Capítulo 5 - O ensino médio

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Só depois do carnaval, Chico voltou a se falar com nosso amigo. No entanto, por causa do fim das férias, esses dois demoraram um pouco a se entender; um entrara no colegial com aulas de manhã e o outro, preso no ginásio, estudaria à tarde; enquanto Ricardo vivenciava a chegada numa nova fase etária, na qual descobrir-se-ia livre para o mundo, o anterior dividia-se entre a ânsia por maior autonomia e o atraso nas responsabilidades.

Normalmente, os pais tendem a soltar os filhos conforme estes cumprem as obrigações lhes outorgadas; se as proles absorvem com desenvoltura os desígnios maternos, mais beneficiam-se da condescendência dos tutores a liberarem-lhes às vontades da turma e dos amigos, enfim, do meio social que realmente lhes importa nessa fase. A repressão ou as punições recebidas em casa por Francisco, tais como broncas e castigos de não poder sair à rua, funcionavam como uma via de mão dupla; ao mesmo tempo em que reforçavam a autoridade de Rosália, também cerceavam o desenvolvimento social do filho, cujas amizades Rosa reprovava; para o rapaz era difícil medir a importância das instruções da mãe, consideradas ordens para criança, e a interação com um grupo de colegas que, bem ou mal, lhe trouxe uns beijos na boca num dos bailes do America e o aproximava de várias garotas, algo que a responsável não lhe daria.

