Prefácio

65 7 1
                                    

O sino da igreja soou alto ㅡ apesar de estar tão longe ㅡ, e me fez acordar num pulo sobre a cadeira. Algumas pessoas me olharam, mas logo voltaram para seus afazeres. Por uma das janelas daquela sala de espera podia ver o grande relógio da igreja; era meio dia. Meu estômago doía de fome, mas meu coração doía mais, de angústia e medo de perder meu pai a qualquer momento.

Apenas pensar nisso me fazia chorar, apesar de saber que as chances dele sobreviver eram quase zero. E me doía ainda mais lembrar que eu acompanhei tudo isso de perto, vi ele afogar as mágoas no álcool, e principalmente nos cigarros, desde que minha mãe foi embora. E eu nunca soube o porquê ela não quis me levar. Acho que nunca gostou de mim, e nunca quis que eu nascesse. Apesar disso, eu vivi muito bem com o meu pai.

Para dizer a verdade, sequer me lembro bem de como ela se parecia, ou como me tratava, mas tenho certeza absoluta que ela não era a melhor mãe do mundo. Lembro que ela não andava, estava sempre na cadeira de rodas, com a qual ela passava por cima dos meus pés as vezes. Se pensar bem, esse era o contato mais próximo de carinho que eu tinha com ela, por mais que seja difícil acreditar.

ㅡ Senhorita Gaeul?

Levantei minha cabeça depressa, vendo o médico responsável por meu pai com uma expressão apreensiva. Me levantei em meio segundo, sentindo minha visão escurecer e tudo girar. Me senti extremamente tonta, e não consegui sequer dar dois passos, pois logo estava no chão.

Não faço ideia de quanto tempo demorei para acordar, mas quando meus olhos se abriram, a primeira coisa que vi foi profissionais empurrando uma maca com um corpo coberto. Apesar de não ver seu rosto, nem roupas, nem nada, meu coração se apertou, e eu fiquei com falta de ar. O barulho da minha respiração pesada chamou a atenção de uma das enfermeiras, que logo chamou o doutor de antes. Eu não conseguia falar direito, mesmo quando minha respiração voltara ao normal. Ele suspirou e tirou algo do bolso do jaleco, me entregando em seguida.

Ela um papel, dobrado algumas vezes para caber no pequeno bolso. Quando o desdobrei, reconheci a ㅡ péssima ㅡ letra de meu pai. Meus olhos se encheram de lágrimas já na primeira linha da folha.

"Oi, minha filha. Perdão, não tenho muito tempo, sinto que vou morrer daqui alguns minutos. Doido, né? Como eu sei disso? Eu não sei... eu sinto, sinto que a morte está chegando para me buscar. Ela está na porta agora, esperando eu terminar de escrever isto.

Tem algo que você precisa saber. Eu gostaria de ter contado antes, afinal, acho que é direito seu. Realmente não tenho tempo para suspense, então vai! Eu não sou seu pai biológico. Apesar de ser meu nome na sua certidão de nascimento, eu não sou seu pai de verdade, infelizmente.

Sua mãe manipulou o seu pai verdadeiro, e ele dormiu com ela achando que era outra pessoa. Não dá tempo de explicar tudo, me desculpa, é uma longa e muito complicada história. Mas sei que se você procurar, vai conseguir achar muita coisa.

Mas de uma coisa eu sei: seus avós, tios e até primos devem ter muita vontade de te conhecer. Se um dia você encontrar eles (mesmo que não queira procurar), peça perdão à sua tia por mim. Ela foi o meu grande amor. O amor que acabou por minha culpa.

Eu te amo, e adeus."


Be Strong || Kim JungwooOnde histórias criam vida. Descubra agora