1. Uma sugestão

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Tatiana

Se Pamela fosse normal, eu poderia dizer que somos melhores amigas.

Mas que tipo de relacionamento você tem com alguém que rouba tua aliança pra jogar no fundo do Pacífico e te abandona no meio da noite pra ir parar na cama de alguém?

Bem... considerando que nada disso muda o tanto que eu a amo e confio nela... acho que talvez "melhores amigas" seja mesmo a melhor definição.

- Explica pra mim como você pode ser dona da empresa e nunca ter usado o produto? - ela me pergunta. Passa os dedos pelos cabelos loiros ao jogá-los sobre os ombros. Seu sorriso é morno e sensual, assim como seus olhos azuis. Ela parece uma estrela de filmes antigos que desistiu do glamour para abrir uma casa de prostituição. E se analisar a história da sua vida com cuidado vai descobrir que... é quase exatamente isso que aconteceu.

Eu sou o exato oposto: morena de olhos escuros. A imigrante latina que só passa despercebida porque tem uma pronúncia impecável, aprendida depois de anos de esforço metódico. Minhas curvas acentuadas estão sempre bem disfarçadas sob roupas sóbrias e profissionais. Meu cabelo cairia em ondas fartas sobre meus ombros - assim como faz o dela - mas eu normalmente o prefiro preso em um rabo de cavalo longo, apertado e elegante.

- Eu não sou dona do SugarLove.com, meu bem. - lembro, lavando as palavras com mais um gole de vinho - Você é. Eu sou apenas uma das investidoras malucas que viu potencial na sua ideia.

O Bemelman's Bar está apinhado de gente ocupando seus estofados de couro marrom e mesas estreitas de madeira escura. O jazz delicado do piano parece brigar contra o típico zumbido de pessoas demais falando ao mesmo tempo. Um casal se espreme entre duas mesas no bar, em seu caminho para o restaurante, e o espaço que deixaram para trás é rapidamente ocupado por um pequeno grupo de amigos.

É fim do expediente em uma sexta-feira, e o bar na esquina da Avenida Madison com a East 76 oferece happy hour para empresários e turistas, sem distinções.

Pamela sorri ao encarar alguém sobre meu ombro. Sei que ela está flertando porque o modo como coloca as castanhas na língua - uma de cada vez - faz o ato de comer petiscos parecer uma preliminar e eu estou quase perguntando se ela quer um pouco de privacidade.

- Você é dona de 12% do negócio e tem direito de voto. - ela responde como se não estivesse, na verdade, dividindo sua atenção entre eu e... seja lá quem for que ela escolheu para essa noite.

Abro os olhos pra ela com uma risada impaciente:

- Você nunca leu nenhum dos documentos legais da sua empresa, não é? Eu tenho 8% e nunca tive direito a voto!

- Quem tem paciência para documentos legais? - dá de ombros, engolindo mais algumas de suas castanhas eróticas. Assim que sua mão está vazia, ela balança os dedos longos em um "tchauzinho" que mais parece um "olá".

- Você quer que eu te deixe a sós? - dou risada.

- Não, ainda não. - ela pisca um olho - Acho que ele tem um amigo. - alonga-se, verificando alguém a distância.

Mas sua última frase fez meu sorriso desaparecer e ela não demora a notar.

Na verdade, acho que notou minha apreensão antes mesmo de dizer a frase que a causaria.

Melhores amigas.

É por isso que parou de observar seus novos amigos, do outro lado do bar, e me encara como uma águia.

- Tati... - ela começa.

- Pam, não. Tudo bem? Não.

Vejo seus ombros caírem e me preparo para o monólogo.

Ponto Com (Degustacão)Onde histórias criam vida. Descubra agora