Capítulo Doze

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ELENA


"O tempo não voa, é como se eu estivesse paralisada por ele; eu gostaria de ser eu mesma novamente, mas ainda estou tentando encontrá-la (...)" — Taylor Swift, All Too Well.

Olivia escolhera algumas músicas da Kacey Musgraves para tocar durante o trajeto de volta para casa, e havia algumas músicas favoritas minhas como "Golden Hour"; porém, momentos antes, na saída do aeroporto, enquanto checava as minhas redes sociais, me deparei com um anúncio feito pela Taylor sobre o lançamento da regravação do álbum "Red". Involuntariamente, as minhas lembranças me levaram direto à música "All Too Well" e eu me vi no cenário onde a letra dessa canção tinha o papel de sal e limão sendo despejados sobre a minha ferida. Assim que entrei no carro, coloquei os meus fones de ouvido e revivi a letra de "All Too Well" em um verdadeiro modo repeat. Revivi não por estar sofrendo, não por estar em um estado semelhante ao da Taylor quando escreveu essa música, mas, sim, infelizmente, por me encontrar do outro lado: no papel de talvez isso fosse uma obra-prima até... eu rasgá-la por completo! Sei que a minha relação com o Ben não era perfeita, que nós dois não éramos perfeitos, que tínhamos os nossos defeitos e que reagíamos diferente defronte determinadas situações; no entanto, eu, na maioria das vezes... nossa, se pensar sobre isso é cruel, imagina admitir em voz alta?! No entanto, eu, na maioria das vezes, acabei sendo... hipócrita. Sim, hipócrita! Quem diria que eu, logo, eu, me tornaria a rainha da hipocrisia? Tantas vezes quis ser compreendida por alguém, quis ser abraçada nos meus momentos de vulnerabilidade e quis que a abraçassem, também; por tantas vezes quis estar ao lado de uma pessoa que realmente me aceitasse com toda a carga emocional e o sentimentalismo que passei a carregar, com as minhas inseguranças, os meus medos, as minhas falhas... e, então, num belo dia, encontrei. Encontrei e me afobei. Descarreguei sem ao menos observar se o limite da carga havia excedido. A ânsia por jogar fora todo aquele peso horrível cegou os meus olhos e o meu coração. Quando me deparei com alguém no mesmo estado — ou pior —, que o meu, inconscientemente, tornou-se doentio, para mim, que alguém fosse um pouco mais emocionalmente instável e ferrado do eu estava acostumada a ser. Portanto, aos meus olhos, nada já não era mais saudável.

É bem verdade que talvez já não fosse mais saudável, não estivesse àquela altura, mas quem raios sou eu, na fila do pão, para julgar o que é saudável ou não para alguém quando eu mesmo, Elena, já passei por momentos de instabilidades quase similares aos dele? Afinal de contas, quem nunca, pelo menos uma vez na vida, já se enxergou no papel de dependente emocional em um relacionamento, seja ele qual for o tipo? Pois é, Taylor Swift: "I'm a crumpled up piece of paper lying here 'cause I remember it all, all, all... too well"!

Ao chegarmos em casa, desci do carro um pouco desorientada enquanto mamãe retirava a minha bagagem do porta-malas. Olhei ao redor procurando o carro do Austin, mas, decerto, ele e o papai devem ter parado em alguma lanchonete para comer. Olivia aproximou-se e me abraçou de lado, caminhando junto comigo em direção à varanda; era como se absolutamente nada nesse lugar houvesse mudado. Era como se eu nunca tivesse partido.

Quando entramos, tirei as minhas botas pretas de cano curto e deixei-as na entrada perto do cabide dos casacos, direcionando-me ao sofá e jogando-me no meio das almofadas. Fechei os olhos e respirei fundo, trazendo à minha mente todas as boas lembranças vividas nesse lugar.

— Do que mais você sentiu falta daqui, Leninha? — Olivia perguntou enquanto se aproximava.

— De você e da mamãe, é claro! — Sorri.

Além de mim e da mamãe, é claro... — Balançou a cabeça, com os olhos revirados por diversão.

