Capítulo 3 "Fósforo e gasolina"

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Ele é um trapaceiro, ele não é bom de jeito nenhum
É um perdedor, ele é um vagabundo
Ele mente, ele blefa, ele não é confiável
Ele é um otário com uma arma arma-arma-arma-arma
- Criminal (Britney Spears)
...

A tarde saímos para o arrastão semanal, que ocorriam dois dias da semana. Não era todos os órfãos que roubavam para Abigail, apenas alguns escolhidos a dedo por ela mesma. Esses, "privilegiados", como Abigail Evans nós intitulou, éramos responsáveis por adquirir o máximo possível de dinheiro alheio, sem ser pegos.

Parecia difícil para quem não tinha experiência, mas para nós, crianças e adolescentes que cresceram nas ruas, sem comida e um tostão no bolso, sobrevivendo com o pouco que conseguíamos roubar dos outros, era como tirar doce de criança.

O esquema era o seguinte, enquanto três de nós ficávamos responsáveis por atrair e distrair uma quantidade x de pessoas, com atrações artísticas como malabarismo, dança ou tocando algum tipo de instrumento, os outros "aproveitavam" para passar a mão nos bolsos e bolsas ali presentes. Rápido e discretamente. No final do dia, prestávamos conta, com Abigail. Caso não tivéssemos roubado uma quantidade, dentre os seus padrões, éramos castigados, como aconteceu com Beatrice.

Nenhum de nós gostava de fazer essa merda, mas não era como se tivéssemos escolha. Não era um pedido, era uma ordem e tínhamos que obedecer, se caso não quiséssemos sofrer as consequências depois. Obedecíamos, por que tínhamos medo do que ela faria conosco, éramos crianças que não tinham nada, não tínhamos família, não tínhamos um nome no meio da sociedade, não tínhamos casa e ninguém que se importasse se estaríamos vivos ou mortos. Se algo de ruim acontecesse com qualquer um de nós, ninguém se importaria, estávamos sozinhos, era cada um por si, e só nos sabíamos o que era preciso para continuar respirando, mesmo que tivéssemos que fazer coisas de que não nos orgulhássemos.

As vezes é insuportável abrir os olhos e lidar com a realidade.

A música cigana soava por toda a praça, enquanto o corpo de Laila, uma de nós, mexia-se sensualmente conforme cada batida. Olhei para os dois lados, me certificando de que ninguém estava olhando. Felizmente, todos os olhos estavam presos no quadril em movimentação da garota. Enfiei meus dedos pequenos dentro do bolso do homem robusto, que mantinha seus olhos hipnotizados em Laila, como se ela fosse um pedaço de carne.

Nojento.

Puxei o objeto de couro entre meus dedos com o maior cuidado possível e rapidamente o escondendo atrás de mim. O homem não sentiu o meu ato, e eu agradeci mentalmente, por isso. Se eu fosse pega, as coisas ficariam feias para o meu lado. Me afastei do homem e coloquei a carteira dentro da mochila de tecido que eu carregava nas costas.

Suspirei fundo, e a pendurei de volta nas costas. Varri os olhos pela multidão, em busca da minha próxima vítima.

Quando a música e os movimentos de Laila cessaram, eu havia roubado um total de oito carteiras e um barrinha de cereal. As pessoas aplaudiram a apresentação e Laila coçou o nariz, o que significava que tínhamos que sair dali, antes que dessem falta do que furtamos. E assim fizemos, nós direcionando para o nosso ponto de encontro, em frente a um galpão velho.

— Quantas conseguiu? – Beatrice apareceu ao meu lado. Seus cabelos loiros estavam presos em um rabo de cavalo, assim como os meus.

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