2. Um novo caminho

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Ninguém conseguia entender como o jovem João passou de uma depressão para uma energia sem fim de uma hora para a outra. Alguns diziam que era o modo de como ele lidava com a dor, já outros que havia enlouquecido de vez. João não ligava para os boatos, houve vezes em que ele mesmo concordara com as duas versões, mas cada vez que via Maria, tão pura quanto um anjo em sua frente, o rapaz não se importava se eram alucinações ou não, só se fiava às suas visões e isso o fazia muito feliz.

Na escola, ele surpreendentemente subiu suas notas. De certa forma havia certas vantagens em ter um anjo como irmã, literalmente. Há um mês atrás havia saído vagas para o teatro escolar. Maria havia se inscrevido, assim como João, mas o mesmo não estava mais tão animado para entrar.

- Essa é a sua chance - falou Maria enquanto o garoto ainda se arrumava para a escola. - Se eu estivesse viva, ninguém tomaria a minha vaga.

- Mas você não está viva. E eu não posso fazer isso sem você.

- Vou estar com você o tempo todo, enquanto precisar de mim, mas não posso te ajudar se você não deixar.

- Mamãe e papai dizem que estou ficando louco, sabia? - ele optou por desconversar, pois realmente não queria fazer o teste.

- É claro que eu sei - ela riu com gosto. - Até já marcaram uma consulta com o psiquiatra para você.

João parou na mesma hora. Ele não acreditava que seus pais pudessem tomar atitudes tão extremas, não quando ele já conseguia ter sua vida quase normal de novo, embora tivesse apenas algumas semanas que Maria havia sido assassinada.

- Então é isso? Acham mesmo que estou ficando louco?

- Estão preocupados com você. Ficarão mais protetores e isso é normal, João. Eles também perderam uma filha, e embora eu os visite todas as noites, não podem me ver como você. Tente ao menos compreendê-los.

- Posso fazer isso por você, para que sua alma não fique perturbada, mas isso não significa que... - João sentiu um frio na espinha de repente e ao olhar para o lado não viu mais a figura etérea de Maria. - Maria? - sussurrou.

- João? - Sua mãe abriu a porta do quarto. - Está tudo bem, filho?

- Claro, mamãe. Já estou descendo, só um minuto.

- Com quem estava conversando? Ouvi vozes...

- Estava ensaiando para o teste. Desculpe se falei alto demais.

- Filho! - A mãe o abraçou. - Sei que esse momento deve estar sendo muito difícil para você...

A mulher não pôde se conter e chorou abraçada com João. Ele entendia a dor da mãe, mas apesar de sentir a morte da irmã, não compartilhava de sua dor, ao contrário, ele estava feliz. Não tinha como disfarçar sentir algo que ele não sentia. O luto não fazia mais parte da vida dele.

- Mamãe - ele acariciou seus cabelos loiros para acalmá-la. - Mamãe, por favor, não chore mais. Pense que ela agora está em um lugar melhor, olhando por nós e sorrindo a cada ato bom que fazemos.

Maria de fato sorria para o irmão enquanto ele consolava a mãe. O jovem viu quando o ser etéreo-angelical tocou o ombro da mulher, fazendo ela enfim se acalmar.

- Só vou pegar uma coisa e já desço para o café, tudo bem? - João enxugou as lágrimas da mãe e lhe deu um beijo na testa.

Ela assentiu e saiu fechando a porta. O jovem então se sentou na cama e cobriu o rosto com as mãos. Sentiu o lado da cama se afundar e seus ombros serem envolvidos.

- Vai demorar um pouco para eles se adaptarem - Maria falou. - Quando eu subi, tive permissão de falar apenas com um de vocês e debati comigo mesma por dias se escolhia você ou ela.

João e MariaOnde histórias criam vida. Descubra agora