A vila em que moro é afastada ao norte da grande Cidade Dourada, ela fica no limite entre os reinos de Visegrad e Martell. Poucos a conhecem de nome, mas todos sabem dos horrores que ocorrem aqui apesar de não ligarem. Durante um período do mês somos atacados por vampiros de além da floresta. Todos temem o que acontece com quem é levado, mas ninguém nunca fez ou fará algo contra a ameaça. Graças aos céus nem tudo é terrível e vivemos normalmente fora do "período de caça". Nasci nesse lugar e provavelmente morrerei aqui, minha irmã caçula, Alyssa, de cinco anos está animada para a festa em homenagem à lua azul que ocorre a cada dois anos. A floresta está florescendo tudo tem uma cor e um cheiro diferente, como de costume as mulheres vão ao campo colher frutos para as tortas e os homens para as florestas em busca de caça. Aly está tão empolgada que encheu sua pequena cesta com morangos e como sempre ela começa a comê-los antes da hora.
— Alyssa, não deveria comer todos os morangos, desse jeito não teremos nenhum para a torta ou faremos uma torta de ar? - digo rindo-lhe e pego um dos frutos que ela comia.
— Não comerei todos, só a maioria. Quando nosso irmão volta? Estou com saudades. - paro na frente dela me sentando no chão e comendo outro morango com um enorme sorriso no rosto.
— Em breve. Bruce não costuma demorar, provavelmente chegará antes do fim do festival. Eu também estou com saudades. - sorrio para ela logo a abraço colocando a mesma em meu colo. Sei como ela se sente com nosso irmão longe, pois compartilho de sua dor.
— O que acha de apostarmos uma corrida até a vila? Será divertido. - fazia três semanas que nosso irmão partiu para a capital, ele ainda não retornou ou deu notícias. Sei que Eliza está preocupada, me levanto saindo de seu colo dando alguns pulinhos de empolgação.
— Acho uma ótima ideia. Daqui até em casa, quem perder lavará as roupas imundas de Bruce quando ele chegar. - ela salta de meu colo animada. Assim que ela se levanta, pego sua cesta que estava no chão. Sua animação era contagiante então não penso muito e dou a largada para corremos.
Ao meu sinal começamos a correr, atravessamos a floresta rindo e pulando as raízes de algumas árvores que encontramos pelo caminho, não demorou e chegamos na vila, pessoas andavam de um lado para o outro decorando casas e ajudando em outros preparativos. Seguimos andando para casa como pessoas normais ao perceber os olhares sobre nós, entramos em casa e ao fechar a porta caímos na gargalhada. Enquanto coloco as cestas sobre a bancada minha irmãzinha se senta a mesa para me observar e fazer comentários.
— O que acha de me ajudar a fazer a torta para o festival? - me viro para a mesa colocando os morangos em uma tigela com água.
— Gostei da ideia. O Dom esteve aqui mais cedo quando você não estava, ele te deixou um presente. Acredito que você vai casar com ele um dia, vocês ficam lindos juntos. - a observo com uma carinha fofa esperando suas reações ao meu comentário.
— Casar? Não diga tolices, Dominic é nosso amigo e, além disso, ele é filho do visconde. Provavelmente se casará com alguém da nobreza. Agora me ajude com a torta, está bem? - meus olhos recaem sobre ela ao ouvi-la falar de Dom. Apesar de conhecê-lo desde criança, nunca o vi como um pretendente. A ideia de que talvez ele me visse como tal me provoca um frio na espinha, eu? Uma viscondessa? Estou longe de ser uma dama comum quem dirá a senhora dessa terra. Seria loucura.
— Mas todo mundo pensa que vocês dariam um belo casal e eu concordo. Vocês são muito fofos juntos. - lhe respondo com minha voz fofinha para evitar uma bronca.
— Não vamos nos preocupar com o que todos dizem, mas sim em preparar a torta e arrumar seu cabelo. Sobre Dom, somos amigos nada mais, então não há necessidade de falar sobre matrimônio com nosso irmão, está bem? Não quero que ele me aborreça com coisas sobre um casamento que não ocorrerá. - passo a mão por seus cabelos sorrindo para ela enquanto a mesma concorda comigo com um sorriso. Começamos a preparar a torta, logo colocamos a mesma para assar. Depois de um tempo que estava no forno, a tiro do mesmo e coloco para esfriar sobre a mesa, o aroma se espalhou pela casa preenchendo cada espaço, instantes depois minha irmãzinha chega com algumas flores em mãos para colocar em seu cabelo. Pego as flores e vou colocando ao longo da trança bem encorpada que estava fazendo em seus longos cabelos castanhos, quando termino ela sai para brincar, me alegra ver ela com as outras crianças brincando. Aproveito meu momento de paz para me arrumar, tomo um banho e coloco um de meus mais belos vestidos, faço uma trança com as mechas frontais de meu cabelo as prendendo atrás de minha cabeça e colocando flores por toda ela. Não demorou muito e ouço Alyssa voltar para casa animada ouço seus passos pela casa e logo escuto os passos de outra pessoa, sorrio e desço para a sala onde encontro Dominic brincando com minha irmãzinha.
