Lucy finalmente despertou, abrindo os olhos devagar. Por um breve momento, achou que tudo não passava de um pesadelo.
— Ah, finalmente acordou, né, mocinha! — disse a enfermeira, sorrindo. — Como se sente?
Lucy levou a mão à cabeça e sentiu uma faixa. A realidade caiu sobre ela como um peso esmagador, e as lágrimas começaram a rolar pelo seu rosto.
— Tá sentindo dor? Mocinha...? Tudo bem... Vou ali e já volto.
A enfermeira hesitou ao não receber resposta e saiu, deixando-a sozinha.
Lucy olhou para o lado e viu um lenço com seu nome. Algo nela reconhecia aquele objeto. Ao pegá-lo, uma foto caiu sem que ela notasse. Com força, Lucy se agarrou ao tecido, acreditando que fazia parte do presente de aniversário que seu pai estava preparando.
A enfermeira retornou com uma médica.
— Oi! Como você está? — perguntou a doutora, observando as lágrimas ainda correndo pelo rosto da menina.
— Viu? Eu disse que ela não quer falar nada... Talvez aquele homem esteja certo... — murmurou a enfermeira.
Ao notar a foto caída no chão, ela a pegou e a colocou ao lado de Lucy. Antes que pudessem continuar a conversa, um médico apareceu na porta.
— Com licença, precisamos de vocês duas agora.
A médica assentiu.
— Mocinha, fique aqui, tá bem? Logo voltamos.
Elas saíram, e o silêncio tomou conta do quarto. Lucy respirou fundo e olhou ao redor. Seu peito apertava com o ambiente frio e impessoal.Hospitais sempre foram lugares assustadores para ela.
Determinada, Lucy se levantou, pegou o lenço e a foto e caminhou até a porta.Espiou o corredor.
Estava vazio.
Com passos cautelosos, saiu do quarto. Enquanto caminhava, viu médicos e enfermeiros correndo em direção a uma sala, claramente lidando com uma emergência.Seu coração acelerou. Sabia que aquele caos era sua melhor chance de escapar.
Ela se movia rápido, mas evitava correr abertamente.
Quando ouvia passos, se escondia atrás de macas e carrinhos de suprimentos.
O medo fazia sua respiração pesar, mas ela continuou, seguindo instintivamente o caminho para a saída.
Após atravessar dois corredores, avistou as portas de vidro da recepção.O local estava movimentado, pacientes discutiam com atendentes, e um segurança tentava acalmar alguém exaltado. Ninguém parecia prestar atenção nela.
Lucy aproveitou a confusão e caminhou o mais naturalmente possível até a porta. Seus pés tocaram a calçada, e um arrepio percorreu seu corpo. Estava livre.
Sem rumo, seguiu andando pela rua, seus passos trôpegos denunciando o cansaço. Seu aniversário, que deveria ser um dia feliz, se tornara um pesadelo.
Foi então que uma jovem a notou.
— Oi, mocinha! Tá perdida?
Lucy ergueu o olhar. A moça, de expressão gentil, logo percebeu o estado da menina, a faixa na cabeça, os olhos vermelhos de chorar, a roupa suja.
— O que aconteceu?
Sem obter resposta, a jovem se ajoelhou e tocou a testa de Lucy com carinho.
— Já passou, tá? Você vai ficar bem.
O calor daquele gesto fez algo dentro de Lucy se romper. Sem pensar, ela se jogou nos braços da moça, buscando o conforto que tanto precisava.
A jovem sentiu o aperto desesperado da menina. Seu coração apertou.
— Mocinha, você sabe onde estava antes de vir pra cá?
Lucy afastou-se um pouco e assentiu.
— Certo. Vamos lá, então? Ah, sim, qual o seu nome?
Lucy pegou o lenço e o mostrou.
— "Lucy"? Que nome lindo! Eu me chamo Anna, muito prazer!
Segurando a mão de Anna, Lucy começou a guiá-la de volta ao hospital.
Quando chegaram, Lucy se escondeu atrás de Anna, segurando firme em sua mão. Antes mesmo de falarem com a recepcionista, a enfermeira de antes passou apressada e arregalou os olhos ao vê-la.
