Passei toda a minha vida na ilha de Okinawa, envolta pelas águas que sempre me pareceram uma proteção contra o mundo lá fora. Minha mãe e eu construímos nossa rotina simples, mas sólida. Ela era meu porto seguro. E ele... bem, ele era só uma sombra em nossa história. Meu pai. Ele foi embora quando eu tinha oito anos, depois de uma briga feia com minha mãe. O que eu sabia era que ele era um homem orgulhoso, alguém que vivia para o karatê, mas que nunca soube ser pai. Naquele dia, ele não olhou para trás quando saiu pela porta, e eu jurei que também nunca o procuraria. Cresci sem contato com ele, como se sua existência tivesse sido apagada do mapa. Até que, meses atrás, minha mãe adoeceu. Foi rápido demais para processar, para aceitar. Quando a perdi, fiquei sem chão. Sozinha. Foi então que recebi uma ligação inesperada. Ele. Meu pai. "Jean", ele disse com um tom grave e direto, como se os anos de silêncio fossem nada, "você vem morar comigo nos Estados Unidos. Não tem escolha." Tentei recusar, tentei lutar. Eu queria ficar em Okinawa, onde cada esquina tinha uma memória da minha mãe, onde o mar ainda me fazia companhia. Mas as coisas não são tão simples para uma garota de 17 anos sem família e sem dinheiro. Ele vive numa pequena cidade onde é um sensei conhecido. Ele montou um dojô e construiu uma vida ao redor do karatê. Logo descobri que ele espera que eu participe disso, como se o karatê fosse a ponte que ele pode usar para nos reconectar. O problema é que o karatê não é apenas um esporte ou uma tradição para mim. É um fantasma. Meu pai e eu costumávamos treinar juntos quando eu era pequena. Ele dizia que era nossa herança, que estava em nosso sangue. Mas depois da separação, eu abandonei tudo relacionado a isso. Para mim, o karatê representava a falha dele como pai, e o peso das expectativas que ele sempre carregou em cima de mim. Talvez, no fim, não seja sobre escolher um lugar, mas sobre enfrentar quem eu sou.
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