16 • Traga o alvo de volta

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Eu acompanhei com os olhos enquanto a primeira flecha veloz de papai acertava precisamente o centro do alvo. Sentada na grande varanda lateral da casa, com uma xícara de chá em mãos, eu mal conseguia desviar os olhos da competição de arco e flecha que os três parlamentares travavam, rindo e apostando. Aquele não era um esporte que eu estava esperando presenciar, mas admitia que estava gostando. Sentada ao meu lado, Lila conversava sem parar com os dois outros hóspedes mais novos. Eles entrariam apenas na segunda metade da competição e concorreriam com o vencedor dos mais velhos.

Acima de nós, o sol da tarde pairava ameno e confortável, esquentando nossas peles enquanto uma brisa fresca equilibrava o calor. No campo de competição — que nada mais era que a própria charneca —, Benjamin preparava-se para seu segundo lançamento. Ele estava lindo sem o fraque e com as mangas da camisa arregaçadas, seus olhos e cabelos castanhos brilhando quase como âmbar no sol. Se ainda não estivesse brava com ele pelo ataques de ciúmes da manhã, me permitiria observá-lo por mais tempo que a etiqueta e o decoro de 1898 permitiam.

— Então é mesmo verdade que o senhor é um viajante nato, lorde Chapmont? — Cordelia perguntou, me tirando dos meus pensamentos sobre Ben.

A minha distração havia me dissuadido da conversa sobre a viagem de lorde Chapmont e de Harold à Itália, mas eu logo voltei a me concentrar. De soslaio, vi quando Aaron sorriu e bebericou rapidamente do seu chá. Ele também não vestia fraque ou gravata, apenas uma camisa branca e colete, assim como os outros. Estavam todos prontos para o arco e flecha, inclusive Cordelia e eu. Sabendo com grande alegria que também poderíamos competir, nós colocamos vestidos leves, sem as golas altas e as silhuetas perfeitamente ajustadas. Mesmo o espartilho pudera ser mais folgado que o habitual.

— Se assim prefere chamar, senhorita, digo que sim. — Lorde Chapmont respondeu, um sorriso saudoso em seu rosto. — Realmente gosto bastante de viajar. Na verdade, quem não gosta? Não há nada mais satisfatório do que desfrutar de outras culturas e belos lugares.

Eu não falei, mas em minha mente, concordei com o lorde. Lembrava da época da universidade, quando Lila e eu arranjávamos destinos aleatórios e pegávamos a estrada sem pensar muito. Depois da graduação, esse costume fora um pouco perdido e, como Benjamin não era adepto de longas viagens e ficava muitíssimo magoado quando eu viajava sem ele, havia estacionado minhas aventuras.

— Qual foi o último lugar que visitou? — Me peguei perguntando num impulso, as palavras escorregando da boca.

Lorde Chapmont pareceu um pouco surpreso por meu questionamento no início, talvez porque eu havia estado bastante calada o tempo inteiro desde a discussão com Ben no corredor. Contudo, se recompondo depressa, ele sorriu e respondeu prontamente:

— Paris, no mês passado.

— E gostou? — perguntei novamente. Nunca havia ido a Paris e estava curiosa.

— É impossível não gostar, milady — Ele disse gentilmente. — A capital francesa só fica cada vez mais bonita, apesar de ainda ter pontos de reforma. Tenho certeza de que será o destino dos sonhos de muitos em alguns anos.

Sim, será, pensei, e especialmente naquele momento, a sensação de saber de coisas que ainda aconteceriam foi estranha. Eu estava sentada num vestido de chá em 1898 e o sentimento de que não pertencia àquele lugar me atingiu de súbito, me fazendo engolir em seco. Tentando manusear a sensação, eu logo me concentrei no meu chá e nas pessoas ao meu redor. Se parasse para pensar demais o quanto era absurdo e impossível tudo que estava vivendo, enlouqueceria.

— Já sabe qual será seu próximo destino? — perguntei a lorde Chapmont e bebi do meu chá, sentindo o gosto doce e amadeirado acariciar meus sentidos.

Trago Seu Amor de VoltaOnde histórias criam vida. Descubra agora