Bordados, laços, recortes de fitas em seda e cetim. Eu gostava de como as pontas de tecido e renda se desatavam entre seus dedos como linhas do destino, enquanto estava a revirar minhas gavetas esquecidas. Com a cabeça recostada na escrivaninha de carvalho, eu pensava sobre todas as coisas que ali se pareciam bonitas naquela posição: como o arranjo de orquídeas que se debruçou em meus livros favoritos ao lado da cama, e as folhas de outono dançando ao vento como se seguissem o percurso de ondas do mar, e em suas costas abrindo-se um ponto de luz como sol à meia-noite, que me leva a redescobrir minha respiração quando eu o avisto. Na companhia de meus pensamentos intranquilos, desejando saber se uma janela para o céu esteve ali durante todo esse tempo, se sempre foi possível para mim estender os meus dedos e tocá-lo.
E isso era tudo que eu podia ver.
Eu não precisava de muito, só um amor como este.
Fechei os meus olhos e inspirei profundamente. Eu gostaria que pudesse conhecer as cores em sua imagem que existe apenas para mim, um rascunho que em nada faz jus aos teus contornos verdadeiros entre papéis de carta e tecidos florais, mas que pertence somente aos meus delírios ao cair da noite. Em memória, um cenário fixo e alinhado, onde você existe no pequeno espaço entre meus travesseiros e fitas-cassete mixadas, eu espero sempre pela mesma sensação que toca meu coração e silencia as minhas palavras de amor. Quanto de ti é preciso ter para que eu me satisfaça? E mesmo nos instantes que antecedem abrir os meus olhos e encontrá-lo, quando sua voz no mesmo timbre suave me convida a retornar para ti, eu tinha medo. As cores desvanecendo-se, e os traços são diferentes sob a meia luz noturna.
Você pode pertencer tanto à mim mesmo aqui neste mundo?
Eu me aproximei só para sentir sua pele em meus dedos. Parece que foi ontem que eu disse pela primeira vez que tinhas cheiro de primavera ensolarada, bem ali, no espaço entre seu cabelo e o seu pescoço. E em meus fios desalinhados, você colocou uma fita vermelha, em um laço mal-feito que não desejava aceitar todas as palavras bonitas que usou para descrever-me. Se eu te olho assim, mais perto, com o coração nas mãos, me envergonha em um calor ardente nas bochechas te amar tão egoísta - ainda que de mim nada sobrava quando suas costas eu assistia partir. Eu tinha que me lembrar por conta própria de que não podia segurá-lo para mim, nesse espaço injusto entre os nossos mundos, eu não poderia tê-lo tanto quanto gostaria.
Mas, como um poema escrito no escuro, eu não quero te ler em voz alta.
Como isso era possível, afinal? Ao passo que meu coração se desmanchava no silêncio, enquanto em suas mãos pousavam as cartas que nunca pude enviar; e ali segurava todo o meu ser, do início que existiu naquele dia de estações em que o reconheci em um parque durante a noite, até o fim do meu para-sempre declarado entre os seus lábios na manhã chuvosa. Eu soube que te amava nas entrelinhas de nossas horas compartilhadas. Todos os dias, a cada segundo, enquanto distraída rabiscava o ano de seu nascimento na última folha de um bloco de notas no meio da tarde, como se para agradecer o significado do arranjo daqueles números. Diante a vastidão do tempo e espaço, no universo sem-fim.
1995; para que nos amássemos entre as folhas no outono.
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1995; nós amamo-nos entre as folhas no outono.
Romance"Mas, como um poema escrito no escuro, eu não quero te ler em voz alta." ©fairypoesie, 2020.