JULHO DE 2019
— Tudo o que eu tô dizendo é que eu pedi uma caneca de cerveja preta – Nadine resmungou em tom de súplica, sem paciência.
— E não foi o que eu trouxe? – a mulher de cabelo rosa e piercing gritou do outro lado do balcão.
Nadine olhou para o dry martini à sua frente e quase soltou um urro, se isso não fosse fazer a defensoria animal bater na porta do seu quarto de hotel na manhã seguinte. Soltar um suspiro foi sua segunda opção.
— Olha, vamos fazer isso menos complicado pra nós duas. Será que você pode, por favor, me trazer uma cerveja preta?
— A gente não vende cerveja preta aqui – A bartender deu de ombros e continuou secando o copo que já estava na sua mão há mais de meia hora.
— Então por que, caralhos, você não disse isso pra mim desde que eu cheguei aqui? – Nadine elevou a voz e bateu as duas mãos no balcão do bar. Sem paciência era eufemismo.
— Ei, ei, ei. O que tá rolando aqui? – Um cara, não muito mais velho que a própria Nadine, se colocou na frente da bartender de cabelo rosa e miolos a menos como se Nadine estivesse de fato prestes a atacar alguém. Cabelo preto, alguns piercings na orelha e na sobrancelha. Olhar conciliador. Ele usava o mesmo avental que a sua protegida.
E então a ficha caiu. Nadine estava gritando com uma pessoa que só queria tentando fazer o próprio trabalho por causa de uma simples troca de drinks. Ela passou as mãos pelo rosto, tentando voltar ao seu estado normal. Era frustrante perceber como ela tinha precisado fazer isso vezes demais recentemente.
— Eu... Olha, eu estou tendo um dia horrível e por algum mau funcionamento do meu cérebro achei que álcool fosse resolver isso de alguma forma, mas sua amiga trocou meu pedido e agora quer me convencer a tomar um dry martini no lugar. O lance é que eu tô cansada de simplesmente consentir pra todas as vezes em que alguém passa por cima dos meus sentimentos e pela primeira vez na vida eu queria sentir que estou fazendo o que eu quero, e não o que os outros esperam que eu queira... mesmo que seja uma merda de uma cerveja preta.
Nadine engoliu em seco. Não era pra ter saído dessa forma.
O segundo bartender fez sinal para a mulher de cabelo rosa, que levou seu copo interminavelmente molhado para atender outra pessoa. Ele se aproximou do balcão, apoiou as duas mãos na superfície e estreitou os olhos para Nadine:
— Isso foi muito, muito específico. Você tá bem?
Nadine abriu a boca para responder no automático que "sim, está tudo perfeitamente bem e eu só quero tomar minha caneca de cerveja preta pra ir embora e viver minha vida perfeitamente boa", mas algo nos olhos dele a fez parar.
— Acho que a última coisa que eu preciso agora é virar chacota pra um bartender de um bar estrangeiro.
— Acredite, eu já ouvi histórias o suficiente pra duvidar que qualquer coisa vinda de você possa me chocar.
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12 horas
RomanceMuito se fala sobre o amor duradouro. É compreensível: no mundo das relações líquidas, em que a moda muda a cada estação e o capitalismo te convence que aquele celular que você dividiu em trinta e seis prestações já não é assim tão legal, as pessoas...