o dia do recomeço

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Ainda era primavera nos quatro
Mundos, mas tudo fluía como se fosse outono. Enquanto escolhia as palavras certas para a conversa iminente e preparava seu espírito para outra nova Missão, Amarillion caminhava por entre as árvores alinhadas, que formavam a alta copa e fechavam o longo caminho à sua frente.

A barra de seu vestido branco levava flores e folhas que, há tão pouco, haviam se desprendido das árvores. Seu pálido semblante ─ belo, mas triste e preocupado ─ e seu níveo cabelo longo faziam destacar os olhos de azul intenso e os lábios rosados, tão rosados quanto às longas e pontudas orelhas.

No fim do caminho, o enorme Salão
circular se abria, do qual a abóbada vitrificada desenhava o alto teto. Quando diante da grande cápsula cilíndrica, disposta no ponto central do singular ambiente, a Entidade viu surgir, por entre o espesso e viscoso líquido furta-cor, o outro ser semelhante. Desde que a viu adentrar o salão, não desviou os olhos dela ─ já conhecia aquele semblante e aquele cansado caminhar.

Por trás da notável preocupação, contudo, ela o fitava com a mesma ternura, ansiosa por poder senti-lo outra vez. Mesmo em seu enclausuramento, ele podia perceber seu amor, sua ânsia, podia vê-la e ouvi-la, até mesmo sentir suas carícias toda vez que ela tocava a cápsula. Seus sentimentos eram recíprocos e o foram desde que ele nasceu. Amarillion estava sempre presente; ele nunca questionou sua condição. Mas o que eram aqueles sentimentos diante das Missões?

─ Hoje é o dia do recomeço. ─ sussurrou-lhe, após tocar a cápsula com a mão direita ─ Laucian e eu já temos tudo preparado.

─ Laucian? ─ estranhou a atípica frieza.

─ O Segundo Guardião chegará ao Mundo dos Vivos ainda hoje, durante a noite.

─ Sim, eu também recebi o sinal.
─ Por isso, está tão receoso?

─ Outro recomeço… Por que eu não estaria?

─ Acalme seu coração, Itilus… ─ adiantou-se amavelmente ─ O Sol já se põe e próximo é o dia da sua liberdade!

─ Não me importo com o que não conheço, apenas receio o que possa vir a acontecer daqui para frente.

─ Não podemos ignorar o inevitável, querido, é chegada a hora de pôr o Plano em ação.

─ Lamento tanto não ser mais útil…

─ O que está dizendo? ─ questionou, a tocar a cápsula com ambas as mãos ─ Você sustentou os quatro Mundos ao máximo!

─ Se pudesse suportá-los para sempre, não me importaria de permanecer aqui.

─ Não sabe o que diz…

─ Não é por meu enclausuramento que lamento!

─ Tudo ficará bem, Itilus… Pense que Trent será salva, assim como todos os Mundos e as criaturas que neles habitam!

─ Sim, eu sei. Ele chegará ainda hoje, então…

─ Não está feliz?

─ Claro que estou!
─ Não, não está! Diga-me o que o preocupa!

Fez-se um curto e tenso silêncio no Salão, até que Amarillion escutasse a resposta.

Trent {ESCREVENDO}Onde histórias criam vida. Descubra agora