Relatos de um possível suicídio
Como todas as manhãs acordei cansada, não sei se dessa vez dormi ou simplesmente encostei minha cabeça no travesseiro e fechei meus olhos ouvindo os sussurros de meus piores medos. Esse seria só mais um dia normal se eu não estivesse mais cansada que o normal, minha filha com seu rosto alegre passou por mim e me cumprimentou com um belo sorriso nos lábios, tentei sorrir também e acho que consegui já que ela pareceu satisfeita com o que viu.
Enquanto preparava o almoço observei meus pulsos que aos poucos saravam, fazia tempo que não me cortava mas em cada noite solitária uma enorme necessidade me abraçava mas pela minha filha eu me segurava. Às coisas estavam difíceis, desde que meu cota se foi até o pão do matabicho às vezes nos faltava, mas Deus foi generoso dando a mim uma filha compreensiva, uma pena que levou meu mais velho junto com o pai em um acidente de viação que me deixou viúva e... Bom, não sei qual é o nome que se dá a uma mãe que perde seu filho, essa não é a lei natural da vida, um filho jamais deveria partir antes de sua mãe.
E a cada dia que passava mais via a morte como solução, e quando não aguentava mais, os cortes me pareciam aliviar a dor e quando minha pequena filha perguntava? Eu dizia que eram marcas que os anjos carregam quando queriam regressar para o lado de Deus e ela sorria toda inocente e isso machucava mais ainda o meu coração. E aquele poderia ter sido o meu último dia se não fosse pela minha filha que encontrou-me quase inconsciente com uma corda no pescoço sentido todo o meu corpo suplicar por alívio mas minha mente quase desligada como se finalmente fosse achar seus mais perfeito descanso.
Senti suas mãos nas minhas coxas tentando puxar-me para cima para que a corda não mais me sufocasse, ouvi seus gritos de desespero "socorro" ela dizia " porquê minha mãe" ela perguntava, mas eu só queria ir ao encontro do meu filho e fugir da desgraça pela qual arrastava a minha filha, me sentia um fracasso como mãe e como mulher por não ter conseguido pensar em outra forma de seguir em frente e não conseguir continuar dando uma boa vida a minha amada caçula.
E em meio a seus gritos e lamúrias, como um filme vi a minha vida passar por minha mente, vi meu filho sorrindo para mim em uma ceia de natal onde nós quatro comiamos juntos e sorriamos uns para os outros, o olhar apaixonado do meu marido o qual eu jamais veria de novo e a gargalhada da minha filha, a qual eu havia simplesmente abandonado, e como se fosse um novo caminho mostrado por Deus mais braços me seguraram e não mais senti a corda em meu pescoço, o ar entrava em meus pulmões e mais claramente eu escutava os choros da minha filha e as vozes espantadas dos meus vizinhos, escutava "coitada, depois que perdeu o marido e o filho ficou maluca" "assim pensava mesmo em deixar uma criança de 14 anos sozinha?" "Coitada" sim, eu escutava coisas assim mas a que me trouxe mesmo de volta foi minha pequena Maria " não me abandone mamã" ela repetia, " também me dói mas sozinha não aguento" chorava e eu enfim abri meus olhos, estava deitada em minha cama e alguém aos poucos pediu que os vizinhos se retirassem. Fiquei só com minha filha que me abraçou fortemente e eu só consegui sussurrar "desculpa".
E hoje estou aqui, não digo que já não dói mas eu ainda tenho motivos para continuar vivendo, ainda quero ver minha filha graduando, casando e tendo seus filhos e quando for o momento de partir eu irei sem questionar mas enquanto isso estou vivendo a minha vida, tenho ajuda psicológica e acredito que vou superando pois ainda estou aqui. Então não fuja de seus problemas, faça como eu, mesmo que pareça que não há mais solução, que mais ninguém o quer ouvir, que ninguém se importa olhe para o lado, existirão sempre motivos para se manter aqui, procure por ajuda e não se isole, não deixe um vazio no coração de quem te ama.
Ass:
Ninguém que passou a ser alguém
VOCÊ ESTÁ LENDO
Cansei
RandomA gente se esforça ao máximo para não decepcionar aqueles que amamos mas quando isso não é valorizado, a gente cansa, e eu cansei. Esse é o meu desabafo.