Ana acordou suando frio em sua cama, como se aquele sonho fosse real. Sentou-se para respirar e começou a apalpar os móveis para ter certeza de que agora estava em seu quarto e só se acalmou quando viu que tudo voltara ao normal.
Aquele era o quarto das meninas, grande o suficiente para acomodar três beliches e um guarda roupa com seis portas muito feias e cheias de adesivos. O beliche de Ana ficava encostado na parede do canto direito, do lado da janela, e ela dormia na parte de cima. Achava que esse era o lugar mais privilegiado do quarto, pois era só sentar na cama, abrir a janela e daria para passar a noite toda admirando a lua e as estrelas sem incomodar as outras garotas.
Faltavam apenas doze minutos para meia noite e Ana completaria quinze anos assim que o dia 22 de novembro começasse, mas o seu aniversário não fazia muita diferença para o resto do mundo. Tudo continuava igual. Ela crescera em um lar para crianças carentes, nunca conhecera seus pais e recebia ajuda financeira de um estranho que nunca quis se identificar. A única especificação que ele estipulou foi para que o dinheiro fosse usado em sua educação.
Para muitas pessoas isso seria ótimo, e ela realmente sabia que era um privilégio, aliás, educação é tudo, mas por outro lado, estar cercada todos os dias por um bando de ricaços que tiram sarro de suas roupas e sua pobreza não é como achar o pote de ouro no final do arco-íris. Muitas vezes ela imaginava como seria legal ter dinheiro e talvez a primeira coisa que faria seria melhorar a vida de muita gente, como as crianças do Lar, por exemplo.
Não conseguiu adormecer novamente. Aquele sonho foi realmente perturbador. Já tivera outros sonhos, é claro, mas algo sobre aquelas duas visões lhe pareceu muito real. Horas depois começou a ouvir a comum barulheira matinal do dia a dia no Lar.
— Nunca mais vou assistir "Guerra nas Estrelas” — pensou Ana em voz alta.
— Bom dia galerinha, parabéns Ana! — Falou tio Mario em voz alta. — Eu sei que você tem que correr para pegar o seu ônibus, mas eu quero que você saiba que hoje no cardápio temos pão assado com café com leite em sua homenagem! Quem vai querer?
Tio Mario, ao contrário de tia Lua, era bem magrela, quase careca, pele negra, em resumo, um homem muito bom, sempre alegre. Ele trabalhava de pedreiro e não era um dos melhores, vira e mexe vinham reclamações de coisas que ele não consertou muito bem, como a laje da Dona Salmira, que sempre está vazando, ou o muro do senhor João, que podia até derrubar a coisa toda se alguém encostasse nele!
— Tio, é só isso que a gente come todos os dias no café! — Falou Tatuzinho.
— Isso mesmo, Tatuzinho! E não é uma delícia? — Respondeu tio Mario.
Tatuzinho tinha cinco anos de idade e era o garoto mais novo do Lar. Seu verdadeiro nome era Diego, mas ele era tão minúsculo e quase sem pescoço que logo o apelidaram de Tatuzinho.
— Tio, não liga para ele, a comida está uma delicia! Parabéns Ana! — Falou Tamara, uma garota de dez anos de idade.
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A Princesa de Jamar
FantasiFaltavam apenas doze minutos para meia-noite e Ana completaria quinze anos assim que o dia 22 de novembro começasse. Ela não conseguia esquecer o sonho esquisito, no qual tinha sido transportada para um lugar estranho, onde pessoas voavam, o pior, é...