01. Isso e muito mais

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Circuito de Mônaco, Monte Carlo — 23 de maio de 2021

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Tess levou a mão direita até a boca e roeu uma unha de cada vez. Fez a mesma coisa com a esquerda. O choque de seus dentes com as unhas — que estavam prestes a sumir — provocavam um barulho incômodo que despertou o olhar afiado de Verona, sentada em uma cadeira acolchoada posicionada ao lado da que ela deveria estar, mas não estava. Tess sentia-se nervosa e inquieta demais para conseguir ficar sentada. Da mesma forma que sabia que era o ideal, sabia que não era capaz. Precisava extravasar aquelas ondas de ansiedade que percorriam cada pedacinho do seu corpo. 

Poucos minutos haviam se passado desde o momento em que as luzes vermelhas se apagaram e ela já estava fria como um cadáver, suando como se estivesse dentro de uma panela de pressão, com o coração batendo a mil por segundo. Tess e Verona eram muito parecidas, exceto quando se tratava de Fórmula 1, pois enquanto Tess era apaixonada pela velocidade e ficava tão ou mais nervosa do que os próprios pilotos, Verona agia de maneira indiferente. Na verdade, ela nem gostava de todo aquele pão e circo. 

— Sai desse celular, Ronnie. — Tess implicou, olhando para a amiga por cima do ombro. Ela estava mexendo no aparelho desde o início da corrida. — Você está perdendo toda a graça. 

Graça? — Rebateu, o sarcasmo em sua voz quase palpável. Pela primeira vez em uma sequência quase infinita de minutos, Verona levantou o rosto. — Qual a graça existente em ver vinte carrinhos correndo em círculo?

— Você é simplesmente ridícula, lembre-se disso.

— Você nunca me deixaria esquecer, kleine ster

Tess, que permanecia em pé, próxima ao parapeito de vidro que impedia as pessoas de caírem em queda livre, apenas suspirou e voltou sua atenção para a tela presa em uma das extremidades do camarote Vip da Red Bull. Continuava tremendo, controlando-se para não acabar, por impulso, arrancando o cateter nasal como quase fizera assim que os carros saíram dos colchetes de largada. O cilindro de oxigênio, dentro de uma bolsa de rodinhas, também no formato cilíndrico e na cor azul-cobalto e bebê, parado logo ao seu lado, às vezes se movia, por muito pouco não caindo no chão. 

Até então as coisas vinham dando certo para a Red Bull, e ela sentia que aquele dia em especial renderia algo bom. No entanto, na mesma medida em que aquele sentimento bom a alegrava, também a assustava. Tess não estava acostumada a ver as coisas darem certo em sua vida e temia que a sensação de controle que não saía de seu coração fizesse tudo dar errado. Porque, embora o resultado daquela corrida não fosse afetar diretamente a sua vida, afetaria indiretamente, afinal de contas, por mais que ela não fosse Max Verstappen, era amiga de Max Verstappen, da família de Max Verstappen. 

As vitórias e derrotas dele também eram as vitórias e derrotas dela. 

E talvez, fosse por isso que ela estivesse ali, e não em sua casa, na Holanda. Há dias Tess vinha sentindo um aperto no peito. E não era um aperto comum, como o que ela sentia quando o ar faltava severamente, mas sim muito estranho. Tão estranho que a fez sair de Amsterdã em um carro e passar horas na estrada para chegar no caótico e suntuoso principado de Mônaco. E Verona, por mais que odiasse a ideia de passar quase uma semana rodeada por fãs de corrida e ouvindo o ronco dos motores, esteve com ela em todos os momentos.

Ela nem sequer conseguia cogitar a ideia de deixar a melhor amiga viajar para tão longe desacompanhada. Sim, Tess era uma mulher e tanto, tinha vinte e dois anos, era linda, inteligente e havia se formado com honrarias em medicina veterinária, mas Verona sabia que ela não podia ficar sozinha. Não só não podia, como não queria, mesmo que não abrisse a boca para confessar isso. 

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