Era uma simples manhã de outono, na qual as árvores denunciavam a estação, permanecendo recheadas de folhas em tons de laranja.
Eu andava para a escola como faria em qualquer outro dia. Passei pela mesma vizinhança de sempre e pelas mesmas pessoas. Era para ser apenas uma manhã. Eu iria para a escola, adormeceria na aula de geometria e comeria sozinho no intervalo.. Mas eu não estava preparado para o que estava por vir.
Você pode me chamar de Liam Miler. Eu posso parecer apenas um garoto quieto que é ignorado pela classe e não sabe diferenciar a vida real e os livros de fantasia, mas posso lhe afirmar que sou um pouco mais interessante que isso.
A diferença entre mim e os outros que citei anteriormente é que eles não precisam colocar um esparadrapo em seu olho direito toda vez que saem de sua casa.
Desde que eu me conheço por gente eu sei que não sou comum. Nunca tive os olhos de uma criança comum, pois nenhuma delas possui um olho totalmente negro. Não apenas a pupila ou a Iris, mas ele por completo.
Meu pai me ensinou desde que eu era muito pequeno que eu precisaria esconder isso de todos, pois se alguém descobrisse de alguma forma, eu poderia me considerar morto. Não pelo meu pai, mas por outras pessoas.Nunca entendi muito bem o que isso significaria, mas não questionei.
Sempre ficando o mais longe possível de pessoas. Sempre recusando qualquer indício de amizade que poderia se aproximar. Eu era praticamente invisível.
Sabia que ter amigos não era parte da lista de "coisas que eu não poderia fazer" escrita pelo meu pai, mas sempre fui medroso demais para correr o risco.Mesmo sendo basicamente invisível, eu ainda teria de aguentar idiotas como Marcus Smith. Ele era o clássico garotinho mimado que poderia fazer tudo sem nunca ser expulso. Seu pai era dono de uma grande empresa, da qual não me lembro o nome, mas que o fazia lucrar muito. Por motivos como esse, o dinheiro sempre falava mais alto, o que causava o meu inferno.
Quando cheguei à escola fui andando até a minha sala de aula, o nono ano b. Mas antes de conseguir chegar ao meu destino, percebi que não seria tão simples.
Marcus se escorava na porta da sala de aula, não permitindo a minha passagem.
- Poderia me deixar passar, Marcus? - disse eu, com a voz de alguém que acabara de acordar - não tenho tempo para isso hoje.
Quando tentei novamente passar, Marcus colocou a sua perna em uma posição que bloquearia ainda mais a passagem.
Eu não tinha paciência para ficar dando atenção para aquele sem noção. Levantei lentamente a minha cabeça para ver seu rosto. Ele possuía um sorriso arrogante e um olhar petulante, ou seja, nada diferente do normal.
- Eu não estou nem um pouco afim de ter uma briga no meio do corredor, tente ser decente uma vez na vida e me deixe passar - Eu falei com rigidez. Mesmo ele possuíndo muito mais força física que eu, por conta do futebol, eu nunca seria o seu saco de pancada, como muitos outros seriam. Eu não tinha medo dele.
- Eu fico pensando, Liam. - e lá vem o discurso - Você é sempre tão sozinho, sempre pensando em si mesmo. Eu sei que você não é nem um pouco tímido, então não é por isso. Mas tem algo que eu sempre achei muito estranho sobre você... - ele se aproximava devagar, como uma cobra que esperava o momento certo de dar o bote.
- Você está esperando eu te dar um surra para me deixar passar? - Eu reclamei, não suportando ficar mais nem um segundo perto dele.
- Ninguém te ensinou a não atrapalhar enquanto os outros estão falando? - apesar da fala, a sua expressão permanecia calma - como eu estava falando, tem algo muito estranho em você, não é?
Eu não havia percebido, mas enquanto discutíamos, uma multidão de alunos fazia um círculo em volta de nós.
Todos pareciam um pouco confusos com o que ele perguntou, mas alguns concordavam.- Você nunca tira essa coisa do seu olho. Eu sei diferenciar um esparadrapo de algo que você usa por necessidade - ele agora estava cerca de cinco centímetros de distância - Pode até dizer que você tem alguma doença rara ou algo assim, mas eu sei que você esconde algo, só não sei o que.
- Guarde suas teorias da conspiração para outra pessoa, eu não quero mais saber - depois de falar eu fui correndo na direção da sala, tentando desviar dele, mas Marcus me agarrou por trás com mais duas pessoas. Como pude por um segundo pensar que este plano daria certo?
Eu lutava para me libertar dos três, mas não adiantava de nada. Sentia tudo girar e a única coisa que ouvia eram os gritos de todos em volta "Briga! Briga! Briga!".
Dois deles me deixaram paralisado. Eu não conseguia mais mexer o meu corpo. Marcus continuava na minha frente, perto demais para ser ignorado.
- Vamos descobrir o seu segredinho - eu girava a minha cabeça de um lado para o outro, mas ele era mais forte e arrancou meu esparadrapo com toda a sua força. Doeu muito, mas meu reflexo foi fechar os dois olhos.
Eu já estava cansado, só queria ir para a aula como sempre faço. Não existem professores competentes neste lugar para separar uma briga? Pensei.
Ele agora forçava o meu olho. Eu tentava fazer algo, mas doía demais, então acabei abrindo-o por conta da força bruta de Marcus. Não teria mais o que fazer e eu não aguentaria ficar a manhã inteira assim.Algumas pessoas até tentaram separar esta briga unilateral, mas não conseguiram. Ninguém conseguiu.
A expressão de todos era petrificada. Ninguém entendia o que estava acontecendo. Me olharam perplexos e enojados. Alguns até com medo. Haviam pessoas conversando, tirando fotos.. Eu apenas fechei os olhos novamente, mas o estrago já havia sido feito.
Deixei uma lágrima correr pelo meu rosto. Tudo que eu havia feito para esconder essa marca, todo o esforço foi para nada. Era uma lágrima de frustração, de medo e angústia.
Mas quando eu abri meus olhos novamente, eu não estava mais no corredor. Não haviam mais pessoas me olhando torto, celulares apontados para mim ou cochichos. Eu estava agora caindo. Literalmente caindo do céu. Mas eu não estava sozinho, pois sentia alguém agarrar a minha cintura.
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O outro anjo - livro 1
FantasiApós a guerra entre anjos e demônios, descobre-se a existência de um filho proveniente destas duas espécies. Seu nome é Liam, um adolescente de quatorze anos que foi ensinado desde muito pequeno a se esconder de todos. Seu pai - um humano - nunca l...