Constelações

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Ariel

Dei uma última olhada no desenho mais recente que havia feito antes de enfiá-lo na gaveta, junto aos seus semelhantes. Mesmo depois de anos, não conseguia me livrar daquelas imagens.

Na última mensagem que Abel me enviou, disse estar indo pra casa com o robô, então eles já deviam ter chegado àquela altura. Ele me falou para a visita ficar para o dia seguinte, mas meus nervos não me permitiam ficar em casa esperando; queria conhecê-lo logo, enquanto tinha coragem.

Foi difícil prestar atenção na estrada, porque minha mente vagava por memórias que pensei ter enterrado, mas agora, indo conhecer Joaquim, mesmo depois do meu irmão quase ter perdido todas as esperanças naquele projeto, algumas coisas vinham à tona novamente.

Mesmo assim, o que predominava em meus sentimentos era a expectativa. Não sabia ao certo o que esperava, mas meu coração não me deixava mentir.

Aquele sentimento que estava adormecido há tanto tempo agora martelava em minha mente. Eu sabia dos riscos. Sabia que podia ser uma péssima ideia, mas que eu iria arriscar apesar de qualquer circunstância.

O que me atormentava era o sonho da noite anterior. Foi a primeira vez que ouvi aquela voz em meus sonhos e isso me fez mudar de ideia. Eu só queria vê-lo. Só isso. Eu precisava, ou minha mente não me deixaria em paz.

O caminho até a casa de Abel parecia esticar-se o máximo possível naquela tarde. Quando finalmente cheguei, fiquei parado no jardim, em cima da moto, perguntando-me se deveria dar a volta, ir a um barzinho qualquer e tentar afogar a ansiedade no álcool, mesmo aquilo não sendo do meu feitio.

Mas já tinha reunido coragem o bastante para ir até lá, então desci da moto e fiz o percurso até a varanda, tentando ignorar o pulsar forte em meu peito.

Ao chegar me deparei com um Abel claramente esgotado. Ele me olhava com uma expressão que eu conhecia bem, aquela que dizia algo como: "eu não vou admitir, mas precisava mesmo de você aqui".

Meu irmão sempre foi assim, nunca pede nada a não ser que seja questão de vida ou morte; acho que nós dois puxamos esse orgulho inútil do nosso falecido pai.

De qualquer forma, sabia que ele estava feliz por me ver ali, apesar de conhecer as razões pelas quais ele não queria que eu fosse.

Abel provavelmente iria se fazer de durão, mas com aquele cansaço aparente, ele logo se enfiaria no escritório e dormiria ali mesmo, por cima do computador e das pilhas de papel. E sabia que só havia um jeito do meu irmão descansar tranquilo naquela noite: sabendo que alguém estava de olho em Joaquim.

Principalmente se esse alguém fosse de sua confiança. Mas claro, não era só por isso que eu estava ali. Aquela noite era o desfecho de um sonho cultivado desde que eu era menino. Eu esperei muito por esse dia sem saber que estava esperando. Até estar ali.

O momento em que vi Joaquim Aster pela primeira vez foi muito singular. Poderia ter acreditado que era apenas mais um sonho se não tivesse me beliscado disfarçadamente algumas vezes.

Ele era real. Estava ali, bem na minha frente, se movendo, falando, vivendo...

Tentei disfarçar a tremedeira que tomou conta de mim quando ele falou. Eu ouvi sua voz. Era igual a voz do meu sonho. Como isso era possível? A minha mente não encontrava respostas razoáveis e isso teria me deixado nervoso a noite toda.

Teria. Se eu não tivesse me sentido tão bem perto dele. Não sei como isso podia acontecer, mas em certo momento, me esqueci dos sonhos. Das minhas preocupações sobre ele. Me esqueci que ele não era humano.

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⏰ Última atualização: Jul 08, 2021 ⏰

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