei em volta – Você devia usar o Luan não espera por isso, vai ser engraçado ver a cara dele.

Pietro: Pode ser uma boa ideia.

Thiago: Fui – acenei para ele.

Vou até a mesa que fica próxima do palco e me junto ao pessoal, Luan tem uma cara engraçada ao  olhar para o lugar de onde vim, aposto que o Pietro colocou o avental.

Daisy: A ele ficou bonito – me sentei e peguei o copo de suco a minha frente – Ele sempre foi bonito.

Eu desconfiava de que ela era apaixonada pelo Pietro, mas ele com toda a certeza do mundo não tinha ideia.

Thiago: E o show?

Daisy: Logo começa – disse beliscando uns petiscos.

Ficamos comendo e conversando e por mais que eu não gostasse da banda, tinha que admitir que estava sendo uma noite agradável, eu era na maioria da vezes uma pessoa fechada e até um pouco ranzinza, a vida me fizera assim. Mas tinha momentos que eu sentia que esse não era eu e aqui com eles assim, me vinha uma certeza pra lá de estranha.

Luan: Olha já vai começar.

Olho para o palco e vejo os integrantes da banda se posicionar, mas meus olhos não consegue se desvincular da garota a minha frente. Seus cabelos são vermelhos e seu sorriso parece ser capaz de aquecer um mundo congelado, eu a conhecia. Mas de onde?

Thiago: Eu conheço essa garota – disse baixo.

Daisy: É claro que conhece né – ela riu da minha cara – Eles são conhecidos em todo o país.

Xxx: Olá eu me chamo Helena e somos a Moondust – ela olhou em direção a todos – É um prazer cantar para todos vocês.

Helena. De onde eu conhecia ela? Busco na memória mais nada me vem, ela conversa com um dos integrantes e logo começa a tocar e cantar.

A música envolve o lugar, vejo todos rindo e dançando ao som da melodia. Por alguma razão eu não conseguia tirar meus olhos dela, algum tipo de magnetismo me puxava mais e mais a ela e quando me vejo, estou mais próximo a pista de dança que antecede o palco. Mais uma música terminar e mesmo assim eu não consigo entender de onde a conheço, mas a certeza que eu tenho é que não tem nada haver com a sua banda.

Os seus companheiros de banda a deixam sozinha no palco, ela sorri ao se aproximar do piano.

Helena: Que tal um momento mais calmo? – a vejo sentar sob o piano – Essa música sempre tocou minha alma, mais não irei canta-la hoje. Deixem o som de cada nota do piano tocar seu coração – ela respirou fundo – Eu costumo acreditar que a música tem o poder de contar histórias, talvez nesse momento ela conte algo novo ou velho. Talvez ela mostre o que sempre esteve aqui.

O som suave da melodia vai mais uma vez preenchendo o ambiente, de onde estou posso ver como ela toca com amor. Seu olhos fechados e sua concentração ao tocar, faz meu coração bater em um ritmo acelerado e ao abrir seus olhos eles vêm de encontro ao meu.

Uma emoção nova toma conta de cada célula do meu corpo, as luzes vão se apagando e dando espaço a um lugar novo. Ou melhor dizendo, ao um lugar onde não vou a muito tempo.
Não está mais de noite e a sala da Fazenda onde eu passei momentos únicos está iluminado pelo por do sol. Era eu ali, mais parecia ser um eu de muito tempo.


As luzes laranja do sol dava um contraste aconchegante a sala, me encosto no batente da porta para contemplar esse momento avassalador. Vejo seus cabelos até a altura do ombro, meu coração descompassa a medida que ela toca e a cada segundo vai se enchendo de um sentimento único, sei o que sinto por ela. Sei que desde o momento que a vi pela primeira vez senti algo forte, mas nada como hoje. Ela está a tocar sem nem saber o que provoca em minha alma.

Seu sorriso é grande e brilha mais que o sol, a conexão que um dia nasceu entre a gente veio de um momento de dor onde ela não tinha ideia de quem era. Uma garota perdida que em meio a adversidade, mais que lutava sem cessar, essa era a Ana. Que mesmo depois de tudo se mantinha doce e forte.

Não consigo tirar meus olhos dela e cada nota era uma batida do meu coração, me aproximo para vê-la mais de perto e é nesse instante que ela abre seus olhos, quando vejo o mar de emoções que ali continha, eu finalmente entendo o que sinto. Eu estava apaixonado por ela.

Completamente apaixonando por minha melhor amiga, pela garota que vive seu próprio caos.

Sorrio para ela, era um momento onde ela estava complemente feliz e eu complemente certo de que queria fazer parte de todos os seus momentos.

A melodia chega ao seu fim e mais uma vez ela fecha seus olhos é algo só dela.

Thiago: Isso foi – mal consigo formular uma frase – Eu....

Ana: Eu me senti tão conectada ao piano – ela o tocou com carinho – Como se nós dois fôssemos um só.

Thiago: E são Ana – ela sorriu abertamente.

Ana: Acha que um dia eu vou saber quem sou?

Thiago: Eu não acho – ela me olhou emburrada – Eu tenho certeza!

Ana: Eu queria ter essa sua certeza – ela olhou para suas mãos – Mais não sou forte assim – me aproximo mais dela e sento ao seu lado.

Thiago: Que tal um ser o porto seguro do outro? Assim teremos a força para enfrentar o mundo – ela concordou com a cabeça – A minha mãe quer nossa ajuda na cozinha.

Ana: Bom vamos ajudá-la então – ela se levantou indo para a porta, mas parou ao reparar que eu não a segui – Você não vem?

Thiago: Eu já vou Ana – ela concordou e saiu.

Ao vê-la sair respiro fundo tentando acalmar meu coração.
Eu estava apaixonado por uma garota que não sabia seu verdadeiro nome, mas que nesse momento atendia por Ana......

A música acaba e volto ao presente, por mais que haja diferenças, era a mesma pessoa. O que acabara de acontecer aqui?

Olho novamente para ela, que me observava com a mesma intensidade. Ela parece tão perdida quanto eu, tento domar minha respiração, isso era uma loucura da minha cabeça. Como ela estava na fazenda? Como eu podia conhece-la? O que eu vi não parecia ser um sonho, era tão real.

A vejo se afastar atordoada do piano e falar com o guitarrista, ando com pressa até ela, mas paro ao sentir alguém esbarrar em mim. Quando me viro novamente ela tinha desaparecido, novamente sinto a angústia comprimir meu peito e o vazio estava ao meu redor de novo. O que quer que seja tudo isso, tinha haver com ela.

Algo estava errado.

Luan: Ei cara tudo bem? – me viro ao sentir ele tocar meu ombro.

Thiago: Eu.... – ele me olhou estranho – Está tudo bem sim.

Luan: Tem certeza? – confirmei com a cabeça – Vem vamos para casa, já está tarde.

Eu não conseguia entender o que tinha acontecido, mas eu iria descobrir.

O que eu vi não podia ser um sonho, era como se fosse uma lembrança.

Uma lembrança de um eu que eu nem sabia que existia.....



Aaaaaaaaaaa bem vindos ao meu louco mundo hahahaa.
Perguntas? Pq eu tenho várias

Nos vemos e me contem oq acharam, eu amo quando vcs fazem isso.....

Bjos




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