— Elizabeth, vim acompanhar vocês já que Bruce não está. - meus olhos desviam da pequena Alyssa quando percebo a presença de Eliza que está a propósito belíssima.
— Sei que está louco por um pedaço da torta, e eu agradeço por nos acompanhar. - deixo escapar um riso fraco ao perceber a cara que meu amigo está fazendo.
— Não só ele eu também quero torta, sabia que eu ajudei a fazer dessa vez. - observava a conversa dos dois "adultos" até que a torta vira o assunto da conversa, estava orgulhosa por ajudar hoje.
— Verdade, você ajudou muito hoje, vai lá buscar nossa obra de arte para não chegarmos atrasadas. - me abaixo ficando próxima a minha irmã, ao terminar de falar a assisto correr para a cozinha, sorrio fraco e volto a olhar meu amigo.
Nossa espera durou apenas alguns segundos, então peguei a torta das mãos de minha fiel ajudante e saímos da casa acompanhas de nosso amigo, que a todo momento nos fazia rir com suas histórias. Ao chegarmos na festa nos deparamos com uma enorme fogueira, as pessoas dançavam ao som da música animada e bebiam hidromel, coloco a torta na mesa e logo somos puxados para dançar ao redor da fogueira. A festa celebra o início da colheita e o começo do nosso período de paz sem ataques ou desaparecimentos, rimos, dançamos, pulamos, bebemos e comemos a noite toda até o dia alvorecer. Paro de dançar por alguns segundos para repor as energias, Dominic se aproxima de mim com um sorriso animado.
— Eliza, eu poderia conversar com você em particular? É um assunto delicado. - sorrio escondendo meu nervosismo enquanto espero pela sua resposta.
— Claro, vem, vamos para um lugar mais calmo. - respondo a ele segurando sua mão logo saindo da aglomeração, a música era alta e eu mal podia ouvi-lo então o puxo para entre as árvores até que o som da festa se transformasse em um leve burburinho. Seus olhos se fixam nos meus e sua voz quebra o silêncio do lugar.
— Somos amigos desde pequenos, passamos por muita coisa juntos, se lembra da caçada? Você quase matou o velho Nentaked do coração. - rio ao me recordar de nossas histórias. De fato passamos por muitas coisas juntos e sem sombra de dúvida minha vida começou quando eles foram morar conosco.
— Se lembro? Ele contou ao meu pai e fiquei de castigo por dias. - uma gargalhada me escapa e o contagia por alguns segundos.
— Vivemos muitas aventuras… eu gostaria que você aceitasse viver muitas outras… o que estou tentando te perguntar é se… você aceita se casar comigo? - solto uma de suas mãos pegando o anel em meu bolso mostrando-lhe, sua resposta, ou melhor, a ausência dela me deixava nervoso.
— Dom, eu... eu. - não consigo formular uma palavra se quer, seu pedido me pegou completamente desprevenida, olho em seus olhos formulando o resto da frase quando ouvimos o sino da torre seguido de gritos. Um frio percorreu minha espinha e somente uma coisa veio em minha mente.
A função do sino era avisar quando estamos em perigo mais precisamente quando estamos sob ataque, Dominic olha em direção a aldeia e então seu olhar retorna para mim. Ele não precisou dizer uma palavra eu sabia exatamente o que era, corremos o mais rápido possível até a festa e confesso que não tomamos cuidado com os arbustos repletos de espinhos. Pessoas corriam por todo lado em direção a suas casas, vejo vultos passando e deixando um rastro de feridos, enquanto Dominic ajudava os moradores eu me afastei para procurar Alyssa. Pergunto-me o motivo de estarem atacando fora do período, algo está errada. Finalmente a encontro escolhida em um beco, não conseguiremos chegar em casa de qualquer forma. Seguro firme em sua mão e juntas corremos pela rua desviando das pessoas, adentramos a na oficina do ferreiro, enquanto o caos reinava do lado de fora eu abraço minha irmã tentando acalmá-la.
— O que está acontecendo? Eles vão me levar? Não deixa, Liz, por favor, não deixa eles me levarem. – quase chorei de alegria quando vi o rosto de Liz, quando entramos na oficina após atravessar todo aquele caos o pânico toma conta de mim.
