As primeiras semanas vivendo em um país com uma cultura totalmente diferente da minha me trouxeram um misto de emoções e uma série de autoquestionamentos. O primeiro choque de realidade veio quando entrei em um vagão do metrô pela primeira vez e várias pessoas me encararam como se eu fosse algum tipo de bicho exótico. Pra alguém que não gosta de chamar atenção, isso é péssimo. Eu só queria um lugar pra enfiar a minha cara.
Foram inúmeras as vezes em que me perdi e peguei o ônibus errado indo parar em lugares aleatórios. Cada novo dia nessa cidade desconhecida vinha acompanhado de uma nova experiência, tanto boa quanto ruim. Mas, de todas as coisas que presenciamos, uma em particular foi, definitivamente, a mais estranha.
Após a aula, Liz mexia no celular enquanto esperava o metrô pra voltar pra casa quando, segundos antes de entrar no vagão, um homem puxou o celular de sua mão e a empurrou para dentro do metrô. Ela caiu no chão e olhou assustada para o homem que digitava algo no celular dela. O homem colocou o pé para impedir que as portas do vagão fechassem, terminou de digitar e, então, jogou o celular de volta pra ela e saiu correndo. Ao pegar o celular de volta e olhar a tela pra ver o que o cara tinha digitado, ela descobriu que ele tinha adicionado o número de telefone dele na agenda dela. Com a voz um pouco trêmula, ela enviou um áudio no nosso grupo falando sobre o ocorrido nos deixando preocupadas e intrigadas.
As coisas aqui são bem diferentes dos dramas que assisti e das cenas que idealizei em minha cabeça. O processo de adaptação está sendo um pouco complicado... Júlia e Theo, por outro lado, não estão enfrentando dificuldades para se adaptar e estão amando a escola, que é em horário integral e facilitou bastante as coisas pra nós já que Alice trabalha durante o dia e está se preparando para começar a estudar, Liz tem aulas nas segundas e terças pela manhã e trabalha a tarde em um hospital, minhas aulas são as quintas e sextas pela tarde e, pela manhã, trabalho no Seoul Forest.
Seoul Forest é um parque natural que fica localizado em Seongdonggu. O lugar é absolutamente deslumbrante. Estou encantada. Eu sou apaixonada pela natureza, então era meio óbvio que eu ia gostar de trabalhar lá. Minha função no parque é, basicamente, acompanhar os visitantes em trilhas, passeios, auxiliar no processo de reflorestamento de algumas áreas do parque e informar a respeito de algumas espécies de plantas e animais que tem aqui. Se os visitantes quiserem, claro.
É um dia chuvoso em Seul. O parque não vai estar aberto para visitação e, portanto, eu estou de folga. Observo a cidade da janela de meu quarto, a chuva cai sobre os enormes arranha-céus e o vento forte acaba fazendo um barulho de uivo que se mistura com o som das buzinas e dos motores dos carros nas ruas. O trovão soou com estrépito por todos os cantos do pequeno aposento e começo a pensar seriamente em não deixar as crianças irem para a escola. Saio do quarto indo até a cozinha, onde preparo um chocolate quente para beber já que não sou muito fã de café. O silêncio se faz presente em todos os cômodos da casa me deixando um pouco confusa, nossas manhãs costumam ser agitadas. Quando confiro as horas em meu celular finalmente entendo o motivo do silêncio, ainda está cedo.
Quando eu era pequena, em dias de muitas chuvas e trovões meus avós desligavam todos os aparelhos eletrônicos da casa e ficavam no quarto deles conversando sobre o passado e coisas aleatórias. Os espaços na cama eram, aos poucos, ocupados por minha mãe, meu tio e eu. Enquanto chovia forte lá fora, nós conversávamos e ríamos. Me lembro de sempre me deitar ao lado de meu avô e de observá-lo rir. Lembranças como essa me fazem questionar se fiz o certo em vir pra cá. Autoquestionamento também é um traço da minha personalidade. Costumo me questionar a respeito de todas as minhas decisões.
Afasto da cabeça os pensamentos negativos a respeito do rumo que minha vida está tomando e saio da cozinha indo ao quarto das crianças. Abro a porta com cuidado e me deparo com dois anjinhos em sono profundo.
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Beyond Dreams
FanfikceTudo aconteceu de um jeito que nenhum vidente poderia prever. Foi tudo muito inesperado e rápido também. Em questão de meses a minha vida mudou quase que completamente colocando a prova todas as minhas crenças. Acho que poderia dizer que foi tudo so...