Diante de Mim

Primavera

Uma primavera está vindo.
Uma primavera sem você aqui está vindo.
Novos dias virão.
Novos dias sem você virão.
Chegará, enfim o verão.
Sobreviverei pelos dias escuros
com um hibernante coração.
A noite vai passar, e eu, a esmo,
voltarei a viver;
voltarei a enxergar.
A manhã chegará
e eu, quando abrir os olhos de cataratas
hei de ver um novo mundo.
Um mundo onde a primavera chegou.
Onde a primavera sempre florescerá.
Sobrevoarei junto dos bem-te-vis
que pousarão à espreita da janela
para que calma e felizmente
eu possa parar de sonhar.
E pararei de sonhar com a primavera
quando ela chegar
— quando as orquídeas rosarem
e a geada parar de sanar.
O frio parará de cessar
os sentimentos,
pararei de tremer
com a chegada da primavera.
Os dedos trêmulos colherão
gérberas e violetas,
escalarão ipês e tulipas.
Sobrevoarei os rios e lagos
junto das borboletas
quando a primavera chegar.
Serei eu, finalmente, amada
e logo em breve, esquecida
mas com a chegada das flores
me sinto acolhida.
Hão de esquecer-me
quando os girassóis abrirem
e deixarão de por mim olhar
quando a primavera chegar.
Quando as flautas pararem de tocar
e os dias finalmente aquecerem,
levantarei os olhos ao horizonte
e verei um mundo de paz.
Descansarei no balanço daquela árvore, assoprarei os dentes-de-leão
e encontrarei aquela que sinto saudade.
Deitarei no gramado
e me contarão algumas histórias,
me colocarão uma margarida no cabelo
e dirão: você precisa ficar.
O amor há de voltar
quando a primavera chegar.
E amarei, juro, amarei
até que meu coração pare de bater
até que ele pare de sangrar.
Mas não posso, não posso ficar,
preciso seguir as trilhas tortuosas
— a minha paz encontrar.
Já que o mundo não posso mudar,
o que posso fazer é esperar
e até que meu último suspiro se dê
espero, paciente,
a primavera chegar.