— Ei? Vai ficar tudo bem, eles não vão te levar. Se forem burros o suficiente para tentar, eu prometo que os matarei antes de você pedir ajuda. Eu sempre vou proteger você. - deslizo meus dedos por seu rosto e lhe dou um beijo na testa a envolvendo em meus braços. Posso sentir seu coração disparando pela adrenalina, mas ninguém fará mal a ela enquanto eu respirar.
Minha irmã me abraça escondendo seu rosto em meus cabelos, fecho meus olhos tentando me acalmar respirando fundo. Posso ouvir os passos de alguém que se aproxima, quando abro os olhos, vejo um homem parado nos encarando com as ires vermelhas. Por instinto solto Alyssa gritando para ela correr, enquanto o homem tem sua atenção focada em mim. Em segundos ele me coloca contra a parede, a vejo deixar o local pelo canto do olho. Minhas atenções se voltam para o homem, chuto seu abdômen com toda a minha força, o fazendo recuar. Quando meus pés tocam o chão piso em um forcado fazendo o cabo vir em direção ao meu rosto, seguro firme aguardando pelo ataque. Ele avança com um sorriso superior nos lábios, giro a ferramenta em minhas mãos fazendo o ferro adentrar em sua carne. Eu o empurro fazendo o metal perfurar mais fundo, aquilo não o mataria, mas esse não era o objetivo. Pego uma das longas lâminas que estavam no fogo, não me importa se é preciso mais de um golpe para separar a cabeça dos ombros, Alyssa precisa de mim e eu só tenho uma chance. Avanço contra ele com a lâmina em mãos, seu corpo vai ao encontro do chão enquanto sua cabeça vai para fora da oficina. Apresso-me para deixar o local e procurar pela minha garotinha novamente.
Meu corpo vira pedra ao ver um vampiro segurando Alyssa pelo braço esquerdo no centro de toda aquela confusão, Dom estava com a espada em mãos esperando por uma brecha. Medo e raiva tomam conta de mim, quando percebi já havia chutado a cabeça decepada até os pés do homem que segurava minha irmã. Seus olhos encontram os meus, Dominic me segurava tentando me impedir de cometer uma loucura e nem ao menos me recordo de quando ele me segurou. Alyssa chora tentando se soltar em vão, me solto de Dominic e caminho em direção a ela.
— Solte a minha irmã AGORA! - não tenho ideia de onde tirei forças para me erguer e caminhar até eles, mas em instantes eu estava lá, perante ele ao lado de minha irmã encarando seus olhos vermelhos com fúria.
— O que disse, garota? Você quer substituir a menininha por acaso? – como um vermezinho como ela poderia ter matado um de nós? Sua audácia me enfurece, quem ela pensa que é? Pequenas veias negras aparecem abaixo de meus olhos conforme um sorriso aparecem em meu rosto mostrando minhas presas.
— Liz! NÃO, PARA NÃO FAZ ISSO. – quando ouvi o grito de Eliza sabia como acabaria, havia chamas em seus olhos. Ela o encarava não como uma vítima, mas como uma guerreira que o destruiria a qualquer custo.
— Eu gaguejei? Solte-a imediatamente. - minha voz ganha um tom mais firme, eu continuo olhando em seus olhos arrepiantes sem hesitar. Aquilo era loucura, mas não deixarei que levem minha garotinha.
— Talvez não seja uma má ideia levar uma garota maior para o clã. Já que tem mais sangue em suas veias. - solto a garota que segurava e me aproximo da outra que me encarava, minhas presas perfuram seu pescoço rápido de mais para ela reagir. Não vai matá-la, mas vai facilitar o transporte.
— Não! Você não pode fazer isso. - assim que aquele monstro soltou meu braço eu corri para Eliza, mas antes que pudesse abraçá-la ela me empurra me afastando segundos antes dele investir contra ela.
Posso ver Dominic com a espada em mãos determinado a acabar com aquilo, mas quando suas presas deixam minha carne, estou um pouco zonza de mais para lutar. Alyssa volta a se aproximar chorando desesperada, meus olhos encontram os seus e sorrio gentil para ela.
— Você vai ficar bem, prometa-me que vai ser feliz, promete. - me abaixo lhe dando um abraço forte e beijando sua cabeça. Meus olhos vão até Dom não preciso se quer abrir a boca para ele confirmar que cuidaria dela.
O homem me pega pelo braço me arrastando até a carruagem e afastado Alyssa de mim com um empurrão, apesar de me debater o tempo todo ele me joga na cúpula entrando em seguida. Meus olhos se voltam para a janela de onde vejo minha irmã chorando nos braços de Dom. Aquela cena partiu meu coração, mas eu sabia que era necessário para ela estar segura.
