Passados meses na nova casa que nos fora conferida por primos próximos do meu pai , começávamos a voltar à normalidade . Contudo a normalidade também tinha o seu custo e a minha mãe acordava cedo para preparar bolos , esses bolos seriam depois vendidos na cidade já que vivíamos uma vez mais numa parte mais afastada . Porém a parte mais afastada parecia ser a mais bela de todas , por esta ser repletas de flores e arvores dava-lhe um ambiente modesto e belo , sem grande mão do homem , parecia intocável . Por vezes passava o pequeno-almoço a observar a sua pureza e como esta parecia não ter fim .
Passava muito tempo também a desenhar plantas , desenvolvi um amor pela natureza imenso . Era por isso que comecei eu a tratar do jardim da casa , deixando tudo perfumado .
A casa onde agora vivíamos era muito mais espaçosa , livre . Muitos dos quartos não tinham por vezes algumas mobílias então começava a pensar como estas seriam e depois contava à minha mãe e perguntava a sua opinião . Ela sempre olhava-me radiante pois conseguia expandir as minhas ideias de uma adequada e sucinta mesmo para os meus treze anos de idade , isso deixava-a muito feliz .
Era então assim a minha vidinha , que também era preenchida por estudos . Havia que estudar profundamente a geografia assim como a história do meu país , Portugal . Era uma obrigação , já que por mais que deixasse o meu país ainda estava numa parte dele , ou pelo menos era isso que se era considerado . As nossas antigas colônias eram consideradas parte do país mas noutro continente . Neste caso o continente africano , e que belo e cheio de cultura ele é e por vezes é esquecido .
Vivíamos no norte de Moçambique e passámos a falar a língua nativa desses povos , o macua . Tivemos por vezes histórias muito engraçadas devido a esta nova língua nas nossas vidas com o passar do tempo , adorava poder aprender novos idiomas mas era muito difícil .
Ao acabar os meus estudos tentei sempre ajudar a família , porém não havia concorrido para uma universidade e é claro que os meus estudos não eram de um grau tão elevado . Continuava a viver no meio das arvores por vezes a contemplar o céu quando deitada na erva fresca . Contava as estrelas e estas pareciam ter diversas formas .
A minha família e eu começámos a trabalhar num campo próximo , esse espaço pertencia a uma família estrangeira , alemã . Não foi necessário aprender alemão para comunicar com eles , estava tudo nos seus conformes e também fazíamos aquilo que nos pediam nos seus respetivos prazos de tempo .
Um dia estava a observar o espaço de trabalho e parecia estar a ser observada todo o tempo toda a hora , olhava para todos os lados e ninguém parecia estar por perto , mesmo assim e com isso em mente a minha cabeça cismava que alguém me observava . Retomava ao trabalho quando essa sensação , curta mas dura , passava .
À medida que o tempo foi passando essas sensações deixaram-me e eu passei a ter estranhos sonhos , que por si só não retratavam imagens sangrentas . Eram sonhos cheios de flores e perfumes . A única coisa que fazia deles diferente era a mesma presença que tinha no campo . A mesma presença no campo veio ter nos meus sonhos , talvez fosse só imaginação da minha cabeça e tentei apagar a cisma . Ao apagar , ignorava , e o " fantasma " frequentador do sonho desaparecia . Ia para a cama de rastos com os pés a rastejarem por vezes , andava cansada com o trabalho mas era muito persistente . As costas doíam bastante e parecia que herdara o problema familiar de lidar com tais dores .
Um dia estava na sombra de inúmeras arvores até reconhecer um vulto no fim do percurso até casa , tinha acabado de trabalhar . Achei estranho a existência daquela silhueta porém não fiz caso e continuei a marcha em frente , tinha que chegar em casa para ajudar a minha mãe com as coisas da casa . Ela devia estar-se a sentir sozinha também . Continuei e continuei a andar aquele longo caminho que dava continuidade em um pequeno trilho , era a única maneira mais rápida de chegar a casa . Ao aproximar-me mais da sombra que desde cedo desconfiara notei que afinal não era um individuo mas sim uma pequena arvore a ser coberta por um pano de escuridão pertencente a outras superiores a ela , ela era a esquecida no meio delas . Um desconforto tomou-me , e o coração acelerou nervosamente .
Ao terminar a rota dei de caras , finalmente , com a minha casa , o meu espaço de conforto . Pude finalmente ajuizar a cabeça e bati na porta para receber a minha mãe com um sorriso caloroso e reconfortante . Esta a olhar para mim pareceu notar algo estranho :
- Ângela , conheço-te desde pequena . Algo de errado ? Pareces estar atormentada ... - disse ela olhando no meu rosto enquanto o acariciava .
- Nada mãe , é só que ... tenho imaginado muitas coisas e não consigo livrar-me delas ... - disse fitando a porta de madeira atrás de nós .
- Querida , e o que te poem ansiosa ? - perguntou olhando nos olhos como uma sábia .
- Bem ... Uma estranha presença que me persegue por todo o lado . - respondi fazendo uma troca de olhares - Não sei se é real ou sonho ...
Suspirei .
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Desalmadamente , Ângela
RomansaA história de simples humanos procurando o seu rumo desfrutando da companhia dos dois . Será uma longa história marcada pelas suas decisões . "o mar fez de nós meros mortais que andam pelos seus perigos fatais se alguém soubesse a tremenda dor ...