Capítulo Dois - Gael

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- Maldita hora em que escolhi estudar medicina – esbravejo me jogando no sofá.

- Qual é o problema, querido? – Mamãe pergunta deixando sua revista de lado.

- Um velho decrépito chegou em meu consultório reclamando de uns efeitos colaterais de um remédio no qual eu receitei. Qual o problema dele? Todo maldito remédio tem efeitos colaterais – falo com toda a raiva que há dentro de mim, aquele velho maldito ainda me fez devolver o dinheiro da consulta, não que o dinheiro fosse lá fazer falta para mim, mas para ele talvez. Só odiei sua arrogância, e claro que sua burrice também.

- Coisas assim sempre irão acontecer em sua carreira, e respondendo a sua pergunta você escolheu medicina porque queria ajudar as pessoas. E você é o melhor cardiologista da região, Gael. Lembre-se disso – ouço minha mãe falar cada palavra com atenção.

No entanto não deixo de pensar que talvez ajudar as pessoas não seja o que eu realmente queria.

Dou um beijo na testa de minha mãe em agradecimento pelas palavras e subo para tomar um banho. Ainda vai dar meio-dia, mas como não tinha mais pacientes na clínica hoje, resolvi vir mais cedo para casa de meus pais. Mamãe resolveu fazer um almoço de última hora e chamou toda a família, confesso que queria ir para meu apartamento pedir uma boa massa em um restaurante italiano e ficar por lá até ter que ir para o hospital.

As manhas eu trabalho em meu consultório pessoal atendendo pessoas que não tem muito dinheiro, cobro apenas uma pequena taxa para os gastos da clínica, a tarde e à noite eu tenho turnos no hospital principal da cidade, o que já me cansa bastante, mas estou feliz por esse ano a minha carga horaria ter diminuído apesar de vez em quando aparecer algumas emergências e eu ter que sair correndo no meio da noite de meu apartamento.

Ser um famoso cardiologista tem suas vantagens e suas desvantagens, as vezes uma compensa a outra. Principalmente quando as vantagens envolvem ter a mulher que eu quiser e quando eu quiser. Afinal fama, beleza e dinheiro servem para muitas coisas e burro eu seria se não aproveitasse isso.

Entro em meu quarto que mamãe insiste em deixar do jeito de quando eu saí de casa, a cama está na mesma posição, o enorme guarda-roupas também, a escrivaninha e meu antigo computador permanecem no mesmo lugar com a estante cheia de livros da faculdade ao lado, alguns pôsteres dos Beatles espalhados pela parede. Sinto até um sorriso se formar em meu rosto ao lembrar dos tempos da faculdade, tudo se resumia a estudar, sexo, baladas e bebidas, parecia invencível naqueles anos, mas a realidade é diferente, claro que não tenho do que reclamar mais agora é tudo mais cansativo e não tão divertido.

Após deixar meus devaneios de lado vou direto ao banheiro tomar um banho para esfriar a cabeça, o dia começou estressante e só de lembrar que tenho que enfrentar quinze horas seguidas naquele hospital sinto vontade de me afogar nessa banheira.

Quando ouço barulho de crianças lá embaixo noto que já fiquei tempo demais de molho então me levanto, peguei a toalha que estava pendurada no box e a enrolo em minha cintura. Ao sair do banheiro vejo uma figura de olhos azuis, cabelo loiro ondulado, magra como uma daquelas modelos de capa da Vogue, e como sempre com aquele olhar se superioridade estampado em seus olhos.

Alguns segundos passam até ela sentir minha presença, então ela olha para mim e lança um de seus famosos sorrisos prepotentes.

- Olá, maninha. – Digo retribuindo o mesmo sorriso, afinal dizem que esse sorriso é a marca da família Lombardi.

Quando se é uma família que tem um certo império as pessoas dizem e inventam muitas coisas, mas não nego de nos acharmos superiores em muitas coisas.

- Oi, idiota. – Gabi diz se levantando de minha cama.

Ela está como sempre, impecável, não é à toa que estuda moda.

Apenas Um OlharOnde histórias criam vida. Descubra agora