Um Eterno Talvez

Talles Varx

    O Reino de Hagebak não me rendia os melhores lucros, mas a Georgina era minha maior riqueza. Com certeza, ser um mero comerciante não me fazia a espécie mais honesta, afinal todos lutamos para algum dia ocupar uma cadeira no Castelo.

    Jamais soube o que era amar outra pessoa, meu coração pertencia a minha amada, Georgina. Me dedicava integralmente as vendas e ela a tecer. Toda a renda era fruto de seus lindos e delicados tecidos, invejados até pelas mais experientes tecelãs. Georgina era mais que meu porto seguro nas tempestades de Hagebak, ela era tudo o que tinha. Inclusive meu ganha pão. Às vezes, nem sempre só o amor não é suficiente.

    Como fazia rotineiramente fui almoçar em casa, mas dessa vez não tinha pão na mesa. Assustei. Me deparo com um bilhete fincado com uma faca qualquer sobre a mesa que continha as seguintes palavras:

           

    "Querido! Sinto muito. Essa vida não me pertence, assim como você. A gente era uma mentira descarada. Só você não percebeu. Vou navegar para além dessas águas."

    

    Por que ela não me disse isso? Poderíamos ter revertido essa situação. Nosso amor é ou era a prova disso. A faca estava no bilhete, mas a ferida está aberta em mim, sem curativos. Pego algumas frutas e um par de roupas. Caminhar não é uma opção para quem quer esquecer essa vida medíocre. Corro como se isso custasse a minha existência, logo chego à mata próxima. Até o céu chora comigo. Cai sobre mim, uma leve garoa suficiente pra me sentir em casa. A Natureza me faz bem.

    Realmente Talles Varx. Pensando bem, quem não te deixaria por uma vida melhor? Será que existe um melhor sem mim? Georgina foi apenas um delírio? Que essa tortura não seja real, nosso amor é imortal. Suplico pra que alguém, algo ou algum lugar me dê um amparo. Correndo há algum tempo e sem direção, me deparo com um Castelo Abandonado. Tudo o que eu preciso para passar alguns dias.

    Vejo vultos. Um Ser com uma capa preta, aparentemente pesada, andando com passos freneticamente rápidos. Óbvio que seguirei sem medo de nada e disposto a tudo. O princípio de vulto sobe a escadaria principal, é até uma cena bonita de se ver. Acelero os passos pra não o perder. Adentramos o Castelo, e me impressiono com o estado interno da minha moradia temporária: cuidado, limpo e conservado.

    O ser sobe as escadas que dão acesso a Torre Norte. Cada vez mais tenho certeza de que se trata de um ser carnal. Sofrendo por amor, mas enxergando bem. O ser me viu. Tudo está em risco agora. Vou até o fim. É uma mulher. Pego-a desprevenida, que carrega consigo uma faca. Trago comigo a minha faca também, pronto para luta. Percebo que ela não tem habilidade com armas, logo com um simples golpe, de oponente passo a ser quem dita às regras.

    O Sol ilumina todo o quarto. Claramente, tudo que há nesse local é contra a honra e soberania. Bruxas. Uma realidade tão distante de mim, e agora me deparo com uma. Entretanto, não se trata apenas de uma simples bruxa, o que já seria totalmente inaceitável pela corte, se trata nada mais, nada menos que Nix Beaumont, Princesa do Reino de Hagebak.

      - Com licença, princesa. - Reverencio a digna do poder das trevas. ­- Quem suspeitaria? Logo você. Que decepção...

    Falo observando cada partícula de pó que há no local. Ela não sabe o que me dizer, eu a entendo. Não! Ela nunca esteve sujeita a esmola de vida que você vive. Foca na sua recompensa, dada pela Georgina.

     - Não se preocupe! Seu segredinho está super bem guardado comigo, jovem princesa.

    Falo cada vez intimidando-a mais. Ela sorri sarcasticamente e me olha no fundo dos olhos.

      - Não irá precisar, logo estará aos sete palmos do chão em pleno silêncio.

    Sem paciência pra princesinha mimada do papai, desde o ventre. Que se instale o princípio de guerra nesse castelo.

     - Princesa, me poupe das suas ameaças esfarrapadas. Antes que elas se cumpram, todos saberão da donzela que és. Que a chama do Inferno te console.

   Pego a minha faca e parto para cima da princesa Nix. Miro bem em sua glote. Um único golpe é morte na certa.