- 7. o melhor presente

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Siga-me minha querida e saiba que só eu te seguirei
Para lugares próximos ou distantes, me dê um lugar para começar
Ah, para ter você aqui, prometendo a cada passo estabelecido
Que vamos dar o caminho mais longo

...

Julho de 1969

Papai deveria estar furioso.

Também pudera, um homem como ele, que se orgulhava de sua linhagem sanguínea pura, perceber que objetos trouxas era o que mais me agradava como presente. Nellie havia ganhado roupas, um conjunto de tintas e painéis brancos para suas pinturas, e alguns livros. Papai tentara até me dar algo mágico, como aquele lembrol e aquela fabulosa pena que escrevia sozinha tudo o que eu dizia a ela para escrever.

Mas nada me deixaria tão feliz, naquele aniversário, do que o presente de Tio Rigel.

Uma bicicleta azul, com a cestinha de vime repleta de flores roxas.

"Ela é uma criança, não há mal algum em andar de bicicleta.", comunicou vovó, os olhos claros dançando do rosto de mamãe - que parecia não saber qual partido tomar -, e o de papai - que poderia explodir a qualquer momento se a vermelhidão de seu rosto significava algo.

"É um absurdo colocar sobre meu teto tais...coisas.", grunhiu papai, segurando o guidão da bicicleta para que esta não passasse dos portões.

"Alfred tem uma também.", garantia tio Ridgel, tranquilamente. No entanto seus olhos, esbugalhados pelo óculos fundo de garrafa que usava, continuavam revirando a cada vez que papai empurrava a bicicleta para longe. "Não é perigosa, e até é mais divertido que uma vassoura."

"Acha que uma coisa dessa supera o ato de voar?", papai perguntou secamente.

Claro que nada superaria esse fato, mas havia um probleminha que ele não entendia: que tenho pavor de altura.

"Agora isso, porque então não compraram uma vassoura?", mamãe cruzou os braços, mostrando que apoiava papai na ideia de que a bicicleta não era um presente bom o suficiente.

"É um presente.", vovó insistiu. "Presentes não devem ser devolvidos. Eddie, querida, venha até aqui!"

Dei alguns passos para frente, revelando que estava ali entre eles, escutando a discussão, a algum tempo. Ofereci um sorriso para meus pais, nem um pouco preocupada por tal flagrante - mas já esperava pelo sermão que viria assim que o último convidado de mamãe fosse embora.

Nada daquilo me importava, no entanto. Eu queria muito andar naquela coisa azul, até mais do que na vassoura de Bhaltair - não que ele soubesse que voar em sua nimbus era algo rotineiro para mim.

Caminhei até eles saltitando, sabendo que mesmo diante dos olhares desgostosos de papai, ninguém iria contrariar vovó.

"É para mim?", fingi surpresa, evitando dar a entender que estava escutando a discussão desde o começo.

Vovó revirou os olhos.

"Sim, sim."

Parei ao lado de papai, que ainda segurava a bicicleta, dando alguns pulinhos de ansiedade.

"Vou ensiná-la.", empolgou-se Ridgel, puxando o guidão para si.

Papai estreitou sua atenção sobre o irmão de minha mãe antes de finalmente desistir da posse do guidão, e deixar com que tio Rigel me guiasse para longe de suas vistas.

Até o final da tarde, me tornei, talvez, a melhor ciclista que Lavanda já vira em toda sua vida. Abandonei as instruções de titio, pedalando velozmente pela estrada de terra, sempre gritando, rindo e acenando para todos que estavam aproveitando o fim de semana nos jardins das próprias casas.

Sentindo a brisa morna do vento batendo em meu rosto, a apreciando como era maravilhoso fazer aniversário no verão.

Consegui subir a colina, e passei a gritar pelo nome de Atticus quando reconheci seus cachos bagunçados em meio ao jardim extremamente verde de sua casa. Ele, que parecia ocupado ajudando sua mãe a ajeitar os arbustos, abandonou a cesta que estava em suas mãos assim que me viu, e começou a correr na minha direção sem se importar com as reclamações e berros da Srª Thomasin.

"Voltem aqui, crianças teimosas!", era o que Jocelyn dizia, largando o cesto e tentando acompanhar-nos na veloz corrida pela estrada de cascalho.

Não levou muito tempo até ela desistir.

*

Pedalar pelas longas estradas de terra da vila de Lavanda tornou-se o meu principal lazer. Por existir aquele banco de ferro - a garupa, se não me engano - logo atrás de mim, passei a carregar Atticus e Nellie para todos os lados.

Atticus era sempre o mais empolgado por nossos passeios. As vezes ficando em pé acima da garupa, tentando equilibrar-se como um exímio malabarista circense. Obviamente que isso ocasionaria alguns ralados e machucados mais difíceis, como o trincado de seu dedo mindinho.

Juro que nunca fiquei com tanto medo de Jocelyn Thomasin quanto quando ela viu seu filho curvado sobre o braço, chorando e rindo ao mesmo tempo - com certeza em choque por ter rolado pela terra depois de nossa queda. A sua cara era tenebrosa e suas palavras, logo depois do choque ir embora, foram rudes a ponto de mamãe cortá-la e me levar para casa.

Mas que culpa eu tinha se alguém tivesse colocado aquela pedra no meio da estrada?

Isso não desanimou Attie, e mesmo proibido de subir na bicicleta, nós ainda davamos nossas voltas depois que saímos da escola.. 

Fenelle, no entanto...

"Vai mais devagar, Eddie.", ela pedia tremulamente, agarrando-me pela cintura com força.

"Pare de ser molenga.", ri do desespero da minha gêmea, ignorando o fato da bicicleta estar pegando velocidade surpreendente na rua de paralelepípedos da vila. "Você que quis vir comigo, agora aguenta!"

"Nós vamos cair, eu vou me machucar.", gritou Fenella, quando elas atravessaram o primeiro cruzamento da vila aparentemente não movimentada. "Eu não quero morrer, Eddie. Não quero!"

"Relaxa irmã, nós da segunda série não temos medo de nada.", brinquei, pedalando com mais empenho para que conseguíssemos passar pelo segundo e último cruzamento da vila.

Tornou-se um costume usá-la para ir em qualquer lugar, até mesmo quando se tratava de subir o morro a caminho do forte. A tal da bicicleta passara a ser uma das minhas relíquias, assim como aquele relógio antigo que não funcionava e aquela placa enferrujada que seu tio retirara do carro.

Relíquias que eu tinha muito ciúme de compartilhar.

...

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