2 • Traga o imprevisto de volta

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Eu acordei ao som da minha campainha alta e melodiosa. Levantando as pálpebras pesadas, minha visão foi ofuscada por raios de sol entrecortados pelas cortinas da varanda e percebi que ainda estava no sofá, torta e dolorida. Eu alcancei meu celular para checar a hora, mas o achei descarregado. Suspirando, larguei o aparelho e esfreguei as mãos no rosto, implorando que tudo fosse um pesadelo. Contudo, a realidade invadiu minha mente com mais um toque da campainha.

Eu bufei e relutantemente me pus de pé. Quem quer que fosse, parecia empenhado em tocar a campana repetidamente até que eu atendesse. Eu cambaleei até a entrada e, por um momento, quis acreditar que abriria a porta e encontraria Benjamin lá, arrependido da sua decisão... quis acreditar que encontraria meu pai no batente, vivo e saudável...

Quis voltar no tempo e ter minha vida de volta.

Entretanto, apesar das minhas súplicas fervorosas, nenhum dos meus desejos foi atendido quando, girando a maçaneta, eu me deparei com o rosto aflito de Lila.

— Ah, aí está você!

Antes que eu pudesse reagir, os braços de Cordelia estavam ao meu redor e seu corpo muito alto embalou o meu. O cabelo ruivo dela se espalhou por meu rosto e seu cheiro adocicado de framboesa e flores cerceou meus sentidos. Então, tão rápido quanto havia me abraçado, ela se afastou e segurou meus ombros, me encarando.

— Pelos céus! Você quer me matar do coração, Mys? — resfolegou, os olhos preocupados. — Eu te esperei para almoçar por quase uma hora e você não apareceu, não atendia às ligações e nem respondia às mensagens. Eu já estava totalmente nervosa.

Droga, minha mente suspirou. Imersa em minha ruína, havia esquecido completamente do meu compromisso com Lila. Já passava da hora do almoço e eu dormira por mais de doze horas, anestesiada da realidade.

— Meu Deus... me desculpe. — Eu suspirei, esfregando as mãos no rosto e me afastando em passos lentos até recostar na ilha da cozinha, exatamente onde Benjamin estivera na noite anterior. A memória fez meus ombros retesarem.

— O que aconteceu, ein? — Lila parou diante de mim com os braços cruzados e inclinou-se até que seus olhos verdes estivessem na altura dos meus. — Seu rosto... estava dormindo ou chorando?

— Os dois — confessei, o choro embolando na garganta junto a um soluço. Respirando fundo, eu despejei sem mais delongas: — Benjamin terminou comigo ontem.

Incapaz de conter as lágrimas, tudo que vi antes de deixá-las cair foram os olhos arregalados e o rosto incrédulo de Lila. De tão perto, a surpresa transpareceu através das suas feições como se elas fossem de vidro, me fazendo desviar o olhar. Encarando meus pés em silêncio, eu dei alguns passos na direção do sofá e me sentei, apoiando os cotovelos nos joelhos e correndo as mãos pelo cabelo.

— Eu sinto muito. Eu... eu nem sei o que dizer, estou tão surpresa. — Ela murmurou, parecendo sopesar cada palavra. — Como isso aconteceu?

— Lembra daquela proposta de emprego em Flungton? — Lila assentiu. — Bem, foi isso: ele a aceitou. Benjamin vai se mudar e não acha que funcionaremos à distância quando estou nesse estado. Não que ele realmente tenha motivos para tentar, porque eu sei que tem sido difícil estar comigo nesses últimos dias e...

Não. — Lila interrompeu bruscamente. Vindo até mim, ela acocorou-se na minha frente e segurou meus ombros outra vez. — Não vou deixar que faça isso, que se culpe dessa forma. Não há nada de difícil em estar com você, Mys. Nada. Você está triste e de luto, mas isso não muda quem é. Se Benjamin Dolan é um babaca que não consegue ver isso, não é sua culpa, entende?

Trago Seu Amor de VoltaOnde histórias criam vida. Descubra agora