Em Família

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Saí de casa logo cedo e, pela respiração alta que escutei no meu quarto assim que despertei, Calvin ainda estava dormindo. Dirigi até a casa dos meus pais. Não havia telefonado ou deixado qualquer aviso, apenas achei que necessitava de um domingo em família, como todos os outros.Talvez a sensação de normalidade fosse o meu melhor remédio. Tive a certeza de ter feito a coisa certa quando encontrei os meus pais, a minha avó e os meus irmãos sentados ao redor da mesa para o café da manhã. Eles quase não acreditaram quando me viram (mamãe arregalou os olhos e a minha avó, que normalmente é bem lenta, ergueu-se da cadeira em questão de segundos). A recepção foi calorosa. Os beijos e abraços vieram de todas as partes. Não demorou muito até que a confusão foi instalada; todo mundo falando alto e de uma vez só.

Eles jamais mudariam.

Fui obrigada a narrar cada detalhe da minha semana. Claro que não falei nada sobre a loucura com a Calvin, porém me percebi comentando sobre ela (também omiti o fato de a minha vizinha ser muito da gostosa e igualmente safada) quando o papai perguntou se eu tinha feito alguma amizade no bairro. Infelizmente, a ideia de todos irem me visitar foi levantada em algum momento. Precisei enrolar, dizendo que não estava pronta para receber visitas, mas claro que ninguém me deu bola.Marcaram um almoço para o sábado seguinte sem ao menos perguntarem se eu estaria disponível. Bom, pelo menos havia sido um almoço. A Calvin provavelmente sairia para o trabalho, e todos iriam embora antes de escurecer. No fundo, eu não queria que ninguém a conhecesse. Seria muito desconcertante. Minha família já era doida, visualizá-la em convivência pacífica com outra doida  ou seja, a Calvin, não me passava pela cabeça. Tenho certeza de que se juntariam para falar sobre mim daquele velho jeito chato de quem não tem o que comentar, então descobrem um assunto em comum (que no caso seria eu) para falar as mais diversas besteiras. Uma merda completa.

Além de tudo, eu não queria que a minha irmã conhecesse a minha vizinha. Lexie chega a ser pior do que a Calvin. Sério, a doida é muito safada. Tenho certeza de que se atiraria em cima da sujeita. Sabendo que ela não é nada seletiva, com certeza daria em merda. E antes que ela fosse feita, eu não teria coragem de contar para a Lexie que a Calvin Klein já tinha "dona". Quero dizer, não sou dona dela, mas a minha irmã não pode ficar com uma pessoa que fiquei e que por acaso é a minha vizinha, certo? Seria no mínimo muito esquisito. Só de pensar nisso o meu estômago dava reviravoltas. Passei o dia inteiro com eles. Almoçamos no quintal, como sempre, e depois cada qual foi fazer o que mais gosta; Lexie saiu com as amigas, Christopher foi andar de skate (alegando que iria jogar videogame no vizinho, mas eu o conheço muito bem), papai foi ler o jornal e mamãe foi à missa com a vovó. Acabei indo com elas. Não me considero tão religiosa assim, mas gostava de ouvir a "palavra" às vezes. Sentia-me reconfortada durante toda a semana quando ia à missa aos domingos. E foi assim que me senti quando saí de lá; acho que Deus abriu a minha mente e me disse para me manter tranquila. Pensei em voltar para casa, mas a minha mãe exigiu a minha presença no jantar. Ela é muito mandona, vocês não fazem ideia. Na verdade, estava acostumada até demais a mandar em mim, só que daquela vez fiquei porque quis. Enquanto eu a ajudava a cozinhar, pensei muito sobre isso. Cheguei à conclusão que, no fundo, a minha mãe sempre me mandou fazer o que precisei. Nem sempre foi o que eu quis, claro, mas essa é a função das mães. Se eu não tivesse sido educada deste modo, certamente não saberia diferenciar o que é bom ou ruim para mim. Ela havia cumprido com o seu dever muito bem. Um filho que não obedece aos pais acaba desobedecendo às regras, às leis e à própria ética... A obediência, por mais chata que seja, é um fator necessário para o bom desenvolvimento de qualquer um.

O jantar estava divino. Senti-me orgulhosa por ter ajudado a prepará-lo. Vovó ainda decidiu fazer pudim de leite para a sobremesa, e claro que logo me lembrei da Addison. A hora da divisão do doce foi uma loucura. A discórdia era instalada na minha casa sempre que havia a presença de alguma coisa muito gostosa para ser compartilhada. Isso jamais mudaria, pelo visto. Depois que consegui me servir do pudim, tentei desvirtuar os meus pensamentos enquanto lambia a minha própria colher, mas devo ser muito idiota mesmo. Definitivamente, havia mudado muito. Lexie  acabou percebendo o meu comportamento estranho.

A Safada do 105 - Meddison (HIATUS)Onde histórias criam vida. Descubra agora