A culpa e eu

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— Philipe — Paola chama em voz alta, sei que ela está correndo para me alcançar. Mas é a primeira vez em muito tempo que o que eu mais quero, é distância dela.

É lógico, esse é o motivo por ela me odiar tanto, por repugnar as minhas presença nos primeiros dias, por dizer que não poderíamos estar junto e por ter sido uma completa idiota hoje. Ela sempre soube, todos eles sabiam, então por que eu estou aqui? Por que estou hospedado no quarto do filho que eu matei? Como eles conseguem ser tão frios para me acolher? 
Alguma coisa está errada, a conta não está batendo. Estou me sentindo manipulado, como se fosse um fantoche. E eu não sou um fantoche, eu não quero que ninguém tenha controle sobre mim. 

Eu não deveria ter aceitado esse convite.
Por isso eles me chamaram na rodoviária.
Porra, alguma coisa está errada.


— Você sabia Paola ? — Levantei e não me importei de mostrar as lágrimas que se espalhavam pelo meu rosto. Estou completamente fodido de raiva.

Seus passos pararam, um pouco distante. Suspira e guarda as mãos nos bolsos do seu jeans. 
Não precisava responder, mas eu quero arrancar isso dela. Quero ouvir, e quero que entre como navalhas pelo meu ouvido, quero que ela fale.

— Me fala — Insisti, nervoso — Vocês sabiam?

— Sim — Falou tão baixo, que se não fosse pelos movimentos dos lábios, não entenderia.

— Qual é a merda do problema de vocês?— Explodi, abro os braços irritado. 

Levei as duas mãos na cabeça, e sentia meus olhos arderem, mais lágrimas rasgavam o meu rosto, como se fosse puro ácido. Ando de um lado e para o outro, as minhas narinas dilatadas já são o suficiente para perceber que eu estou a beira de um ataque de nervos. Eu já não sabia mais o que fazer, nem como agir diante da situação. Tudo que eu queria, era que a merda desse acidente nunca tivesse acontecido. Queria voltar no tempo, e merda, eu queria a porra da minha vida antes daquela merda de acidente.

— Nós íamos te contar — Se aproximou.

— Fica longe de mim — Apontei o dedo, furioso. Meu dedo trêmulo continuava levantado. — Não chega mais um centímetro perto, quero distância de tudo isso. Vocês me enganaram, fizeram eu...eu..

— Você o que Philipe ? — Afrontou — Ter uma família, ter momentos felizes? Fizemos você sentir que era amado?

— Sim — Gritei mais uma vez — O que eu fiz a vocês?— Dei passos longos até ela, fazendo-a se assustar — Diga! Fala em voz alta o que eu fiz a sua família. Me fala o que eu fiz! — Segurei em seu braço brutalmente.

— Me solta — Falou lentamente, testando minha paciência —Nós o perdoamos. Então, por que está tão preocupado com tudo isso ? — Começou a chorar.

— Perdoou? — A soltei, dando distância, estava a ponto de cometer um ato covarde —Diga!

— Não.

— Responde garota, o que eu fiz? — Aproximo de forma agressiva e ela recua.

— Eu já disse não!

— Você não consegue. — Falei sério.

— Não seja cruel com você mesmo.

— Eu matei o teu irmão. — Digo pausadamente, olhando nos fundos dos seus olhos lacrimejados.

— Para! — Pede.

— Eu matei o seu irmão. — Repito com ódio. Ódio por eu ter causado dor a eles.

— Para, Philipe — Súplica e fecha os olhos. 

— Então fala! Você é uma covarde. Fala! Não tem coragem de dizer o que eu fiz? Ora, o que o seu irmão significava pra você afinal?

— Você o matou — Abriu os olhos, e ao invés de tristeza, eu vi a raiva — Você tirou de nós a parte mais importante. Você amassou os nossos corações. Você matou um homem incrível com um futuro pela frente. Você é um assassino, Philipe.

Sim, eu sou. E mesmo que penso isso, não digo em voz alta. 
Não tenho coragem de assumir o que eu fiz, afinal, eu conheci a família da vítima e sei tudo o que eles passaram. Como conseguiria superar isso?
Preciso sair daqui, dessa escola, dessa cidade. Preciso ir o mais longe deles possível, mas antes o Roberto vai me explicar tudo o que está acontecendo. 

— Vamos, tenho que pegar minhas coisas e se mandar daqui. — Estico a mão — Me da a chave.

— Por que vai embora, Philipe? — Recua — Não, eu não vou te dar a chave.

— Foda-se o que vou fazer da minha vida Paola — Puxo os meus cabelos, quero arranca-los com as minhas mãos — Você não tem nada com isso, cuida da sua vida. Não me importa o que você pensa, não me importa nada que venha de você. Apenas, cale essa maldita boca e da a porra da chave do carro.

Sem dizer mais nada, ela estende a mão com a chave.
Eu a magoei. Profundamente.

Philipe FerreiraOnde histórias criam vida. Descubra agora