Capítulo 3

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Aquele sentado na primeira cadeira batendo compulsivamente os pés... Robin tinha certeza de que já o vira antes em algum dos DVDs de trash rock alemão do Shane.

Ah, droga. Shane.

Ela não quer pensar nisso agora. Para falar a verdade, não queria pensar sobre, pelos próximos, hum... oitenta anos. Mas só para resumir, pode-se dizer que o fato envolve três protagonistas: a cama de casal que Robin dormia aos finais de semana, Millicent Jones — a garçonete aspirante a atriz que trabalhava no Rainbow — e Shane, o vocalista da Red Lips e agora também ex-namorado de Robin.

Mas voltando a situação atual...

Robin estava fazendo um exercício e tanto de respiração: autocontrole, autocontrole, autocontrole... só que pela forma como suas bochechas estavam queimando era o descontrole quem estava estampado na sua cara. E seu nervosismo não tinha nada a ver com o fato de ser a única mulher ali. Mas porque não possuía nenhum terço do currículo de todos os outros guitarristas.

Ainda não acreditava que dera ouvidos a Mia. Não era um coral da escola, era a Dark Paradise, pelo amor de Deus. Os caras podiam fazer um show na Antártida que os pinguins iriam estapear-se com suas asinhas para disputar um lugar na área VIP. Onde ela estava com a cabeça em tentar uma audição dessas?

Ah, sim: a cama, Millicent, Shane.

Talvez dez anos de terapia a fizessem esquecer a posição em que flagrara os dois. Milly já havia contado que fora ginasta quando no ensino médio. Robin só não imaginava que Shane estava empenhado em verificar que a garçonete do Rainbow, que costumava adular Robin com bebidas acompanhadas de guarda chuvinhas fofos, ainda tinha flexibilidade.

Muita flexibilidade.

A porta do estúdio se abriu como um baque violento. E lá veio o candidato número vinte e nove, não muito feliz. Robin olhou para baixo. A vergonha alheia não era algo para se admirar, principalmente quando você era um dos próximos na linha do abatedouro. Disfarçou limpando os óculos de acetato, grandes demais para seu rosto. Na correria entre agredir Shane, puxar os apliques de Milly e enfiar suas coisas na mala, Robin optou por dar atenção às duas primeiras e acabou se esquecendo de dois kits novinhos de lentes de contato no apartamento de Shane. Ela costumava deixar algumas coisas lá, principalmente as que Juanita poderia classificar como uma espécie de brinquedo ou engolir achando se tratar de algum doce exótico.

Nunca iria se perdoar por isso.

— Cretino.Filho.Da.Puta! — O número vinte e nove saiu pisando duro. O mesmo que mais cedo havia se vangloriando de ter substituído o guitarrista da Dragon Frost em três shows e também ter feito parte da extinta Trolls of the Underground.

Que coisa. Eu teria apostado que a vaga era dele.

Mas o que ela estava dizendo? Eu aposto em mim, ora bolas! Em mim! Mais um pouco de otimismo, Robin, por favor!

Sol estava em Marte, lembra? Seja lá o que isso significasse.

Agora eram só ela e o moço com síndrome das pernas inquietas. E algo na forma como ele a olhou antes de entrar no estúdio fez Robin ter certeza de que o homem acreditava ser detentor de alguma vantagem pelo fato da única concorrente restante ser do sexo oposto.

Imbecil.

Ela já estava nessa há muito tempo para identificar um machista quando via um.

A porta antirruídos se fechou e ela tentou não pensar no candidato. E também não pensar na cara cética da Defensora que lhe atendeu mais cedo a respeito da intimação judicial enviada pelo pai de Juanita, ou que os juros da hipoteca atrasada estavam deixando a dívida dos países subdesenvolvidos com inveja. Que, naquele momento, ela não tinha nem o cachê da Red Lips, nem o emprego na pizzaria.

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⏰ Última atualização: Jun 10 ⏰

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