EXTRA 4

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EXTRA .4.

Ele passou a vir sempre. Talvez ainda mais seguido, mas mesmo assim, mesmo que todas às vezes eu me rendesse em seus braços e deixasse que ele tomasse meu corpo, eu sentia que havia um abismo intransponível entre nós. Ainda que, ao longo daqueles três anos, eu acreditasse piamente que poderia doar minha alma a Marino Romanowski sem medo de tê-la quebrada em minhas mãos em retorno, havia momentos nos quais eu tinha medo que ele simplesmente sumisse, sem explicações, e não voltasse. Porque ele sempre sumia, na verdade, mas também sempre voltava. E como era difícil viver assim.

Mas que direito eu teria de me intrometer em sua vida? Que direitos sobre seus atos eram esses que eu achava que possuía? Eu era apenas seu boneco de luxo. Ele vinha, usava-me, elogiava-me, dava-me presentes, mimos, carinhos, palavras de afeto. E eu lentamente cedia, tentava fugir, mas era inútil. Eu era dele. E invariavelmente, me apaixonei. E depois passei a amar. E com o amor outros sentimentos apareceram, como o ciúmes, a possessividade, a angústia, a entrega, o desejo.

Acho que percebi que não poderia aguentar mais aquela situação quando ouvi Pansy e Draco conversando sobre sexo, sedução e Harry Potter. Eu estava lendo um livro, mas mantinha meus ouvidos atentos aos dois. Era inacreditável que, depois de tanto tempo, Draco continuasse tão inocente. Sua ingenuidade fez com que eu me sentisse depravado, pois para mim, tudo era lógico, óbvio e natural. Meus traumas eram distantes, ainda que me atormentassem algumas vezes; eu sentia repugnância quando algum cliente tentava mexer comigo, e agradecia silenciosamente ao Marino por me manter exclusivo ao longo dos anos.

"Andrej! Andrej, mostre ao Draco como comer uma uva da maneira certa." Pansy chamou. Ergui as sobrancelhas, achando o pedido engraçado. Não era como se eu treinasse como comer uvas para provocar desejos eróticos nos outros, mas entendi que ela queria uma boa dose de malícia – que parecia inexistir em Draco – naquele simples gesto.

Me aproximei, reparando nas bochechas coradas do meu amigo. Impressionante como continuava adorável, mesmo com a perda de seus traços infantis. Ainda parecia um anjo, um anjo mais alto e com um corpo tentador em sua definição esguia. E agora Pansy o queria transformar em um anjo do despudor.

Sentei ao seu lado e peguei uma uva. Olhei diretamente em seus olhos cinzentos, de um brilho suave, e mordi lentamente a fruta. Seu olhar se desviou e eu sorri. Senti ímpetos de abraçá-lo e beijá-lo. Ainda sentia uma conexão forte entre nós, um elo que jamais iria se desfazer. Aos poucos eu havia entendido que meu amor por ele era fraternal, especial, puro. Éramos realmente como irmãos, como ele havia dito há muito tempo.

E então, depois de morder uma uva, algo mudou em mim. Eu vi Draco querendo conquistar aquele que amava em silêncio por tempo demais, e quis também conquistar aquele que invadira meu coração sem permissão, derrubando as muralhas defensivas que eu havia construído e trocando-as por algo mais macio, terno e forte. Por vezes, eu me irritava de ter permitido que ele fizesse isso comigo, mas não havia mais volta. Eu estava cansado de sofrer, queria ser protegido e amado em retorno.

"Andrej. O que foi? Você parece distante." Daphne se aproximou e tocou meu rosto, horas mais tarde, quando nos arrumávamos no quarto dela.

"Você acha que eu sou alguém que vale à pena amar?" Perguntei, segurando sua mão e olhando para baixo. Achava engraçado como eu agora era mais alto do que todas as meninas da casa, e também mais do que alguns dos rapazes. Isso me fazia ver como o tempo era implacável.

Ela encarou-me surpresa pela pergunta.

"E por que não seria?" Era uma mania sua sempre responder com outra pergunta. Dei de ombros, voltando a me arrumar. "Você é o rapaz mais bonito desse bordel..."

Era Uma Vez Em VenezaOnde histórias criam vida. Descubra agora