— Ah, Via... — Encolhi os ombros ao suspirar — senti falta da cidade, dos meus amigos, de cada lugarzinho especial, de tudo o que vivi nos últimos tempos, sobretudo com vocês. Mas, principalmente, senti falta de me sentir em casa... do lar!

— Como está sendo viver com o papai depois de todos esses anos? — Olivia se ajoelhou ao meu lado, deleitando a cabeça sobre a minha barriga.

— Tem sido a melhor experiência da minha vida. — Automaticamente um sorriso indelével se formara nos meus lábios. — Ele ressignificou a minha ideia de recomeço, e juntos passamos a escrever o novo capítulo da nossa história, vivendo em um âmbito de amor, amizade, e aprendendo a perdoar, todos os dias, um pouquinho mais. — Declarei enquanto enrolava no meu dedo alguns fios do seu cabelo castanho. — O perdão é gradativo, Olivia, e ele deve ser honesto: tanto consigo quanto para com o outro. Recomeço e perdão caminham lado a lado, com as mãos entrelaçadas, sendo praticamente dependentes um do outro para prosseguirem.

Olivia permaneceu alguns momentinhos em silêncio, pensativa, ao passo que mamãe entrava com a minha bagagem e gesticulava que iria levá-las ao andar de cima.

Assim que mamãe subiu, Olivia perguntou:

— Se recomeçar e perdoar estão juntos na mesma via, isso significa que há esperanças para você e o Ben?

A pergunta da Olivia me pegou de surpresa de uma tal maneira que eu, francamente, não esperava. Abri a minha boca, mas nada saiu. Fiquei estática. Por um instante, a resposta para aquela pergunta não existia na minha cabeça.

— Quero dizer, — Ela prosseguiu, afastando-se um pouco e virando a cabeça na minha direção — já que agora você está aqui, se vocês conversarem direitinho, não acha possível que possam... recomeçar? — Os olhos castanhos cintilavam, agarrados à uma expectativa que eu seria incapaz de nutrir, ainda que houvesse uma mínima faísca de esperança.

— Via, — Sentei-me no sofá e endireitei o meu corpo — sinto muito, mas eu não tenho uma resposta para a sua pergunta, sobretudo a que você tanto deseja ouvir da minha boca nesse momento. — Olivia suspirou e desviou o olhar. — Estive longe por um período significativo e não mantive contato com ele durante esse tempo na Califórnia. As coisas já não são mais como costumavam ser antes mesmo que eu partisse, e acho que você lembra disso. Não foi fácil para nenhum dos do...

— Não, Elena! — Olivia interrompeu-me, balançando a cabeça negativamente. — Sinto muito em discordar da sua fala, mas não a complete. Por favor, não faça isso. Sejamos honestas: seria um pouco de hipocrisia da sua parte dizer que para você foi difícil assim como foi para ele, porque não é verdade.

— Olivia, mas por que dizes isso? — As minhas sobrancelhas se uniram, confusas e ao mesmo tempo atentas para a declaração que estaria por vir.

— Elena, você se mudou para a Califórnia e foi estudar na universidade dos seus sonhos, de quebra, ainda foi com o papai: a pessoa que você tanto, tanto, tanto quis ter na sua vida novamente. — Antes que eu tivesse a chance de responder, ela disparou —: A despeito de absolutamente tudo o que aconteceu, você saiu no lucro com tudo o que queria. Mas, ele? O Ben? — Olivia mordeu o lábio inferior que, agora, estava trêmulo. — Ele viveu um verdadeiro inferno emocional tentando seguir em frente. Foi demasiadamente doloroso. — Piscou os olhos rapidamente no intuito de afastar algumas lágrimas. — Veja bem, não me entenda mal, eu não estou menosprezando os seus sentimentos por ele e jamais faria isso, pois sei que, apesar de tudo, eles são bons e verdadeiros. No entanto, perdoe-me, não consigo aceitar que você abra a sua boca para me dizer que também foi difícil, que sofreu com a falta dele ou seja lá o que você fosse falar logo em seguida, quando, na verdade, durante todo esse tempo, você estava vivendo the time of your life!

FINE LINE: Do Outro Lado Da Linha | LIVRO #2Onde histórias criam vida. Descubra agora