[Duas semanas depois]
[Sexta-feira, 24 de maio de 2019]
O despertador ao lado da minha cama começou a tocar, indicando já ser 07h00, mas eu já estava acordado, encarando o teto. Tudo estava tão escuro e frio. Já fazia dias que não conseguia pegar no sono. Hoje de madrugada, por exemplo, eu havia sonhado com ele — um ser recôndito, cujo olhar estava reservado por baixo de uma bela máscara.
No sonho, eu estava sentado no chão de um beco desprovido de luz, sozinho e com medo. E aí surgiu um homem do nada, que segurava uma arma prateada. Ele me estendeu uma mão e disse que tudo ia ficar bem. Acordei bem na hora em que vi uma gota vermelha pingando do cano da arma. Entretanto não levei nenhum susto — abri os olhos naturalmente. O sonho me deixara extasiado.
Pessoas misteriosas me causavam muito fascínio, e isso era um problema.
Suspirando baixo, desliguei o despertador, totalmente sem ânimo, e tirei o lençol de cima de mim, entrando no banheiro em seguida. Eu tinha voltado a trabalhar há dois dias, pois meus ferimentos quase que se curaram por completo. Havia uma marca discreta aqui e ali no meu rosto que provavam que eu passara por um acontecimento doloroso, mas nada que me impedisse de fazer alguma coisa produtiva. Atender pessoas num hotel não era uma tarefa complicada. Eu podia fazer isso. Além do mais, ficar em casa já estava me matando.
Sob a água do chuveiro, fitei a parede por longos segundos enquanto pensava que duas semanas se passaram e eu não voltei a ver Dimitri. Pareceu ter se passado bem mais tempo desde o nosso último contato. Cheguei a ter muita esperança de que algo, talvez o destino, se é que ele existisse, estivesse ao meu favor e me fizesse rever o tal homem místico.
Mas isso não aconteceu. Foi exatamente como ele disse: não nos veríamos uma segunda vez. As palavras deram voltas no meu cérebro durante as noites. Isso culminou num vazio estranho dentro de mim, e fiquei chocado com a minha vontade anormal de falar com ele de novo. Por que eu tanto queria isso? Não sabia. O que eu diria, afinal, se o reencontrasse? Eu também não sabia. Minha única certeza era a de que eu desejava vê-lo novamente.
Às vezes, eu torcia por coisas impossíveis.
Talvez ele estivesse ocupado demais matando mais gente para se lembrar da minha existência. Eu fui apenas mais uma vítima salva pelas suas mãos — alguém qualquer, não mais importante do que um ser humano comum. Ele não precisaria de um motivo para vir até a minha casa, não quando tinha outras inúmeras vidas para salvar. Há quanto tempo será que ele está nesse ramo? A partir de qual momento decidiu que queria fazer parte disso? E como nunca foi pego?
Cacete. Isso não deveria ser da minha conta. Eu não deveria ficar pensando nisso... mas não conseguia deixar de pensar. Ele era intrigante demais para ser ignorado com facilidade.
Desliguei o chuveiro e saí do banheiro. Vesti minha roupa do trabalho — um conjunto social de camisa branca, blazer e calça, estes dois últimos de cor preta — e caminhei até a "cozinha". Era um pouco esquisito dividir os cômodos da minha casa, visto que só havia um, mas minha imaginação era fértil demais, então eu podia imaginá-los distribuídos pelo ambiente apertado.
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INTENSÉMENT (temporada um)
DragosteMiguel Duarte é um rapaz de vinte e quatro anos que tem uma vida muito simples e solitária. Sem contato com seus pais e sem uma graduação, sua única rotina é trabalhar em um hotel luxuoso localizado próximo à sua casa. Certo dia, numa madrugada de d...