Capítulo 4: Ele é Quem Precisa de Você.

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Olhei ao meu redor e tudo estava exatamente do mesmo jeito do momento em que fomos ao Salão Azul. A rua ainda estava cinzenta, o asfalto molhado cheirava à garoa urbana, os carros e transeuntes enfrentavam seus próprios problemas, as gotas de chuva continuavam a se precipitar da ponta das telhas. Era como se nem houvéssemos saído dali. Me despertando do meu leve torpor, Lypímenos indagou, procurando os meus olhos:

- Menorah, você realmente acredita em mim?

- Sim, Lypímenos. Apesar de ainda ser tudo muito surreal, acredito. Acho que, na verdade, a vida não valeria a pena se vivêssemos procurando a lógica das coisas. Afinal, tudo o que há de mais incrível para ser vivenciado, não tem lógica. O amor, o deslumbramento, a esperança... São sentimentos maravilhosamente ilógicos.

- Concordo. O universo não segue um padrão científico, como muitos pensam. A vida fica extremamente limitada se for considerado apenas o que é concreto, o que é plausível. E, no fim, Sócrates tinha razão... Quanto mais pensamos que sabemos, menos sabemos.

- Eu sou a prova viva, agora que te conheci, de que "só sei que nada sei" não é só uma citação, é um fato.

Suspirei, sentindo-me estranhamente confortável em conversar com Lypímenos. Seu belo rosto me encarava, com uma expressão séria, porém, calmamente amistosa. Ele era um bom ouvinte.

- Fazia tempo que eu não conversava assim. Não chorava assim... - Confidenciei, quase que sussurrando, envergonhada por ter desabado daquele jeito. Mostrar minhas fragilidades, minhas vulnerabilidades, me deixava angustiada e insegura, já que aqueles que eu permiti que vissem as minhas cicatrizes, abriram velhas feridas e fizeram outras novas. E no fim, eu acabava sempre tendo que curar meus próprios ferimentos, enquanto fingia ser tolerante à qualquer dor que pudessem me causar.

- Eu sei. - Ele apertou os olhos, que brilhavam, apesar de serem escuros. - Eu sinto muito pelo que você passou e tem passado... - Lypímenos deu brecha ao seu sorriso torto e sutil, - você vai ser muito feliz, eu garanto.

- Obrigada... - Eu não sabia como agradecer àquela gentileza do universo, no entanto, o modo como aquele curioso rapaz me olhava, me deu a sensação de que ele entendia o quão grato e surpreso o meu coração estava.

- Bom, agora precisamos planejar o seu primeiro contato com o... - Ele pegou o celular de novo, focando na missão, - Fernando.

- Eu não falo com o Fernando há 13 anos... - Comentei, voltando à "realidade" (bem entre aspas). - Com certeza, ele nem se lembra de mim. O que você pretende fazer, para a gente se encontrar?

- Ele trabalha próximo a estação Dom Pedro. Ele tem um... - Lypímenos falava, enquanto lia algo em seu celular, - escritório de contabilidade! Não é perfeito? É só irmos até lá para vocês terem um contato inicial.

- Mas, por que eu iria até lá? Qual seria a minha desculpa? Eu não posso simplesmente aparecer do nada e dizer: "Oi, Fernando, lembra de mim? Eu vim aqui só pra te ver!".

- Simples. Você está desempregada e foi entregar uns currículos. E, por acaso, calhou de vocês se esbarrarem.

- Mas, Lypímenos... Ele está namorando? Ou se casou?

- Pelas minhas pesquisas, não... - Ele parou de deslizar o dedo sobre a tela do celular e me fitou, - bom, esse primeiro encontro tem que ser inesquecível! Ele precisa colocar os olhos em você e pensar: "que mulher mais maravilhosa é essa?". Você precisa chamar a atenção dele para o diálogo não morrer na futilidade do: "oi, tudo bem? Quanto tempo!".

- Sim, você está certo. Mas, acontece que eu não sou o tipo dele... Quer dizer, eu não sou o tipo de ninguém. Ninguém olha pra mim e fica embasbacado com a minha beleza. As pessoas só elogiam o meu cérebro. Não que isso seja ruim, claro que não. É só que, às vezes, eu queria que alguém elogiasse a minha totalidade, o ser integral que sou.

- Menorah, - ele colocou as mãos nos meus ombros e seu rosto indescritivelmente bonito aproximou-se do meu, - você é linda, inteligente e forte. Antes de tentar qualquer coisa com o Fernando, você precisa entender que você é incrível. Na verdade, você não precisa do Fernando. Ele é quem precisa de você.

MenorahOnde histórias criam vida. Descubra agora