— Meu Deus! Finalmente te encontrei, mocinha! Não faça mais isso!
Ela se aproximou rapidamente, mas Anna, protetora, se colocou na frente.
— A senhorita conhece ela?
— Sim! Eu estava cuidando dela, mas... ela desapareceu quando fui chamada.
— Como assim?! Você deixou uma criança sozinha e simplesmente a perdeu?!
A enfermeira baixou a cabeça, envergonhada.
— Eu sei... Fui descuidada, mas por favor, não fale isso alto... Eu não achei que ela fosse fugir assim...
Anna suspirou. Apesar da bronca, percebeu o nervosismo sincero da enfermeira.
— Tudo bem... Mas tome mais cuidado. Isso poderia ter sido muito pior.
— Eu sei... Me desculpe. E obrigada por trazê-la de volta.
Anna olhou para Lucy.
— Agora, pode me dizer o que aconteceu com essa menina? Ela está ferida, assustada e não diz nada...
A enfermeira hesitou.
— Eu... não deveria contar. Mas... já que você a trouxe de volta e foi compreensiva... Venha comigo.
Enquanto caminhavam para uma sala mais reservada, Lucy fez um gesto, apontando para o banheiro.
— Você quer ir ao banheiro? — perguntou Anna.
Lucy assentiu.
— Você precisa de ajuda?
Lucy balançou a cabeça, negando.
— Tem certeza?
Ela confirmou com um olhar insistente.
— Tá bom. Eu estarei ali perto, qualquer coisa, me chama, ok?
Lucy apenas entrou no banheiro.
Na sala ao lado, a enfermeira começou a explicar.
— Ela chegou aqui ontem, desmaiada. Um homem a trouxe, usando um boné preto e uma camisa vermelha.
— Quem era ele?
— Não disse. Parecia com pressa. Só contou que a encontrou numa casa pegando fogo...
— Em chamas?!
— Sim... Ele disse que estava passando perto de um bosque quando viu o incêndio. Quando chegou lá, encontrou Lucy deitada sobre um homem...
— Meu Deus...
— Ele pegou a menina e trouxe para cá, mas...
— Mas...?
— Acho que era o pai dela. Ele já estava morto.
Anna sentiu um nó na garganta.
— Ele morreu no incêndio...?
— Não. O homem disse que viu feridas de bala. Ele foi assassinado.
O impacto da revelação deixou Anna sem palavras.
— Meu Deus... Ela... Ela viu tudo?
— Provavelmente. A falta de resposta dela pode ser um trauma.
— Aqui, ela também não disse nada?
— Nada.
Nesse momento, Lucy voltou do banheiro. Anna a olhou com outros olhos agora. Sem hesitar, abaixou-se e a envolveu em um abraço.
— Vai ficar tudo bem...
Depois de um tempo, Anna suspirou e se levantou.
— Eu preciso ir agora, mocinha... Mas você vai ficar bem aqui, tá?
Lucy se agarrou a Anna com força e a encarou nos olhos. Anna sentiu a súplica silenciosa.
— Vamos, mocinha? A moça precisa ir agora — disse a enfermeira, tentando afastá-la.
Mas Lucy não soltava. E, de repente, Anna sentiu as palavras saírem sozinhas de sua boca:
— Ela vai comigo.
A enfermeira arregalou os olhos.
— O quê?!
Lucy também a olhou, surpresa.
— A senhora é responsável por ela...?
Anna hesitou por um segundo.
— ...Sim...
— Desculpe, mas não posso permitir.
— Pode sim! Assim você não terá problemas no seu trabalho...
A enfermeira ficou sem reação.
Anna ergueu Lucy nos braços e sentiu o coraçãozinho dela batendo mais devagar, mais tranquilo.
Ela sorriu.
— Vamos, Lucy.
E então, elas partiram juntas.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Lucy (2021)
Misteri / ThrillerLucy... Uma jovem criança com um simples objetivo: viver sua vida em paz e tranquilidade. Porém, após tantos acontecimentos, sua vida, que era parcialmente calma e pacífica, volta a se tornar uma bagunça - assim como foi em sua infância - logo após...