Capítulo 2 (Retirada dia 08/12)

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Quase desmaiei! Ainda vi tudo escurecer, mas não cheguei a perder a consciência. Bastou alguém quase me ensurdecer gritando o meu nome que despertei do estado de letargia. Ao melhorar e ficar mais atenta, observei o meu redor e percebi que os dois idiotas de mais cedo continuavam bem sentados, sem nem parecerem preocupados por alguém que por pouco apagara em frente a eles!

Esse foi o primeiro pensamento que tive. O segundo foi:

- Engraçado... Nunca tenho essas coisas. Deve ser o cansaço. Estou tão exausta que até escuto maluquices. Por exemplo, o senhor falou dez mil reais e ouvi dez milhões! Completamente doida. Desculpe pela cena.

Nesse momento, alguém fez som de engasgo e o advogado me observou com uma expressão que variava de puro divertimento para uma forçada seriedade.

- A senhorita pode até estar cansada, não é fácil lecionar, principalmente quem faz isso nos dois turnos. Porém, preciso dizer que a sua audição está perfeita. Em nenhum momento me referi a dez mil. Falei dez milhões de reais.

- Acho que realmente vou passar mal e não é pelo cansaço. Dez milhões? - guinchei. - Herdei dez milhões de reais de um completo desconhecido? Meu Deus, fui abençoada! Enfim sairei do estágio de pobreza eterna. Obrigada, finado! O importante é a pessoa se arrepender no final da vida e fazer boas ações.

- Alguém pode fazer essa... essa moça se calar? - falou o soberbo do elevador, sem ao menos olhar para mim. E, dirigindo-se ao advogado, continuou: - Eu conhecia o velho como ninguém e sei que nada vem gratuitamente dele. Muito menos depois que ele estivesse morto quando não poderia desfrutar de suas brincadeiras. O senso de humor de João Coimbra era tudo, menos benevolente. Você falou de condições. Isso não me surpreende, mas estou curioso. Quais condições o defunto quis deixar como herança para nós e essa pobre coitada?

Dessa vez não consegui me segurar. O imbecil estava passando de todos os limites.

- Olha, babaca, sou pobre sim. Não tenho como negar um fato. Mas coitada, nunca. Coitado é você com sua soberba e arrogância. Cuidado para não se afogar no próprio veneno.

- Ora, ora, a matuta tem garras... Interessante. Porém, mudando de assunto, apesar de não concordar com Marcos na maioria das vezes, ele está certo em um ponto importante: o velho não seria bonzinho em vida e muito menos em morte quando nem poderia ser contestado. Estou ansioso para saber quais são as condições que aquela mente doentia montou.

- Meu Deus, o homem morreu! Vocês não respeitam o pai nem depois de morto? - indaguei, assustada com todo aquele clima.

- Não! - Foi a resposta que recebi em uníssono dos quatro filhos.

Puta merda! O finado devia ter sido o cão em forma de gente. Mas para mim ele era um salvador e eu não estava nem aí para o que ele tinha feito em vida!

- Bom, não gosto de falar mal, nem de escutar coisas ruins de quem já se foi, então vou logo informar sobre as condições impostas.

Heitor, o advogado, parecia gostar de brincar com as pessoas. Somente isso para justificar sua pausa dramática, bebendo água e fingindo que limpava seus óculos de grau. Enquanto isso, os quatros mauricinhos fingiam não estar ansiosos com a revelação das condições. Uns olhavam o celular, outros confirmavam as horas nos seus relógios do tamanho de um pulso.

E eu? Eu queria que ele terminasse logo com o joguinho de cena e me dissesse que eu não precisaria matar ninguém para ficar com os dez milhões. Claro que poderia fazer qualquer coisa, mas matar... Se ao menos fosse uma pessoa ruim... Não, Juliana! Nenhuma vida valeria dez milhões. Nenhuma!

Ao tempo em que tentava me convencer que homicídios estavam fora de questão, Heitor, enfim, voltou a falar.

- Vamos para as condições. Antes, porém, preciso dizer que o senhor João tinha o sonho de unir a família Coimbra. Fazer com que vocês, os únicos descendentes diretos, tornassem amigos e pudessem conviver de maneira sociável após a morte dele.

Quatro herdeiros e a escolhidaOnde histórias criam vida. Descubra agora