Eu estava mais do que decidida de que iria fugir.
Eu precisava disso tanto quanto respirar, mas não suportava a ideia de ter que abandonar minha família. E foi com esse pensamento que uma ideia surgiu em uma cabeça. Nada mudaria e eu não seria perseguida, se eu morresse.
Aquela foi a ideia mais brilhante que tive em tempos e eu ficava fascinada a medida em que as imagens passavam como um flash na minha mente. Era de manhã e eu não sabia quando iria ver Sebastian novamente, mas aguardava ansiosamente por esse dia.
Victor começou a suspeitar da minha euforia toda, mas não disse nada ou sequer questionou sobre, ele era meu melhor amigo, e sabia disso, me conhecia como ninguém e me doía muito ter que esconder minhas ideias dele quando o que eu mais queria era lhe contar. Mas havia sim um motivo para que eu não contasse a ele: Victor era um péssimo mentiroso.
Tudo que tivemos que fazer nesses três anos juntos era com muita cautela para que ninguém descobrisse nosso falso casamento. Para que não nos questionassem nada a ponto de termos que mentir, eu era boa nisso, mas qualquer um poderia sentir o falsíssimo tom que Victor elevava sua voz quando o fazia, sem contar na tremedeira e o suor frio. Era impossível para ele mentir de modo acreditável.
Apesar de saber que eu o escondia algo, o homem que eu chamava de marido sabia mais que bem respeitar o meu espaço.
— Como foi no trabalho? – perguntei apenas por costume, enquanto jantávamos à mesa.
— Cansativo, eu trabalho o dia inteiro para receber uma mixaria – suspirou pesarosamente – sinto muito Milli, talvez eu não consiga juntar dinheiro o suficiente para te dar algo em seu aniversário.
"Fique tranquilo Vic, não pretendo estar aqui até lá" não pude deixar de pensar, me sentindo mal por ter que deixá-lo.
— Está tudo bem – pus minha mão em cima da sua, sobre a mesa – sabe que não sou muito fã de datas comemorativas.
Era verdade, eu detestava as datas comemorativas desde pequena, talvez por crescer vendo a maioria das pessoas não terem dinheiro nem para uma refeição decente, quem dirá para comemorar alguma coisa. Vic amava essas datas, o fazia lembrar que estávamos vivos – apesar das condições deploráveis – e que mais um ano havia se passado, revelando um pouco mais o fim daquele inferno. Eu questionava se ia mesmo ter um fim.
— Ano que vem eu prometo de dar algo bem bonito - sorriu doce e triste. Retribuí seu sorriso, não contendo o aperto no peito por saber que para ele eu estaria morta.
Alguns dias depois, eu fui até a colina, o cheiro das árvores e plantas e a coloração verde e marrom estavam por todos os lados. Eu havia pedido para que Victor avisasse Sebastian que estaria aqui, e não tardou para que eu sentisse seus passos duros e pesados se aproximando.
— Soube que queria me ver – sua voz grossa estava amena.
— Claro que sim, você é meu amante, não? – meu humor só estava passível a brincadeirinhas quando eu tinha alguma notícia terrível para dizer.
Sebastian sabia muito bem disso, tanto que pude ver seus músculos enrijecerem e sua respiração ficar mais lenta, preocupado.
Ele não era o maior fã de piadas.
— Sabe que não gosto disso, o que foi? – direto como uma flecha.
— Eu não aguento mais – falei num fio de voz.
— Faz tempo que você diz isso, qual a novidade? – ele estava começando a ficar irritado.
— Vou fugir! – apesar do tom de voz baixo, minha fala estava carregada de certeza.

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Cosmos Laranja
ActionQuando se vive em um mundo onde a liberdade não existe, morrer parece ser a opção mais fácil. Uma válvula de escape. O que seria de nós se não fosse aquelas pessoas que escolhem pela opção mais difícil? Sobreviver e lutar. Precisamos do tipo de pess...