Capítulo 48 - Attack

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O ar da floresta está denso, a humidade que se condensa sobre a névoa baixa lambe a pele em uma brisa fria, arredia... Há um aroma suave de grama molhada por todo lugar e o único som que se pode ouvir é o do lamuriar farfalhoso das folhas nas copas das árvores. É apenas mais uma madrugada de inverno.


O frio ainda não é tão intenso como se espera da estação, as tempestades estão brandas e a instabilidade no tempo ainda não deixou o primeiro floco de neve cair sobre a relva, mas já posso sentir a mortandade se instalando por onde quer que se olhe na floresta. Os orvalhos possuem por vezes uma geada fina, tão delicada que parece desejar inexistir na imensidão escura da mata.


Na antiga clareira há um pequeno lago em processo de condensação, ele parece uma placa opaca aos olhos, tendo suas águas esverdeadas formando camadas de gelo pouco a pouco, criando barreiras ao mundo externo e se deixando esquecer por longos meses até que a primavera lhe traga a vida mais uma vez.


Estou congelado como um lago no inverno.


Aos meus passos arrastados dentro da cabana a madeira corrida range, ameaça por vezes quebrar como se fosse deveras frágil, mas então se estabiliza; ela é uma dramática cantora de tragédias. Não culpo a instabilidade da madeira que compõem o chão, é tão velho que me surpreendo ainda não ter se quebrado completamente num pisar falso, mas resmungo sobre o esforço que faço dia após dia em reparar a estrutura decadente do lugar.


Não sei bem o que me motiva a estar embrenhado na mata, nem mesmo sei porque me dedico a reconstruir essa cabana na velha clareira, mas ainda assim faço calado, mergulhado na escuridão da mata e imerso na solidão que venho buscando.


É errado da minha parte fugir dos problemas, mas eu continuo o fazendo, não quero estar na casa que deveria ser meu lar, pois sei que lá nunca estou livre de condenação. É triste e sufocante, minha presença é opressora e imponente onde quer que eu ponha meus pés, as pessoas me evitam, temem meu olhar, repudiam minha fala e, no fim, acabo sendo mais isolado do que aqui.


Lembro-me por vezes que há males que vem para o bem, eu já não era adepto a estar rodeado de pessoas então agora que minha presença em si é desagradável, posso desfrutar dessa solidão sem peso na consciência. O lado negativo de tudo isso é apenas ter que aguentar o mar de questionamentos que recebo toda vez que retorno a casa; os hyungs ainda não gostam tanto do meu renascer abrupto.


"Você está bem?"


Ah, como esta pergunta era irritante...


Eu não me lembrava a quanto tempo ouvia aquilo, perdi as contas de quantas e quantas vezes essa pergunta idiota corria pelos lábios alheios e já não tinha a paciência necessária para respondê-la com a devida polidez. Afinal, sendo sincero, teria como estar bem? Não em absoluto.


"Sim, estou bem."


Essa era a mentira que eu pintava a todos porque, no fim das contas, nada estava bem.


Eu sabia que as pessoas à minha volta não faziam por maldade, não era por implicância nem por desejo de me ferir psicologicamente, no entanto aquilo me sufocava bem mais do que qualquer situação que já tinha passado na vida. Eu não estava bem, estava claro que eu não estava bem e ainda assim as pessoas tinham o mau hábito de me indagar o óbvio.

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