Capítulo 3 - A Força do Amor

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Depois de viver tanto tempo sem casa ou um local fixo para dormir, encontrei Destinados Moto Clube. Dai e Jhenny tinham idades próximas a minha, mas as via como mães. Elas me acolheram, me deram um lar e então, uma família.

Era uma atleta que viva de favores. Meus pais estavam perdidos no mundo e meus irmãos foram acolhidos pelo conselho tutelar. Como era esperta, ficava mais na academia de artes marciais que em casa, então, consegui sobreviver sozinha.

Meu Sensei era o meu verdadeiro pai. João Paulo sabia das minhas condições, mas desde sempre expos que não poderia fazer nada além do que eu buscasse. Ele queria me dar uma lição, estender a mão, mas me fazer merecer por ela.

Às vezes eu dormia no tatame, outras vezes ganhava alguns trocados ajudando a limpar o local. Não há vitória sem luta, nem valorização sem sofrimento, essas eram suas palavras de ensinamento toda vez que eu fraquejava ou chorava no final das aulas, sozinha, no vestiário.

Alguns poderiam dizer que Sensei João Paulo era muito duro, porém, uma semana atrás, quando ele morreu em um tiroteio, descobri que tudo o que ele fez foi para o meu bem. Seu filho teve tudo do bom e do melhor, nunca valorizou e se envolveu com drogas, causando a morte do seu próprio progenitor.

Por sorte, foi nesse mesmo dia que conheci Dai em um supermercado. Ela me ajudou a completar os cinco reais para comprar pão e margarina para minha refeição da semana.

Conversamos, ela me levou para sua casa e agora, era minha também. Fui instruída a trabalhar no bar como estoquista e às vezes, segurança. Não havia concluído o ensino médio e por isso, estudava de manhã, tendo a tarde livre para executar o que mais amava, artes marciais.

Enquanto não achavam alguém ideal para substituir Sensei João Paulo, os alunos faixa preta se revessavam nas aulas e exercícios. Era faixa marrom, por não ter condições de pagar a prova de proficiência para a faixa preta, mas todos sabiam do meu potencial e nível de aprendizado.

Hoje, como sempre, sou uma das primeiras a chegar a aula depois do almoço. Conhecendo o local, pego um rodo, pano de chão e limpo o tatame. Com apenas a calça do kimono e um sutiã esportivo e cobria tudo o que precisava, escuto um pigarro atrás de mim e assusto, abraçando o cabo do rodo.

Era um homem de feições duras e jovem. Seu corpo era musculoso e sua roupa esportiva. Nunca o vi por aqui, então, seguro firme no cabo em minhas mãos, com medo de ser alguém do lado ruim da cidade.

— Você deve ser Liziane — afirmou com indiferença.

— Todos me chamam de Liz. Sou eu. Quem é você?

— Sou Pedro, irmão mais novo do Sensei João Paulo. Eu... — ele falhou miseravelmente em esconder a emoção na voz ao falar do Sensei falecido. — Vim assumir seu posto e concluir seu trabalho.

Respiro fundo e observo suas características físicas. Ele não tinha nada semelhante ao irmão, começando pela cor da pele. Onde João Paulo era moreno, quase negro, Pedro era bronzeado, tendendo ao branco.

— Ele nunca falou que tinha um irmão... — Recolhi o balde, o pano e o rodo. Segui em sua direção, desconfiada.

— Ele nunca me falou que tinha um filho envolvido com o tráfico de drogas, então, estamos quites. — O rancor em sua voz era visível e senti uma vontade descontrolada de defender o único homem que me apoiou em todos esses anos. — Vá vestir seu kimono, esse não é o tipo de vestimenta para ficar sobre o tatame.

Ele virou as costas para mim e seguiu para a sala de administração do local. Olhei para a porta e precisei me controlar. Quem ele pensava que era? Estava vestida assim, porque sabia que estaria sozinha pelos próximos trinta minutos. Respeito era o valor que eu mais prezava dentro desse local.

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