2. Desabafo

421 66 6
                                    

1.102 palavras

Alvo estava saindo do treino suado e cansado. Havia se empenhado em seu máximo, forçado seu corpo à exaustão com o único objetivo de ignorar completamente todos os seus pensamentos. Ele não conseguia compreender o que se passava na mente de Scorpius e muitas coisas pareciam estar em jogo no momento.

Depois de decidir que jamais confessaria sua paixão pelo melhor amigo, ele imaginava que não haveria problema nenhum entre os dois. No entanto, agora ele sofria duplamente: tanto pelo fato de estar sendo ignorado quanto pelo fato de saber que Scorpius estava apaixonado por alguém que não era e nunca seria ele.

O garoto umedeceu os lábios e fitou o vazio. O coração estava apertado, aflito. Predominava em si um sentimento de rejeição, de incapacidade. Ele achava que a amizade deles era profunda e inabalável. Já tinha perdido as contas de quantos segredos contara a Scorpius, quanto o garoto — e apenas ele — sabia sobre si. E aparentemente não era uma amizade de confidências em mão dupla, visto que num momento tão importante quanto estar apaixonado, Scorpius não tinha confiado nele para tal confidência.

Depois do suspiro longo enquanto se dirigia às masmorras, ele sentiu raiva. Se dependesse dele, Scorpius seria ignorado para sempre. 

Só que não. 

Ele riu sozinho. Nunca conseguiria tratar Scorpius mal ou ignorá-lo, ainda mais depois de ter visto como ele tinha chorado em seu colo. O menino parecia completamente perdido. Agora a raiva dava lugar à pena. No fim das contas, ele só queria voltar a ver aquele sorriso que tinha o poder de melhorar seu dia. Aquele sorriso que deixava covinhas no seu rosto. Aquele sorriso que era tão largo que não se contentava em usar só os lábios, então fazia questão de também sorrir com os olhos.

— Al?

A voz de sua prima interrompeu seus pensamentos.

— Tá rindo sozinho, é? — Rose perguntou, se aproximando.

— Eu tô. Rindo da minha desgraça, pra não chorar. — Alvo bagunçou o cabelo ruivo da prima, num gesto de carinho. Ao contemplar a cara de espanto curioso dela, ele prosseguiu. — Foi bom mesmo você aparecer. Eu tô precisando da minha super conselheira. Scorpius tá me ignorando e eu não aguento mais.

Rose, além de Scorpius, era a pessoa que Alvo mais confiava em todo o mundo. Topar com ela no caminho era realmente tudo o que precisava. Sem dizer nada, ela segurou em sua mão, entrelaçando seus dedos e começou a andar. Ele já sabia para onde iriam, porque era lá que eles — e isso incluía Scorpius também — sempre iam quando queriam um pouco de paz e privacidade.

A torre de Astronomia.

No fim das contas, ter parentesco com Harry Potter, Rony Weasley e Hermione Granger os dava certo grau de privilégios. Isso incluía amizade com professores e livre acesso à sala que era utilizada apenas nas aulas noturnas.

Minutos depois, Alvo estava abrindo o seu coração, enquanto Rose observava com atenção. A garota tinha fama de ser falante, mas Alvo conhecia uma característica exposta para poucos: a capacidade de ouvir com empatia e dar apoio emocional.

Com Rose — e com Scorpius — falar era fácil. Desabafar era fácil. Então ele começou a dizer o quanto doía nele toda a distância que Scorpius tinha criado entre eles. E como ele havia achado que aquele momento de choro era uma trégua. E, também, como ele havia sentido tristeza, raiva, pena e culpa depois que o treino de quadribol tinha o ajudado a esfriar a cabeça.

Enquanto ele desabafava sobre tudo, Rose segurava suas mãos. Ela sabia da paixão que Alvo nutria por Scorpius antes mesmo de ele saber. Rose acompanhara todas as suas confusões, seus dramas, suas negações e, por fim, ela era quem o aturava falando de como Scorpius era lindo e perfeito e sensato e maravilhoso e a melhor pessoa desse Universo todinho.

Embora Rose já tivesse aconselhado que Alvo contasse sobre seus sentimentos, ela respeitara sua decisão de não contar nada. Ela compreendia que não era tão simples e o quanto o medo de estragar a amizade era palpável.

Durante o desabafo, ele foi deixando de lado o assunto delicado que era a paixão secreta de Scorpius por alguém. Mas, depois de tudo, aquela informação não poderia continuar em segredo.

— O que?! — Rose parecia tão indignada e afetada quanto Alvo ao perceber que “não era um amigo tão bom e confiável assim”. — Como ele tá apaixonado e não contou pra gente?!

Por mais incrível — e, de certa forma, egoísta — que possa parecer, Alvo riu. Ele não apenas riu, como gargalhou. Afinal, não era um problema com ele, certo? Scorpius não tinha escondido seu sentimento apenas dele, mas também de Rose. Isso significava que aquilo deveria ser algo muito mais relacionado à timidez de Scorpius do que ao fato de seus melhores amigos não serem confiáveis.

Então ele parou de rir.

Ficou por alguns segundos sério, pensativo. Não era momento de rir. Algo sério estava pairando entre eles.

— Rose, ele chorou muito. Ele não tá se sentindo bem com essa paixão. Ele até tava tentando fazer uma poção pra parar de sentir isso. Sabe, se fosse para me contar algo, ele já teria contado, então acho que é sua vez de oferecer seu ombro amigo e ativar seu superpoder do apoio emocional… Vai lá cuidar do nosso nenê, Rose…

Ele deu um meio sorriso, levemente triste, ao pedir aquilo à prima. Em partes porque a culpa de ter pensado apenas em si e ignorado os sentimentos do amigo começava a consumi-lo, e em partes porque ele queria muito que seu apoio fosse suficiente para deixar Scorpius se sentindo bem.

E, bom, Scorpius era o nenê deles mesmo. De início os dois o chamavam assim só por implicância, já que o garoto ficava bravo. Mas, depois, eles perceberam que mesmo com as reclamações ele gostava daquilo. Do cuidado, da proteção, do carinho que ambos direcionavam a ele.

Rose apenas assentiu silenciosamente. Eles eram um trio e se algum deles não estava bem, nenhum dos outros dois poderia estar.

— Eu vou pra Masmorra tomar um banho e peço pra ele vir te encontrar aqui. Se algo der errado, como ele recusar sua ilustre companhia, te mando minha coruja.

Ele deu uma piscadela e deixou um beijo na bochecha da prima, murmurando um “muito obrigado”. Saiu da torre de Astronomia se sentindo melhor. Além da leveza do desabafo, agora nascia no seu peito uma esperança. Se Rose conseguisse deixar Scorpius se sentindo bem, a chance do muro criado recentemente entre eles ser derrubado era bem grande.

E ter Scorpius de novo perto de si era o que ele mais queria nesse mundo.

Sentimentos - Scorbus - ConcluídaOnde histórias criam vida. Descubra agora