Ricardinho, por seu turno, aluno nunca repetente, de trazer alguns aborrecimentos, mas nada incontornável, ingressara no ensino médio. O bom na nova fase foi Portugal se perceber não um calouro dentre os anos finais da escola, mas sim um tipo mais experiente em relação a muitos dos playboys, ou filhinhos de papai, do Instituto Educativo, acostumados com mimos, porém indefesos contra os desafios fora de suas bolhas socioeconômicas, conjecturou Ricardo. O quarteto bolado ainda dominava o fundo da sala de aula e as gaiatices da galera; não eram tão bagunceiros, censurados por Rafael, mas, apesar deste ser o líder interno quando só estavam os quatro, na presença de mais pessoas, sob o comando social cada vez maior de Portugal, não resistiam a rir de suas piadas, em formas de perguntas, feitas do nada para os professores, sobre as matérias dadas no momento; as brincadeiras pareciam irresistíveis, a gargalhada se espalhava entre a turma, às vezes até os docentes riam das palhaçadas; não havia como culpar os mais próximos se a maioria também se entregava ao talento cômico do colega. Assim, Ricardinho rápido tornou-se popular na classe, agora completada com vários alunos novos, vindos de fora ou de outras nonas-séries; a fama servia para duas coisas, uma ser admirado e a segunda ser conhecido por todos e todas; o reconhecimento fazia-se importante, pois representava a identidade que o humorista marcaria na mente das garotas no mercado do amor; muito bem posicionado devido à sua personalidade extrovertida e expansiva, Portugal somente enfrentava concorrência a altura dos bonitões da sala, três caras, dois loiros e um preto, ambos de olhos claros, porém, tipos metidos demais, que só vislumbravam a mais gata dali, a enigmática e bela Bruna Marilan, de cabelos longos, lisos e negros, pele marrom-claro, alta, olhos suavemente puxados, íris escuras, rosto afilado, lábios pequenos, sorriso cínico, corpo esguio e andar elegante. No finalzinho de março, veio o tradicional passeio da escola; após curtir o dia no parque aquático de sempre, desta vez nosso amigo frequentaria não mais a festa vespertina do ginásio, separada e terminada às dezoito horas, mas sim a do colegial, que ia até às oito da noite; evidentemente, sobraram cortejadores atrás da Bruna Marilan; entretanto, o trio de galãs cercou a companheira da cento e um, para mantê-la longe dos demais candidatos e restringir entre eles o possível ficante dela nessa noite; a menina não beijou ninguém, preferiu mostrar a imagem de mulher difícil, exigente e digna de regalos; mais uma cheia de frescura, classificou Portugal; nem a apelação de Sólon, novamente de terno e gravata, impressionou a dita cuja; se muitos a desejavam, alguns sequer se preocupavam, a exemplo de Marinho, ausente no passeio porque foi se concentrar com o time do America fora da cidade; Virtuoso também ignorou a beldade, pois, em iniciozinho de relação, só tinha olhos para Cacau, seu primeiro amor e futura namorada; Ricardinho ficou em cima do muro, se a bela desse-lhe oportunidade, claro que iria, mas, diante de tamanha dificuldade, passou distante do objetivo; Bruna Marilan não era a única garota no recinto, todavia, nosso amigo, inexperiente, nunca havia abordado uma estranha por motivações amorosas, todos os seus casos aconteceram com conhecidas, não seria aqui, onde o insucesso o exporia à grande vergonha, que o faria, destarte, em vez de correr o risco de um êxito capaz de, ao contrário, reputá-lo como pegador, escolheu a discrição; sem alternativas, restou a Portugal voltar suas atenções às outras meninas da turma; embora não gostasse de nenhuma delas, uma em especial acendeu a libido do rapaz; depois de uns olhares cruzados, Ricardinho percebeu que a repetição das fitadas mútuas não eram mais por acaso, viraram flertes de longe; talvez ela esteja me dando mole, avaliou o adolescente; inibido por não saber o que fazer, se ia até a moça ou não, e se fosse o que diria, as ideias não vinham-lhe a mente; imagina na frente dela, aí é que vai dar branco mesmo, previu nosso amigo; contudo, como última opção, resolveu chamar a pretendente por uma rede social, num bate-papo privado; falei com um pessoal agora da galera sobre a festa e queria saber sua opinião também, pra mim está muito fraca, pensei que fosse muito melhor, parece a matinê do ensino fundamental, dizia a mensagem de texto do galanteador, disfarçado de mero colega de sala; de assuntos genéricos em assuntos genéricos, o diálogo avançou madrugada adentro, cada qual já em suas respectivas casas; fofocaram sobre os pouquíssimos casais do evento, a maioria formada antes da citada ocasião, ou seja, quase não rolaram pares inéditos ali; chegaram a revelar seus gostos pessoais nos jogos do amor; entretanto, inseguros, se o outro queria, não tocaram na hipótese de se paquerarem. Enrolados, em um mês e meio, finalmente se beijaram; em segredo, encontravam-se todos os dias na rua Antônio Pinto da Mota, sem saída, com acesso pela Barão de Itapagipe, à direita de quem sobe a Professor Gabizo; praticamente entocados no fim da ruela, despediam pelo menos uma hora aos amassos diários cada vez mais ardentes; nas férias de julho pegaram fogo; nesse período, as fodas à tarde com Dalila e as das segundas-feiras com Magnólia escassearam para Ricardo, por conta das inoportunas visitas de Chico, doido por um novo flagrante para tentar a prima, e dos irmãos menores de Dalila que não davam trégua atrás do videogame; como a nova cúmplice também passava o dia sozinha em casa e ele estava louco para tirar o atraso carnal, insistente, nosso amigo conseguiu ir no apartamento de sua primeira namorada, pelo menos a primeira em que teve um romance e não apenas sexo ou amizade colorida; ela não era mais casta, perdera com um primo, o qual lhe servia sexualmente nas esporádicas reuniões de família, pois moravam afastados, e teve uma transa casual no carnaval deste ano, seduzida pelo irmão de uma amiga, nada mais; as parcas experiências da menina aumentavam suas incertezas a respeito do que estava prestes a fazer, no entanto, o calor do corpo, tão convidativo no frio do inverno, e o afinco do parceiro venceram-lhes os bloqueios; num último protesto, ela impôs o uso de preservativo. As aulas voltaram, as metidas com Dalila e Magnólia também, e agora Portugal tinha uma terceira amásia, a número um, a fiel, a dona, conforme avaliaram os integrantes do quarteto bolado; no início, Ricardinho gostou dos elogios por pegar três mulheres; mas, mal contaram quatro semanas de relação mais séria com a colega de classe, a mesma passou a cobrar compromisso, queria que o namoro fosse tornado público, inclusive e principalmente nas redes sociais; nosso amigo estava habituado à liberdade de não dar satisfação a ninguém, somente à mãe; até então, nenhuma de suas comparsas no sexo havia reclamado algo em troca. Após postergar sua decisão por alguns dias, um fato fortuito, meio acidental, pesou no veredicto do garanhão; disposta a devolver os vasilhames de plástico em que vieram porções de batata gratinada ao forno e carne assada dadas por Dona Maria, do almoço de domingo, na terça, de folga, Rosália lavou a citada louça e foi entregá-la ao filho da doadora; como a avó supervisionava o trio de netos naquela dia, Ricardo pediu aos viciados no videogame para deixarem-no dormir até mais ou menos às quinze horas; pouco depois das catorze, a camareira subiu ao segundo andar, viu as quatro portas do hall fechadas, bateu no quarto de Portugal, não obteve resposta, rodou a maçaneta, descobriu a passagem do cômodo destravada, ouviu o silêncio advindo dali, insinuou-se adentro, constatou a presença do nosso amigo em meio à sesta, logo percebeu sua bermudinha samba-canção de sempre, lembrou da primeira vez em que a jogou de lado para descortinar o pau rijo ali embaixo, se encheu de tesão só com os pensamentos, tomou o cuidado de passar o ferrolho na porta e repetiu praticamente todos os movimentos da transa inaugural com Ricardinho. Embora tenha sido somente um sexo depois de cerca de um ano, o fato de foder de novo com Rosa significava que Portugal ganhara mais um motivo para terminar o namoro da escola; eu pego a Dalila direto e ainda tem a mãe e a tia dela que me dão de vez em quando, não preciso da outra, sentenciou o mancebo. Na segunda semana de agosto, diante de sua recusa em assumi-la para geral, a colega de classe desatou a relação; ela ficou arrasada; se sentiu usada; a desculpa esfarrapada, Ricardo dissera que estava atrapalhando os estudos, logo ele, maior agitador e quem mais obstruía as aulas, soou como pretexto inventado; no entender dela, o ex só queria sacanagem, conseguiu, se aproveitou, enjoou e a descartou; à senhorita, sobrou a lição de avaliar melhor os sentimentos dos candidatos antes de se entregar.

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