Memórias

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Narradora

Priscila preparava o café da manhã na cozinha, havia comprado granola e iogurte para Elly, lembrou que a filha andou reclamando das últimas refeições matinais tão gordurosas. Porém, não conseguiria entrar naquela dieta saudável, decidiu por fazer waffles e uma porção pequena de ovos mexidos e bacon para ela mesma. Mal os ovos estalaram na frigideira com óleo quente, ouviu barulhos vindos do andar de cima, olhou com uma careta para o teto, como se aquilo fosse fazê-la adivinhar o que estava acontecendo.

Uma pancada alta, Pri se encolheu como se o teto fosse ruir em sua cabeça, largou os talheres e tudo mais, correu escada acima, o único corredor parecia extenso demais. Mais algumas batidas, seu coração acelerou ao perceber que aqueles sons eram do quarto de Any. A mulher tremeu nas bases, abriu a porta com um cuidado maior que no normal, e quando uma fresta se fez, ela pode enxergar a sombra de sua filha na penumbra do quarto.

*

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- Mãe? - Noah estava apressado para o trabalho, catando suas coisas ao longo do percurso, ao mesmo tempo em que ajeitava a gola da camisa um tanto amassada.

Um bilhete na geladeira lhe dizia que Wendy não almoçaria em casa, aliás isso andava acontecendo com muita frequência, ele já estava começando a achar aquilo suspeito. Deu um suspiro forte antes de engolir seu café em pé mesmo, Sina ainda dormia e ele não fez questão de acordá-la, o humor de sua namorada não era dos melhores ultimamente. Voltou seus pensamentos para a mãe, já nem sabia qual a última vez que sentaram juntos à mesa. Um baque alto lhe fez balançar a xícara em suas mãos, ele olhou pela janela da cozinha, mais alguns barulhos se seguiram e ele tinha quase certeza que eram advindos da casa ao lado.

Deixou a refeição intocada e correu para a casa vizinha.

*

*

Priscila cobriu a boca com uma das mãos ao ver a filha. Any arrancava o papel de parede com violência, respirava tão forte que era perfeitamente audível para Pri. Any não pareceu notar sua presença, ela pegava todo e qualquer objeto pelo caminho e o atirava na sacada, a gastura da parede aparecia por entre os rasgos do papel cor de rosa com listras brancas. Pri deu alguns passos desajeitados até a garota, não se conteve quando Any pegou dois livros que o pai havia lhe dado quando criança. A mulher segurou seus ombros, Any tinha os olhos injetados, olheiras roxas eram visíveis, Pri ficou apavorada com a fúria nunca antes vista naquele olhar.

- Any? - Ela perguntou trêmula.

- Eu lembro. - Pri bambeou, seu corpo perdeu as estruturas. - De tudo. - Os olhos da filha estavam saltados, as sobrancelhas franzidas.

Priscila soltou a garota com espanto repentino, enquanto Elly atirava mais coisas pela varanda, desvairada, desnorteada demais com o que havia em sua mente.

Priscila correu aos prantos do quarto, sabia que um dia isso poderia acontecer, mas não estava preparada para tal. Pegou o telefone e saiu de casa olhando para as teclas, ao lado da casa as coisas voavam do quarto de Elly, Pri deixou o telefone cair, na segunda vez em que ele foi ao chão, um par de mãos masculinas o juntou depressa.

- Ah meu Deus Noah, muito obrigado. - Pri discou algum número, tendo que apagar e rediscar algumas vezes por conta do nervosismo.

- Pri o que é isso? - Noah observava aquilo sem entender, ele sabia que aquele era o quarto de Any, mas sempre achou a garota tão calma e centrada.

- Só um momento. - Sussurrrou para o rapaz, que mantinha o olho focado na pilha de coisas que se acumulavam na lateral de ambas as casas. - Milena? Sim, Priscila Soares. - Noah ouvia atentamente a conversa. - Ela lembrou. - Um tempo curto de silêncio, Noah se perguntou, quem lembrou o quê? - Sim por favor.

born to me | noany Onde histórias criam vida. Descubra agora