Mini-contos do desafios das imagens. Projeto Writing.
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Ato I – 1997.
– Sillas, sua irmã pelo menos tem notas razoáveis, e você? – O discurso era o mesmo a cada entrega de boletim. Sua mãe repetia as mesmas palavras por horas e horas. – A filha da vizinha, a Anna, já está tão avançada que tem bolsa garantida na faculdade, e acabou de sair do primeiro ano, e você?
A mulher loira dava voltas ao redor da mesa de jantar onde estavam espalhadas as provas finais e o boletim manchado de vermelho, enquanto praguejava sobre as notas ruins de Sillas.
– Mãe... – Sillas começou, sem chance alguma de terminar.
– Não me interrompe menino! Fica caladinho enquanto eu falo com você!
Calou a boca, meio puto, não adiantava argumentar mesmo. Ela continuaria falando da prima, da irmã, da filha da vizinha. Todos eram melhores que ele. Mas, desta vez a mulher tinha razão, reprovar tinha sido vergonhoso.
Dormiu, enquanto a mãe falava.
Acordou com a filha da vizinha olhando para si, de uma forma estranha. Ela conversava com sua irmã na sala baixinho, como se contassem um segredo, e parecia não ter noção que ele tinha acordado.
– Sophia, por qual motivo você e o Sillas são tão diferentes?
– Ah Anna, não sei direito, mas mamãe costuma dizer que ele é parecido com papai, e eu com ela.
– Entendi. É bem estranho, você e sua mãe são tão clarinhas, e ele tem o cabelo esquisito. – Anna suspira, pausando, e continua baixinho – Eu queria passar a mão no cabelo dele, só pra ver como é.
Pronto, agora Sillas desejava estar realmente dormindo, para não ter escutado. Tinha certeza que tinha corado as bochechas em tons vermelhos, coisa quase impossível para a pele negra do rapaz. Tossiu, fingindo acordar e saiu para o banheiro.
– Porra, que inferno! – Sillas bateu com todas as suas forças nas portas metálicas do armário, puto. Nossa, como queria uma ferramenta qualquer pra abrir essa porcaria de porta. Se tivesse um maçarico abriria no fogo! Nem que pra isso queimasse os dedos.
Cansado de bater, encostou a cabeça no metal frio, mentalmente esgotado, com os nervos saltando em círculos de angustia e sofrimento. A escola já estava fechando, ninguém tinha dado falta de si, ninguém viria salvá-lo, não estava em um filme de contos de fada que algum zelador aparecia para tirar o aluno zoado preso no armário.
Provavelmente ficaria ali até amanhecer o dia.
Resultado?
Sua mãe brava, achando que ele dormiu fora simplesmente por que era um inútil. No outro dia perderia as primeiras aulas pois iria para casa tomar um banho e chegaria atrasado...
Escutou vozes, sons de passos ao longe, duas pessoas. Reconheceu a voz de Anna, reconheceria a voz dela em qualquer lugar. Fina, feminina e engasgava ao rir fazendo um som estranho. Estava acompanhada de um rapaz. Não sabia quem.
Grudou a orelha no metal da porta, tentando escutar mais. Tentando entender o que conversavam. Por alguns segundos saber o que se passava ali era mais importante do que escapar de seu cativeiro. Não deveriam mais estar na escola, todos já deveriam ter ido. Ana não era o tipo de garota que ficava dando bobeira por aí.
Não ouvia mais nada. Parou sua respiração, parou de se mover tentando captar qualquer som. Até que ouviu o armário ser destrancado e foi puxado pelo colarinho da camisa para fora por Jesse Forest. Um grande idiota.
Anna tinha visto tudo, encolhida em um canto, com medo da explosão de raiva de Jesse.
Aquele dia apanhou mais que nos anteriores. Perdeu um dente, cuspiu sangue, tinha hematomas por várias partes do corpo que lhe doíam tanto ao movimentar o musculo, e além de tudo tinham atingido coloração purpura. Parecia um dálmata. Mas ao invés de branco com manchas pretas, era preto com manchas roxas.
Um, dois, três passos. Sillas respirou fundo. Faltavam mais alguns passos da escola. "Ano novo, vida nova" disse sua mãe antes que ele saísse de casa. Que baboseira fodida.
– Olá Sillas! – Passou por si uma Anna muito sorridente, de cabelos mais curtos e um rosado diferente nas bochechas e nas pálpebras dos olhos. Maquiagem? Puta merda, ela estava ainda mais bonita. Ela acenou e foi embora, simples assim. E ele? Tinha borboletas no estômago.
Sorriu, um pouco bobo, a observando enquanto ela ia até Jesse. Grande idiota Jesse. "Ano novo, vida nova", não é mamãe? Então que seja, esse ano será diferente. O pensamento de enfiar a cabeça pálida do primogênito dos Forest na privada e dar descarga lhe animou.
Foi pra aula, e no fim, enquanto guardava os livros no armário, esperou. Desta vez ele veio sozinho, ótimo. Esperou que chegasse perto, o empurrou e correu. Correu com todas as suas forças até o pátio, e como o esperado, Jesse o seguiu.
Sillas passou pela porta e aguardou, aguardou a hora certa.
Quando Jesse passou pela porta, puxou a corda, fazendo com que o balde de gasolina caísse em cima do outro garoto.
– Que porra é essa Sillas? Ficou louco seu desgraçado?
Risos altos, gargalhou como se tivesse ganhado na loteria, então acendeu o isqueiro e jogou.
Os gritos foram ouvidos em toda a vizinhança, e o cheiro de carne queimada era insuportável.