— Pare de lamentar garota idiota, não é o que queria? Eu devia tê-la matado. - a olho e desvio o olhar para a janela com desprezo. A carruagem começa a andar e tranco a porta.
— Tenta, mesmo nesse estado eu ainda arrancaria sua cabeça, como fiz com seu amigo, covarde. – havia chamas em meus olhos, não me importa o que vai acontecer se eu morrer levarei o máximo deles comigo.
— Você deveria saber quando ficar calada, não é um pré-requisito dos servos? - estava tão perto de seu rosto que podia ouvir o sangue circulando por suas veias, um sorriso me escapa ao olhar para seu pescoço descoberto.
Nem ao menos vi quando ele se levantou, quando percebi ele já estava em cima de mim. Virei meu rosto por instinto e foi então que senti suas presas perfurarem minha carne, suas mãos seguram meu corpo, a dor beira o insuportável, não consigo me mexer direito e meus gritos parecem rasgar minha garganta. Depois de alguns minutos dolorosos meu corpo não tem mais forças, ele me solta no banco da carruagem. Sinto um alívio enorme, mas em questão de segundos minha visão se embasa e perco meus sentidos desabando no banco. A viagem foi longa, porém não senti a distância, já que estava inconsciente. Quando acordo, estou diante de um homem sentado em um trono, mas ele não me parece com um rei. Sinto minha perna latejar, minhas vistas se embaçarem, e meu corpo amolecer. Reúno o resto de minhas forças para me erguer, os guardas atrás de mim me observam espantados. Meus olhos vão ao encontro do homem no trono, as chamas em meu olhar o desafiam a tentar algo.
— Vamos, se tentará algo faça logo. Eu odeio esperar. – minha voz apesar de fraca estava firme, mas meu corpo não se sustentaria por muito tempo em pé.
O homem se levanta hesitante e caminha em minha direção, os soldados atrás de mim se aproximam e seguram meus braços. Seus olhos me percorrem como alguém que procura algo, ele se aproxima pedindo que os guardas me soltem e para meu espanto vou de encontro do chão. Havia um corte em minha perna, não notei até ele levantar parte de minha saia expondo o corte.
— Se te quisesse morta, você já estaria. - com minha adaga efetuo um corte acima da ferida ao pressionar o veneno começa a sair, ele era mais denso que o sangue dificultando para se misturar, por esse motivo causa uma morte lenta e dolorosa.
— O que está fazendo? - meus olhos quase se recusam a ficar abertos, mas ao sentir ele fazendo o corte em minha perna um grito de dor me escapa, tento me libertar dos homens que me seguram, mas não demora para eu acabar perdendo as forças logo apagando.
— Ela está quase morta. O que aconteceu? - me levanto olhando para eles, volto meu olhar para a garota, me abaixo e ergo sua cabeça para olhar em seu rosto. Levanto-me com ela em meus braços, carregando-a até um quarto, coloco a garota na cama e permaneço ali por alguns instantes até que deixo o local.
— Quem é a garota e por qual razão ela chegou quase morta? - dirijo minhas palavras ao homem que a trouxe, assim que entro novamente no salão os olhares se voltam para mim.
— Ela matou um de nós e eu me alimentei dela. - o lorde caminha em minha direção querendo respostas sobre a garota, mas após ouvir minha resposta desfere um tapa em meu rosto. Com sua permissão deixo o local.
— IDIOTA! Podia ter a matado! Ouçam todos. Ninguém encosta naquela garota. Aquele idiota não trouxe uma refeição, não podemos nos alimentar dela. Não sentiram o cheiro? Realeza, ninguém toca nela ou teremos um exército batendo em nossos portões. - digo em alto e bom som para todos ouvirem e me sento no trono, dispensando todos os membros da corte.
Levanto-me depois de um tempo saindo do salão caminhando pelos corredores, aquela garota me intriga, o que a realeza estaria fazendo naquela vila imunda? Graças a incompetência daquele idiota nossos dias podem estar contados, se ela contar ao rei sua experiência aqui nem mesmo Viktor poderá nos ajudar. Deslizo minhas mãos por meus cabelos tentando tirar tais pensamentos de minha mente, entro em meu quarto e me dirijo a poltrona que fica ao lado de uma enorme janela. A vista é de tirar o fôlego, estamos a beira de um penhasco abaixo de nós, existe um vale cercado por florestas e um rio que serpenteia por entre as árvores, a floresta é densa repleta de animais, plantas silvestres cobriam toda a montanha desde o vale até onde a vista alcançava.
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The Price Of The Crown
Fantasy• Degustação • Centenas de anos atrás a magia ainda podia ser sentida na pele e ouvida como uma canção, magia essa que para nós agora está morta ainda pode ser encontrada em um lugar: Midgard. Uma terra perdida no tempo e repleta de encantos e misté...