Capítulo 03 - Amizade colorida (?)

62 9 109
                                    

Corpo a corpo. Mente em chamas. Coração vazio.

Sob o peito de Jhonas, encarando o espelho grande no teto, esparramada em uma cama de motel, Aimê respirava pesado, os olhos abrindo e fechando em um ritmo indeciso. O vazio do quarto à meia luz e o zumbir do ar condicionado quebrando o silêncio. Tudo ali representava o carnal. E era exatamente o que ela queria.

Quando estava com Jhonas, Aimê não precisava pensar. Poderia ser imprudente, agir como uma jovem imatura e sem limites, falar abertamente sobre bebidas baratas e drogas das quais deveria manter distância. Reclamar dos homens, desabafar sobre a mãe ou sobre sua vida em Belo Jardim. Poderia falar palavrão, comer igual uma maluca ou gritar sem aviso prévio. Eles eram assim: Livres. Sem explicação ou pisadas leves em pisos frágeis.

Jhonas não fazia perguntas difíceis e isso era o que Aimê mais gostava. Não se preocupava com horários ou com a falta de dinheiro, nem com alguém o esperando em casa. Detestava compromissos marcados para duas, três semanas. Com ele era para já, não programado, de repente. E ela adorava isso. Aimê não precisava se preocupar com roupas limpas, cabelo lavado ou maquiagem pesada para impressionar. Não precisava de nada, só estar ali.

- Sabia que eu adoro quando você volta para casa? - Disse ele, os braços abertos no colchão, exagerado. O olhar distante, mirando o teto ou a escuridão à sua frente. Parecia leve.

- Nova Alvorada não é a minha casa.

- Ah, você sabe o que eu quis dizer. - Ele se virou de repente, disposto a argumentar. Adorava uma boa conversa. Apoiou a cabeça sob a mão esquerda e a tocou no nariz. Aimê odiava toques desavisados - Quando você vem para cá.

- Eu entendo! - Ela desconversou, o encarando.

- Eu gosto quando a gente sai, fica andando de moto ou falando besteira.

- Eu também gosto! - Aimê suspirou, virando-se para encarar o teto - Eu acho que você é uma das poucas coisas que eu gosto em Nova Alvorada, que me fazem bem aqui.

- Você odeia tanto assim essa cidade?

- Não, é só que eu... - Bufou - Não sei! Não me imagino aqui. Tudo sobre Nova Alvorada me cansa, me tira a paciência, me deixa mal. Não gosto de quem eu sou quando estou aqui.

Aimê não costumava medir as palavras quando estava com o rapaz, mas aquele era um assunto delicado, até mesmo para Jhonas, que amava a vida ali. Ela sabia que ele adorava a cidade, seu emprego na câmara dos vereadores e as visitas aos fins de semana à casa dos pais. Acontece que toda a sua vida fora construída ali, nos limites daquela cidadezinha. Ele não conhecia outra realidade ou conhecia pouco a respeito. Não vislumbrava uma vida maior, com grandes aspirações. Aquilo era tudo o que ele tinha.

E Aimê respeitava, pois sabia que o mundo não girava ao redor de seu umbigo. Entendia os fatos e procurava não discutir, pois o que sentia em relação a cidade era pura opinião, não raiva. Não era sua função convencer ninguém de nada.

- Você deveria dar uma chance. - Rebateu ele, simpático - Eu poderia te ajudar a conseguir um emprego. Quem sabe, ganhando dinheiro, você não comece a enxergar prazer nessa vida "água com açúcar", como você chama.

- Não! Eu não quero nada aqui. - Ela se afastou, sentando de repente e buscando um lençol para cobrir o tronco desnudo - E eu não te contei que perdi o emprego para você ficar tentando me arranjar trabalho.

- Calma! - Ele a puxou de volta para o colchão - Foi só uma opção.

- Eu já estou resolvendo a minha vida, as coisas vão acontecer. - Aimê já estava emburrada. Falar sobre trabalho era um assunto que lhe tirava a paz.

SAGITARIANA - NUNCA FOI SOBRE AMOROnde histórias criam vida. Descubra agora