ela (outro eu, que é você)

Parte 1: O sumiço dela

PARTE I: O sumiço dela

A tinta estava estranha. Ela não estava se misturando, por mais que Baekhyun acrescentasse qualquer solvente, a mistura apenas se tornava cada vez mais aquosa. A cor ficava cada vez mais fraca, perdendo pigmentação.

— Tenha calma, Byun, não é uma corrida. — uma voz soou por trás, nem um pouco convidativa, tendo o efeito contrário de seu objetivo: ao invés de tranquilizá-lo, apenas fazia com que ele se sentisse mais nervoso, ranzinza. Byun Baekhyun odiava a sensação de quando algo estava fora de seu controle, e hoje, infelizmente, era um daqueles dias em que nada estava sob seus desejos.

Baekhyun era pintor. Um artista plástico que havia se popularizado recentemente por meio das redes sociais; um jovem talentoso que, por sorte ou habilidade, nunca saberemos muito bem, estava crescendo em sua carreira. Com apenas 28 anos — e poucos mais de quatro anos pintando profissionalmente — , o Byun possuía um ateliê, cliente fixos, obras em exposições e, o que para si era o mais luxuoso artigo de todos, um agente o qual respondia profissionalmente por si. Era tudo o que poderia desejar, tudo o que qualquer jovem artista como ele poderia sonhar para si antes dos 30 anos. Uma vida estável, vivendo da arte que produzia. Era perfeito.

Ou seria, se não fosse tão estressante.

— Não estou nervoso. — Baekhyun respondeu baixo, entredentes, evidentemente bravo, enquanto ainda apertava as cerdas do pincel contra o godê, dissolvendo a tinta.

O artista plástico não era um desses rapazes de temperamento difícil. Para falar a verdade, ele estava apenas passando por um momento irritante. Estava soltando pequenas farpas carregadas de estresse e raiva há um certo tempo; não era um feitio o qual se orgulhasse, mas era uma verdade. Seu agente, o qual acompanhava-o para cima e para baixo, estava lhe dando nos nervos no último mês, por conta de uma exposição que ocorreria no mês seguinte. Aconteceria em uma grande galeria de arte muito popular em Seul e, se desse certo como gostariam, seria o último item responsável por alavancar de vez a carreira do artista plástico.

Por ser um grande evento, seu agente estava mais do que empolgado, para falar a verdade, o homem parecia tão enérgico atrás de si, cobrando e esperando por trabalhos prontos, que tornava-se insuportável. Estava para completar dois meses desde que Baekhyun havia sido praticamente jogado dentro de seu ateliê e, sutilmente, instruído a não sair até que todas as 20 telas estivessem feitas.

E o Byun havia completado 19 até então. A última, a única que faltava para que finalmente pudesse respirar em paz, era a mesma tela a qual não estava recebendo qualquer pincelada.

— Byun, devagar. — novamente, o mesmo timbre grave que não pertencia a si cortou a quietude do ambiente, sobrepondo a música baixa que escapava do notebook aberto de Baekhyun. Era seu agente, de pé atrás de si com os braços cruzados rente ao peito, vigiando-o.

Às vezes, Baekhyun perguntava-se se era assim que os cantores se sentiam com os agentes, ou se os idols que via na televisão sentiam-se da mesma forma que ele se sentia: preso, entediado, furioso.

Tentando conter um gemido irritadiço, Baekhyun mordeu os lábios, aplicando ainda mais força no cabo do pincel. A tinta ainda não estava como ele queria.

— Baekhyun, você não irá conseguir pintar se continuar assim. — o agente aconselhou.

Ignorando-o deliberadamente, o pintor pescou um tubo de tinta, espremendo a pasta de cor ocre até que não sobrasse praticamente qualquer outro resquício de tinta na embalagem. Não demorou para que o cheiro forte da tinta acrílica se espalhasse pelo pequeno cômodo.

Com o godê repleto de cor, Baekhyun tornou a fazer sua mistura.

Percebendo que não havia muito o que discutir, o outro homem desistiu, puxando um banco para se sentar. O arrastar dos pés de madeira riscando o chão do ateliê, trazendo arrepios aos pelos da nuca de Baekhyun. Por Deus, sua vontade era de largar o godê e ir embora.