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Os dois haviam decidido morar numa casa de campo afastada do grande centro, isolados de tudo, e todos, em meio a matagais profundos, entre pântanos viscosos, onde a horda de peixes prateados saltitava.

Pietro havia saído de carro levando consigo Salém, um são Bernardo daqueles grandes que, até então, era seu único companheiro.

Suzane se aproximou rapidamente, esbanjando uma aparente felicidade em ver o irmão novamente.

__ Finalmente __ falou, descendo vertiginosamente as escadas do alpendre. __ você chegou. __

Seus longos cabelos negros e reluzentes, caíram sobre seus seios, naquele momento.

__ Foi meio difícil andar na estrada, né Salém? __ afirmou, o irmão, alisando os pelos fartos do animal ao seu lado.

__ Tive medo que algo acontecesse com você. __

__ Não precisa se preocupar atoa, graças á deus, estou aqui são, e salvo. __

Suzane deu um leve sorriso, uma vez que não havia de sentir assim tanto receio por Pietro que se mantinha sempre lúcido e sóbrio ao volante, todavia, ela sabia que irmãos possuem de fato laços fortes, um com o outro, e isto era inegável.

Enquanto escritor, ele escrevia livros violentos de brutalidade gráfica explícita, mas isso não impedia Suzane de lê-los, ainda mais com uma biblioteca na nova casa a sua disposição.

Pietro pressentiu uma sensação estranha pouco antes de sua chegada na residência em questão, mas logo tomou para si como apenas uma ideia vaga e desconexa.

Sua preocupação fora sempre com ela, com relação ao relacionamento conturbado, que poderia ter um fim trágico se não fosse por ele, e pelo acontecido meses atrás.

__ Que cachorro fofo. __ disse, Suzane, com o são Bernardo a abraçando, desferindo-lhe lambidas no rosto.

__ Acho melhor entrarmos Suzane, já está de noite e tem muitos mosquitos zombeteiros por aqui. __

__ Pelo menos deixe-me colocar Salém na coleira. __

__ Está bem. __

O são Bernardo pulava de felicidade, queria que Suzane fizesse carinho, alisando seus pelos tão macios como seda.

Ela achava que o adorável animal devia de ficar dentro de casa, devido ao frio congelante da noite.

A casa era deslumbrante, mas somente a visão dos pântanos e matagais fora detestável.

O som dos grilos, das águas em ondas, serão os únicos ouvintes, até o momento sereno, e tranquilo de paz e silêncio absoluto.

De repente um vento frio veio à tona naquele momento oportuno, quando Suzane, girou lentamente a maçaneta da porta de entrada, abrindo apenas uma fresta, sentindo aquela sensação hedionda de antes.

Ela moveu o olhar para trás bem lentamente, temendo algo que lhe fosse de forma abominável e assustadora, porém havia apenas o cachorro a latir incessantemente, num tom agressivo e hostil, para a escuridão vacilante que se mantia ali, atrás daquelas árvores oscilantes que balançavam seus troncos e seus galhos terrivelmente.

Dizem que cachorros possuem uma espécie de mal presságio, entende? como se conseguissem, de alguma forma, sentir algo ou ver algo que pessoas normais não conseguem ver.

Mas ela não via nada, apenas sombras formando-se figuras inumanas sobre aquele solo decrépito e uma vegetação densa á cercar todo o local

Suzane, logo em seguida, abriu a porta rapidamente dizendo, quase sussurrando:

__ Apenas um vento frio, só um vento frio. __ e depois entrou, pondo-se para dentro.

Seu irmão estava na sala, colocando as coisas em seus devidos lugares, enquanto ela subia a escada, até o segundo andar.

O interior do pequeno aposento central era substancialmente agradável e aconchegante.

Alguns quadros acadêmicos e pinturas conceituais presos á parede, junto a um pôster emoldurado do filme Babadook.

Alguns jarros e vasos ordinários de plantas, flores secas e pétalas murchas.

Recostado em uma parede havia um sofá vermelho vinho de tecido fofo, forrado por um estofo fino e delicado de algodão.

Ao lado uma estante repleta de livros fartos e encadernados, os livros de Pietro ocupavam um papel de destaque na prateleira mais alta, com seus títulos em evidência:

"Um romance sem lágrimas"

"Antes de lhes fecharem os olhos."

"A máscara da maldade"

__ Precisa de ajuda? __ perguntou ele.

__ Não, obrigada, vou pro meu quarto descansar um pouco. __ disse, cansada pelo dia exaustivo pela manhã, com o olhar avulso e desorientado.

Foi um tanto quanto difícil para Suzane nos últimos dias, não só devido à volta inesperada e repentina de sua paralisia do sono, mas também ao fato de ter que encarar a notícia que recebera há um mês atrás.

Quando as duas da manhã o telefone tocou na mesinha, ao lado de sua cama, que no exato momento atendeu atônita com a notícia do falecimento do ex-marido.

Segundo o policial que havia ligado, houve um trágico acidente ocorrido numa estrada onde um carro, em alta velocidade, havia de perder o controle e consequentemente caindo numa ribanceira próxima.

Eles encontraram e identificaram o corpo daquele homem, e por meio disto, eles haviam de informar algum parente acerca do tal acontecido, ou da família, entretanto, este não possuía sequer um membro da família vivo, então tiveram de recorrer á ela, já que fora uma das poucas pessoas próximas que mantivera certo contato com seu ex.

Aquilo lhe fora o estopim, visto que trazia as tais lembranças indigestas, difíceis de se aceitar, pois dez anos presa num relacionamento tóxico e abusivo era, para Suzane, inconcebível.

As pessoas acham que essas coisas só acontecem somente com outras pessoas, até acontecerem com elas.

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