O celular de Gael tocou, ele atendeu, e eu saí quase correndo do supermercado, após anotar o endereço do e-mail. Isso aconteceu ontem à noite, mas ainda não sei se agi corretamente. Talvez eu devesse ter esperado ele terminar a ligação para me despedir. Não. Eu já havia invadido demais a privacidade de um estranho. Até agora não acredito que pedi o e-mail de um ESTRANHO! Para dar conselhos amorosos? Desde quando eu sou a pessoa mais indicada para fazer isso? Eu, a garota que tem mais términos do que bolsas no armário. Quer dizer, acho que dá empate. Entre bolsas e términos. Mas não vou me sentir mal por causa disso. Cheguei à conclusão de que o problema é eu não ter encontrado ainda o cara certo. É como nas novelas e nos livros: a mocinha sofre na mão de um monte de filhos da mãe, então, um dia ela encontra o Sr. Perfeito. E são felizes para sempre.
O fato é que fui impulsiva no supermercado. Milhares de casais brigam diariamente. Ou pior: terminam. Imagine se eu for tentar ajudar todos?! Vou virar uma espécie de psicóloga amorosa, como bem acreditou Gael que eu fosse. E mudar de profissão de novo. É claro que brigas e términos são muito tristes. Dói tanto quando eu sei de alguma amiga que se separou do namorado ou marido. Pior ainda é ouvir delas que foi porque o amor acabou. Não entendo muito bem essa explicação. Se era amor, não deveria acabar nunca! Mas procuro não me meter na vida de ninguém. Porque não gosto que as pessoas se metam na minha. Apesar de Diana e Larissa não respeitarem essa regra, claro. Além disso, pode ser também que Gael e Cláudia tenham feito as pazes logo que fui embora. Não prestei atenção na ligação. Vai ver que era Cláudia, mais calma, querendo conversar num lugar reservado. Nesse momento, eles devem estar acordando juntos, abraçadinhos, depois de uma linda noite de amor.
Meu coração dá um salto. Viro-me na cama, da qual estou enrolando para me levantar. De repente, o porte atlético, o rosto sério e a voz grave de Gael invadem minha mente. Para ser sincera, essas “coisas” têm aparecido nos meus pensamentos com bastante frequência desde ontem. Acho que estou impressionada com o ar taciturno do executivo. É. Deve ser isso. Ele parece ser aquele tipo de pessoa que não dá gargalhada nem ouvindo a melhor piada... ou a pior. Coitada da Cláudia! Eu entendo o que ela quis dizer sobre o cara não saber se divertir. Imagine namorar alguém que só pensa em trabalho?! Até nas férias? Nem pelo cara mais lindo do mundo valeria a pena.
Outro batimento descompassado. Mais uma virada na cama. Quem está falando que Gael é o cara mais lindo do mundo? Tudo bem que ele tem olhos impressionantes, queixo anguloso, nariz aquilino; é alto, forte e...
Elise, para de pensar no cara! Foco!
Preciso me decidir sobre o que fazer com o e-mail anotado no meu celular. Por um lado, foi uma atitude impulsiva propor ajuda a um estranho que brigou com a namorada. Por outro, parece-me insensibilidade não escrever, pelo menos, uma vez para Gael, perguntando se ficou tudo bem entre ele e Cláudia. Se ele decidiu me dar o endereço é porque contava que eu fosse passar, pelo menos, uma mensagem, não? Caso eu decida escrever, mas ele não me responda, não ficarei me sentindo mal. O importante é que fiz minha parte.
E se Gael responder?
Boa pergunta. Nenhuma resposta.
Deito de costas. O sol está tentando invadir o quarto, apesar da barreira da cortina rosa na janela. Deve ser tarde já. Preciso me levantar e ligar para a agência em busca de novos eventos. Mas minha cabeça não consegue parar de pensar em Ga... na ajuda que propus a Gael. Se ele topar minha ajuda, o que faço? Que conselhos posso dar para o “maldito-insensível” da Cláudia? Como torná-lo o namorado perfeito para ela? Eu já li vários romances sobre esse tema: uma pessoa dedica-se a transformar outra no par ideal para uma terceira. Mas existem três problemas que impedem de eu me inspirar nessas histórias para tentar unir Gael e Cláudia de novo.
