Capítulo 3 (Retirada dia 08/12)

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O dia da mudança tinha chegado e eu mal conseguia segurar a vontade de ir ao banheiro com tanta dor de barriga. Ansiedade me matava aos poucos com aquela mudança brusca de rotina.

Depois da leitura do testamento no escritório de advocacia, Heitor pediu para falar comigo em particular. Assim todos os quatro herdeiros foram embora, ficando apenas eu e ele na sala de reunião.

O advogado me explicou que o falecido, sabendo da minha situação, deixara um valor mensal para as minhas despesas, pois entendia que eu não poderia continuar a lecionar na escola morando do outro lado da cidade, onde se localizava a mansão. Como uma forma de me ajudar a cumprir as condições testamentárias, ele arcaria, durante o tempo em que permanecesse na mansão, com os meus custos. Ao perguntar o valor da ajuda mensal, pensando se ela realmente cobriria os débitos, quase caio da cadeira.

- Dez mil mensais. Ele achava que isso seria o suficiente, mas me deu permissão para oferecer mais, caso não dê.

Claro que eu poderia mentir e fingir para ganhar mais, entretanto minha situação financeira precária era tão óbvia que não fiz isso. Além do mais, sempre fui uma pessoa honesta. Não conseguiria inventar histórias para ludibriar ninguém.

- É o suficiente. Só estou com medo de dar tudo errado e eu perder meu emprego. Voltar para o nada, sabe?

- Não se preocupe. O senhor João também previu essa possibilidade. Caso alguém desista ou não cumpra todas as condições, embora não acredite que isso possa acontecer, mas se ocorrer, assegurarei um emprego para você. Temos contatos, não se preocupe.

Aliviada com aquela conversa, despedi-me do advogado e saí da sala com a promessa de que ele me enviaria todas as outras informações necessárias para o meu email.

As informações eram o dia da mudança, quando começaria a contagem de um ano e o endereço para onde eu deveria me dirigir. Usei o espaço de um mês entre a reunião e o início das condições para agilizar a minha demissão, entregar o imóvel que vivia para o locador e me despedir do único amigo que sabia toda a verdade.

- Você tem certeza?

- Que pergunta é essa, Leon? Te falei que são dez milhões de reais! É claro que eu tenho certeza.

Leon, minha pessoa de confiança desde que mudei para o seu bairro, quando meus pais faleceram em um acidente de carro, ainda olhava para mim assustado. Ele era desconfiado e achava estranho a sorte que eu tivera com a tal herança. Além disso, parecia inquieto com as condições, especialmente a necessidade de viver por um ano longe de casa.

- Sei lá... Morar com quatro homens na mesma casa. Fico preocupado.

- Eu não. A casa será monitorada vinte e quatro horas por dia em alguns ambientes comuns e, pelo amor de Deus!, terão pessoas trabalhando lá o tempo todo, o advogado me falou. Além disso, já estou bem velhinha para lidar com qualquer merda. Não se preocupe. Vá cuidar da Shirley que é o melhor.

Shirley, esposa de Leon, estava grávida de três meses e não se sentia muito bem. Estava fraca de tanto vomitar.

Na época em que mudei para aquele bairro mais pobre, há quatro anos, tive a grande ajuda de meu amigo. No começo, ele se mostrara interessado em mim como um homem a fim de uma mulher, porém eu não estava com cabeça para aquilo. No tempo que seguiu, nossa relação se tornou bastante amigável. Leon percebeu que seu interesse amoroso por mim não passou de pura ilusão. Ele estava deslumbrado pelo desconhecido. Quando passou a conviver comigo percebeu que meu temperamento não lhe agradaria muito como namorada. No fim, tornamo-nos amigos inseparáveis. Inclusive, eu apresentei ele para a sua esposa. E agora seria madrinha do filhinho deles.

Quatro herdeiros e a escolhidaOnde histórias criam vida. Descubra agora