Capítulo 1 - Eva

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Assim que o alarme do celular tocou, abri os olhos. Meio sem querer, esfregando o rosto e encarando o teto de sarrafos pintados de branco da pousada em que estava.

Tinha me hospedado lá desde o início da obra de restauro do casarão.

Eu gostava de casas antigas desde criança. Nas férias, quando visitávamos meus avós na fazenda, eu me lembro de pegar uma pilha de gibis e me enfiar no sótão, no meio das tranqueiras antigas para ler. O cheiro de madeira do assoalho, misturado ao ar frio e úmido do alicerce de pedras, guardavam minhas melhores memórias.

Você nasceu para ser arquiteta, Evita... Precisa aproveitar o seu dom! — vovô dizia, quando nos sentávamos na grande varanda da frente, para ver a noite cair.

Fora por causa dele que escolhi a Espanha para estudar, já que ele havia nascido lá e vindo para o Brasil ainda menino. Meu avô tinha sido o único a acreditar em mim e nos meus sonhos e eu sentia muito por não o ter mais comigo.

Eu andava saudosa demais nos últimos dias e sabia bem o porquê — aniversário! Eu odiava fazer aniversário. Na grande lista de coisas que eu odiava na vida, aniversário ocupava o topo da lista, logo abaixo de reuniões.

Se você quiser uma inimiga para o resto da vida, me chame para uma reunião, no dia da porra do meu aniversário. E era exatamente isso que o dia guardava para mim.

Inspirei o ar até encher os pulmões e então expirei de uma vez. Levantando o corpo o suficiente para ficar sentada.

Na tela do meu celular, mensagens de texto da minha mãe e três ligações perdidas.

Encarei o horário na tela por um segundo. Era pouco mais de seis da manhã.

Seis da manhã! E ela já tinha me ligado três vezes. Era uma pequena mostra do que me aguardava em casa, quando eu chegasse para o fim de semana.

— Oi mamãe! — falei assim que ela atendeu.

— Eva, por que você não atende o telefone? Eu liguei várias vezes!

— Eu vi, mãe... — reprimi o riso. — Assim que abri os olhos.

— Bem, eu só queria te dar os parabéns, querida e saber que horas você chega amanhã...

— Meu voo sai as duas da tarde. Devo chegar em casa perto das quatro.

— Vou pedir ao Jefferson que a busque no aeroporto.

— Eu pego um taxi, mãe. Não precisa se preocupar.

— Eva, taxis de aeroporto são um perigo! Você deveria saber!

Dessa vez, não pude segurar o riso.

— Mãe, eu moro em São Paulo se lembra?

— Ok, Srta. Sabe tudo! Esqueci que estava falando com você!

Respirei fundo.

— Ok, mãezinha... Peça ao Jefferson... — sorri, admitindo a derrota.

— Bem melhor assim... Espero você amanhã, querida. Vamos fazer um jantar de aniversário, mesmo atrasado.

Deixei a cama e tirei a camiseta velha de banda de rock sobre o colchão surrado. Minhas costas doíam como o inferno, mas eu não podia reclamar, ao menos tinha conseguido vencer a licitação para restaurar o antigo casarão do imperador.

Meu Acaso PerfeitoOnde histórias criam vida. Descubra agora